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Levy e Meirelles em evento da CNI: constrangimento público. | José Paulo Lacerda/CNI
Levy e Meirelles em evento da CNI: constrangimento público.| Foto: José Paulo Lacerda/CNI

A série de boatos que davam o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, como um membro do governo “com data de vencimento” pode não estar correta, mas traduz um conflito de bastidores na política econômica brasileira.

A pressão contra Levy é a expressão de como a estratégia que coloca o ajuste fiscal como primeiro passo na agenda econômica é criticada por uma ala de políticos e economistas que acreditam ser possível ao país crescer mais mesmo sem resolver seus buracos orçamentários (ajudando inclusive na resolução do nó fiscal com o aumento da arrecadação).

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A especulação mais forte era a de que o ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, assumiria a Fazenda. O boato perdeu força depois de a presidente Dilma Rousseff sair em defesa de Levy. Na última semana, foi a vez do próprio ministro buscar fugir das críticas declarando que dava o ajuste fiscal como encerrado – pelo menos em sua concepção, já que depende do Congresso para avançar.

O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, diz que Levy não conseguiu conduzir o acerto de contas, mas destaca que Meirelles não conseguiria fazer diferente. O problema, ele diz, não está em quem ocupa o cargo de ministro. “O problema é que o governo não tem condições de fazer avançar um programa de ajuste que faça o mínimo sentido. O país até agora não fez nenhum ajuste do ponto de vista fiscal. Se você olhar o gasto público, ele não foi cortado. A maioria das medidas que foram propostas passaram de forma diluída”, diz.

O fato de o ajuste estar pronto só em sua concepção faz com que ele seja questionado, alimentando a ideia de que já é hora de estimular o crédito.

Para Schwartsman, essa foi justamente a política econômica aplicada no país entre 2009 e 2014, quando foi criado um conjunto de desequilíbrios difíceis de serem sanados. “Tem gente que quer consertar tudo e continuar crescendo. Eu também quero emagrecer e continuar comendo.”

O economista Adolfo Sachsida avalia que liberar compulsórios, viabilizar linhas de crédito mais baratas e baixar juros, como alguns críticos do ajuste fiscal afirmam, seria um erro. “Foi tudo isso que o governo fez nos últimos anos. E isso não aumentou a taxa de crescimento, nem da poupança. Ajuste fiscal tem que reduzir gasto. E isso não aconteceu”, completa.

Contraponto

O argumento de quem defende que o governo precisa rever sua estratégia para estimular o crescimento é o de que, com mais investimentos, o ciclo recessivo seria quebrado e a arrecadação voltaria a subir.

Pedro Paulo Zahluth Bastos, professor da Unicamp, defende que o governo cometeu um erro de diagnóstico ao promover o ajuste fiscal, com elevação de tributos e alta de preços administrados. “Todos os itens da demanda privada estavam desacelerando, mas o emprego ainda ia bem. A decisão pelo ajuste reforçou a desaceleração dos gastos privados”, diz.

Para Bastos, a saída seria aumentar o investimento público. “E se eventualmente se considerasse que é fundamental não piorar as contas públicas, a elevação dos tributos deveria se concentrar entre os que têm progressividade, como os ligados à renda e patrimônio”, afirma.

“Precisamos sair do ciclo vicioso. Alguém precisa se endividar. Só o setor público pode pôr fim nisso e tirar a economia do atoleiro”, defende.

Reformas

O economista Adolfo Sachsida diz que o governo deveria focar em reformas estruturais mais profundas, como a da Previdência. “Precisa acabar com a aposentadoria por tempo de serviço. Não posso dizer que são medidas populares, nem justas, mas são aquelas que precisam ser tomadas”, afirma. O plano de Levy é fazer as reformas mais profundas depois de a economia voltar a crescer. Sua tese é a de que, com o ajuste fiscal, a iniciativa privada responderia com mais investimento, melhorando o clima para debates mais complexos.

Meirelles defende meta de inflação e veio do mercado

Mais longevo presidente da história do Banco Central (2003-2011), Henrique Meirelles é fruto do mercado, assim como Joaquim Levy. Na prática, as diferenças estre os dois são poucas e estão bem mais no estilo do que na ‘substância’. Defensor da meta de inflação, assim como o atual ministro, Meirelles dificilmente conduziria a política econômica de forma diferente de Levy.

O que anima o ex-presidente Lula, que não esconde sua preferência pela troca, é que Meirelles tem mais experiência e, por isso, o ajuste feito em suas mãos poderia ser mais rápido. É o que Lula e parte do PT acreditam – a ponto de várias notícias terem dado a troca como decisão tomada há algumas semanas, gerando até um constrangimento quando o dois se encontraram em um evento da CNI há duas semanas.

Mas a presidente Dilma Rousseff não gosta de Meirelles. Os dois foram colegas no governo Lula e protagonizaram duros embates. Lula já havia sugerido Meirelles para Dilma antes mesmo da nomeação de Levy, no fim do ano passado. Não emplacou. Pelo menos, não por enquanto.

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