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“Passei a fazer [networking] de forma calculada. Trouxe para um nível consciente aquilo que eu fazia naturalmente. Ninguém me ensinou, não tive mentor. Mas os resultados foram incríveis: tudo que consegui nos últimos anos foi graças a isso”, Ingrid Imenez, gerente de programas educacionais | Daniel Castellano / Gazeta do Povo
“Passei a fazer [networking] de forma calculada. Trouxe para um nível consciente aquilo que eu fazia naturalmente. Ninguém me ensinou, não tive mentor. Mas os resultados foram incríveis: tudo que consegui nos últimos anos foi graças a isso”, Ingrid Imenez, gerente de programas educacionais| Foto: Daniel Castellano / Gazeta do Povo
  • O café faz companhia no escritório improvisado no Lucca, em Curitiba: bons praticantes de networking precisam manter contatos pessoais

Ao sair de casa, Maria Cecília encontra a vizinha regando plantas. Admirada com a beleza do jardim, troca um dedo de prosa com a amiga e aproveita para pedir nome e telefone do jardineiro. No escritório, ao abrir e-mails, responde à mensagem de um amigo que procura funcionário. Maria Cecília, além de gerenciar o RH de uma empresa, é professora, e por isso conhece muitos alunos qualificados. Na pausa do cafezinho, os colegas comentam a necessidade de alguns em aprender inglês. Maria Cecília tem uma amiga da época do colégio que dá aulas particulares e sugere formar um grupo na empresa.

De volta ao computador, ela encontra, em um portal de notícias, reportagem sobre a alta demanda de profissionais de Gastronomia. Lembra-se de um sobrinho que pensa em ingressar na carreira e envia o artigo para o rapaz. Em seguida, ao checar o Twitter, fica sabendo de um site que reúne oportunidades e bolsas de estudo para profissionais de sua área. Anota para conferir em casa, pois pretende cursar uma especialização em outro país.

Maria Cecília passou boa parte do dia praticando networking. Diferente do que se profetizava quando o conceito chegou ao Brasil, há cerca de uma década, ele não diz respeito somente ao trabalho, como sugere a tradução da palavra em inglês (rede de relacionamento). O significado atual exprime muito mais. Trata-se de investir, cultivar e manter uma rede de contatos com pessoas que tenham interesses mútuos.

Além da mesa

Os resultados de um bom networking incluem a chance de novos empregos, oportunidades para alavancar a carreira e soluções para problemas que ultrapassam o limite da mesa de trabalho e alcançam até mesmo pequenas tarefas domésticas. "Net­working nada mais é do que um nome novo, ou a redescoberta da importância de algo que é intrínseco ao ser humano: o relacionamento. Pessoas precisam de pessoas", observa o consultor José Augusto Minarelli, autor de dois livros sobre o tema. A diferença é que hoje isso é feito forma planejada.

A boa notícia é que o networking é uma ferramenta poderosa que está ao alcance de qualquer pessoa. Não é preciso fazer cursos nem estudar formalmente o assunto. Empenho, organização e boa vontade são os pilares fundamentais para construir e manter uma rede de relacionamentos eficaz.

Minarelli explica que a velocidade e volume de trabalho impostos a quem vive em grandes centros urbanos tiraram das pessoas a convivência tranquila, da qual ainda desfrutam moradores de cidades pequenas. "Não encontramos o cartorário na esquina, os amigos no fim da tarde, o prefeito na sorveteria, o comerciante na praça. Então, precisamos investir nos relacionamentos para não perdê-los." Minarelli nasceu em uma cidade do interior paulista e sabe do que fala. Não hesita em "perder tempo" papeando com o porteiro do prédio ou com o rapaz do estacionamento. "Prosear é importante. O ser humano precisa disso", prega o consultor, garantindo que os resultados positivos sempre aparecem.

Soluções na internet

Se os seres urbanoides modernos não têm mais tempo livre para bater papo e caminhar na praça do bairro, a internet está aí para dar aquela mãozinha. E-mails, blogs, mensagem eletrônicas e redes sociais cumprem o papel de otimizar o tempo e anabolizar a agenda.

Que o diga Ingrid Imenez, paulistana, que acaba de chegar a Curitiba para ocupar o cargo de gerente de programas educacionais na Editora Aymará. Não só o novo emprego, mas diversos outros benefícios na carreira de Ingrid foram obtidos com um rigoroso – e planejado – gerenciamento de networking.

Aos 33 anos, e 15 de carreira, Ingrid conta que no início praticava o networking de forma orgânica. "Até que percebi o quanto ajuda investir nisso. Passei a fazer de forma calculada. Trouxe para um nível consciente aquilo que eu fazia naturalmente. Ninguém me ensinou, não tive mentor. Mas os resultados foram incríveis: tudo que consegui nos últimos anos foi graças ao meu networking." Um exemplo é a bolsa que obteve nos EUA recentemente. Por indicações e cartas de referências de seus contatos, Ingrid estudou no Center for Creative Leaderships sem custos. Também estudou em Harvard graças a sua rede de relacionamentos.

