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| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Poucas vezes o anúncio do tradicional contingenciamento dos gastos públicos que ocorre todo início de ano gerou tanta expectativa como neste ano. A razão para isso foi a necessidade do governo aumentar a arrecadação para não paralisar o funcionamento da máquina pública em nome do cumprimento da meta fiscal. Nos bastidores, a equipe econômica teve de fazer cálculos políticos delicados antes do anúncio da quarta-feira (29).

O fato de a equipe do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, aparentemente se esforçar para trabalhar com números realistas não poupou o governo de enfrentar um rombo de R$ 58,2 bilhões na projeção para as contas públicas neste ano. Parte do problema é explicada pelo otimismo na concepção do orçamento – o governo esperava um crescimento econômico de 1%, enquanto o mercado trabalho hoje com 0,5%. Também foram incluídas receitas com concessões que não estão garantidas. As despesas também subiram e no fim havia um risco muito elevado de o país não cumprir a meta de déficit primário (antes do pagamento de juros) de R$ 139 bilhões.

O primeiro ingrediente político importante na conta da Fazenda é a própria meta. Aumentar o déficit para acomodar parte do rombo traria o risco de atrapalhar o Banco Central em seu trabalho de redução da inflação e da taxa de juros. Uma nova meta teria de ser aprovada no Congresso, provocando um desgaste para o governo. Seria, sem dúvida, a pior decisão: abrir mão do ajuste fiscal neste momento poderia trazer de volta ao cenário o desarranjo nas contas públicas que está por trás da crise.

Consciente disso, Meirelles vinha há algumas semanas falando que subiria impostos se necessário. Suas falas já adiantavam a dificuldade para o cumprimento da meta e testavam o humor das entidades que geralmente pressionam o governo contra aumentos de arrecadação. Vários “balões de ensaio” foram lançados nos últimos dias para testar a receptividade. Falou-se em aumento da Cide ou do PIS/Cofins dos combustíveis e até da volta da CPMF (que provavelmente nunca passou realmente pela cabeça da equipe econômica).

Lançada a necessidade de mais impostos, o governo passou a procurar “tostões” para deixar a mordida mais branda. Testou a possibilidade de usar R$ 8 bilhões em precatórios parados e esperou até o último momento para ter certeza de que poderia contar com R$ 10 bilhões da concessão de hidrelétricas que podem ser relicitadas.

Na tarde de quarta, a Fazenda divulgou um novo relatório detalhando a situação fiscal. O resumo é o seguinte: não havia como assegurar o cumprimento da meta sem aumento da receita. Isso porque o orçamento é tão engessado que o governo só pode mexer em 10% das despesas – e mesmo nelas nem tudo pode ser cortado.

Esse deve ter sido o cenário debatido por Meirelles com o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, na segunda-feira (27), quando provavelmente apareceu na mesa o plano de redução das desonerações. O governo foi cirúrgico na escolha. Mexeu com um programa do governo passado e que, por isso, podia ser duramente criticado por Meirelles no anúncio de quarta. De forma contraditória, quatro setores ficaram de fora: transportes de passageiros (rodoviário e metroviário), construção civil e comunicações. Com isso, o governo evitou o choro de um setor grande e que passa por dificuldades (construção) e não ouvirá reclamações de prefeitos e governadores (transporte) ou dos meios de comunicação. Skaf não criticou a medida publicamente. E não se mexeu em nada amplamente impopular, como o preço dos combustíveis.

A equipe econômica ainda encontrou um pequeno nicho de onde tirará R$ 1,2 bilhão. As cooperativas de crédito, embora em crescimento, representam uma fração do sistema financeiro e a cobrança do IOF tem como base um argumento difícil de rebater: iguala a tributação com o resto do mercado.

Na ponta das despesas, o governo escolheu segurar R$ 42,1 bilhões para ver se o cenário da arrecadação melhora ao longo do ano. São R$ 10 bilhões de investimentos e R$ 10 bilhões de emendas que poderão ser liberados no futuro caso entre algum dinheiro extra em caixa. A União ainda está atrás do dinheiro dos precatórios e poderá receber mais do que o esperado com a segunda rodada da repatriação. Se tudo der certo, não será necessária uma nova elevação de impostos e haverá no segundo semestre dinheiro para a liberação de emendas aos parlamentares.

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