Investimento

Ingrid investe um bom tempo em networking. Mantém cadastro dos contatos e sabe na ponta da língua quantos são: 368 pessoas. "No total, tenho mais nomes. Mas esse é o número exato das pessoas com as quais eu sei que posso contar. Sabe quando seu pneu fura de madrugada na estrada e você precisa pedir ajuda?" Os nomes do networking de Ingrid são segmentados e separados por grupos de interesses. Qualquer alteração de status, telefone, e-mail ou endereço é imediatamente corrigida na planilha. Semanalmente, ela dedica pelo menos 20 minutos para organizar os contatos. "Quando mudei para Curi­tiba, avisei a todos. No dia a dia, se eu leio algo que sei que interessa a um dos meus contatos, por exemplo, envio imediatamente. É super importante compartilhar conhecimento e informação."

Mão dupla

Esse é um dos pontos fundamentais do bom networking: estar a postos para ajudar e fornecer informações. "Não adianta fazer como político, que só aparece em época de campanha", compara Ingrid. "Networking é uma conduta de reciprocidade e respeito", define José Augusto Minarelli. Nesse aspecto está a diferença entre ser interessado – o que é genuíno e funciona como motriz dos relacionamentos – e ser interesseiro.

"É sempre uma via de duas mãos", ensina a publicitária Erika Her­kenhoff, gestora de marketing do Grupo Bom Jesus. Assim como Mina­relli, Erika vai além do antigo conceito norte-americano e define o termo como comportamento social. "Não devemos entender networking apenas como rede de empregos. Trata-se de manter relacionamento com pessoas que têm interesses comuns."

Por essa ótica, alerta, a presença virtual deve ser tão bem cuidada quanto os encontros pessoais. "Você pode manter uma excelente rede de contatos no ambiente web. Um site ou blog, e-mails, forte presença em redes sociais... mas não vai funcionar se você não for transparente", aconselha. "Seja verdadeiro."

Se o ambiente virtual ajuda – e muito – não deve ser o único. Bons praticantes de networking procuram manter também contatos pessoais. "Assim que agendo uma viagem, começo a acionar meus contatos naquela cidade. Tento marcar um almoço, uma happy hour, enfim, tirar um momento para o bate-papo", conta Ingrid.

Talento natural

Para uma pessoa como Maria Zélia da Silva, a internet vem funcionando como alavanca para apresentar seu caráter naturalmente colaborativo. "Sempre acreditei que no trabalho devemos compartilhar informações. Construí minha carreira assim e acabei me tornando referência na busca e indicação de outros profissionais da área", conta a coordenadora de Sustentabilidade da concessionária Ecovia. Antes de ocupar essa posição, Maria Zélia – que tem MBA em gestão ambiental – atuava como autônoma e prestava serviços para diversas empresas. Era comum receber pedidos de indicação de nomes – o que ocorre até hoje. "No setor de qualidade, meio ambiente e sustentabilidade, há forte demanda por mão de obra qualificada. Por conhecer muita gente, sempre fui procurada, e assim criei uma rede de contatos interessante", explica. Também foi através do networking que Maria Zélia chegou à Ecovia.

Não é preciso estar formado, em busca de emprego, ou com a carreira em andamento para entender a importância do networking. Já na faculdade, muitos alunos estão atentos a essa questão, embora nem sempre saibam o nome correto para o conceito de manter e cultivar relacionamentos. Não por acaso, é justamente da área de negócios que sai o maior número de estudantes em busca de aconselhamento profissional e questionamentos sobre networking, conta a psicóloga Leandra Koginski Corteletti, da Central de Carreiras da Universidade Positivo. "Recebo alunos de diversas áreas, mas os estudantes de cursos da Escola de Negócios são, notadamente, os mais preocupados com empregabilidade."

Leandra orienta jovens de diferentes perfis – desde calouros até alunos terminando o curso, egressos e outros que já atuam em algum setor mas querem mudar de emprego. Com o aconselhamento, entre 50% e 60% conseguem colocação no mercado. Na orientação profissional, diz a psicóloga, o conceito de networking faz muita diferença, sempre a favor. "Não temos um feedback formal, mas os retornos que recebo, informalmente, indicam que o bom uso do networking ajuda efetivamente. Tenho casos de jovens que conseguiram recolocação apenas uma semana após perder um emprego ou deixar uma empresa", aponta Leandra.

Entre as diretrizes profissionais que a psicóloga propaga, estão os conceitos básicos do bom networking – entre eles, priorizar qualidade em vez de quantidade e manter sua rede de contatos organizada.

Qualidade

"Não adianta ter uma pilha de cartões e uma lista enorme de e-mails. É preciso selecionar, organizar e priorizar. Networking diz respeito a vínculos de troca e confiança – e confiança é algo que se conquista, não se consegue por mágica, ainda mais sem critérios", orienta a psicóloga.

Outro conselho importante é estar preparado para ouvir sempre, e aprender com o outro, além de estar disponível para ajudar e apoiar seus contatos. "Do contrário, a pessoa fica marcada como inconveniente", afirma – exatamente o que um profissional não quer ter como imagem.

Vale lembrar, aponta Leandra, que networking exige tempo e esforço. "Relacionamentos são vias de duas mãos. Não se trata apenas de ressaltar seus pontos fortes. Os pontos fracos também aparecem – o que é bom, pois a pessoa pode perceber suas deficiências e assim saber em que deve evoluir e se desenvolver."

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