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A despesa da União com pessoal e encargos caiu a 3,79% do PIB em 2021, a menor desde o início da série histórica do Tesouro, em 1997.
A despesa da União com pessoal e encargos caiu a 3,79% do PIB em 2021, a menor desde o início da série histórica do Tesouro, em 1997.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Com a reforma administrativa estacionada no Congresso Nacional, o governo federal adotou uma série de medidas que não dependem do aval do Legislativo para conter os gastos com pessoal. O resultado do que a equipe econômica chama de "reforma administrativa silenciosa" ou "invisível" foi que a despesa da União com a folha de pagamento caiu ao menor nível em pelo menos 25 anos.

Em 2021, o gasto com pessoal e encargos foi de R$ 329,3 bilhões, o equivalente a 3,79% do Produto Interno Bruto (PIB). O índice, pouco menor que o registrado em 2013 e 2014 (3,85% do PIB em ambos os anos), foi o mais baixo da série histórica do Tesouro Nacional, iniciada em 1997.

A equipe econômica atribui a contenção de gastos a fatores como a redução na taxa de reposição de servidores aposentados, que colaborou para reduzir o quadro de pessoal, e o avanço da digitalização de serviços públicos. Há outro fator determinante para o sucesso dessa "reforma silenciosa": o congelamento de salários da maioria do funcionalismo desde o início do governo de Jair Bolsonaro (PL), em parte por imposição da lei de combate à pandemia, que vedou aumentos em todo o setor público de meados de 2020 até o fim de 2021.

Um eventual reajuste de 5% para todos os servidores a partir de julho, que teria sido definido pelo governo na quarta-feira (13), teria impacto R$ 6,3 bilhões nas despesas de 2022, segundo estimativa de fontes da equipe econômica repassadas à imprensa.

O valor equivale a pouco menos de 2% da previsão original do governo para gastos com pessoal e encargos neste ano, de R$ 336,1 bilhões. Como o PIB nominal deve subir bem mais que isso (ao menos 8%, a julgar pelas expectativas de inflação e crescimento real da economia), é provável que o reajuste salarial não faça grande mudança na relação entre gasto com servidores e PIB, ao menos num primeiro momento.

A questão é se o reajuste ficará mesmo limitado a 5%. Categorias em greve, que em geral pedem aumento de ao menos 20%, já relataram insatisfação com o porcentual de aumento que veio a público. Também há dúvida sobre o que pode ocorrer de 2023 em diante. Antes de definir a questão salarial deste ano, Bolsonaro já havia prometido um aumento para todos os servidores no ano que vem.

O funcionalismo federal travou briga com o governo e está mobilizado desde o ano passado por recomposição de perdas salariais, realização de novos concursos para reposição de pessoal, reestruturação de carreiras, regularização de benefícios e outras reivindicações.

O gatilho para o movimento foi a promessa do presidente de conceder reajuste salarial apenas às forças de segurança federais, como Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e o Departamento Penitenciário Nacional. Em março, Bolsonaro acenou com a possibilidade de aumento de 5% para todos os servidores federais a partir de julho, que agora pode se concretizar.

O governo terá de remanejar outras despesas para conceder esse reajuste, uma vez que o impacto dele sobre as contas (R$ 6,3 bilhões) é de quase quatro vezes o valor reservado no Orçamento para reajustes e reestruturação de carreiras (R$ 1,7 bilhão).

Congelamento de salários na pandemia

Uma das medidas recentes que mais contribuiu para a contenção do gasto com pessoal foi a aprovação da Lei Complementar 173, em 2020, que suspendeu reajustes de salários de servidores públicos por 18 meses, como contrapartida pelos recursos financeiros destinados a estados e municípios para o combate à pandemia.

Estimativas iniciais do Ministério da Economia à época da discussão da Lei apontavam para uma economia de cerca de R$ 130,5 bilhões até o fim de 2021 com a medida. Após mudanças no texto, que blindaram algumas categorias, a expectativa baixou para R$ 43 bilhões.

Ainda assim, meses depois da aprovação da medida, Guedes afirmou que o "congelamento de salários nos deu mais do que qualquer reforma administrativa daria". O governo pretende economizar, ao longo de dez anos, R$ 300 bilhões com a aprovação da reforma administrativa.

A limitação de gasto dos entes subnacionais em relação à folha de pagamento durante a pandemia ainda possibilitou que o resultado primário consolidado do setor público voltasse a ter superávit, interrompendo uma sequência de oito anos de déficit, segundo detalhou o Ministério da Economia na nota informativa "Trajetórias com e sem Reformas: continuidade e aprofundamento da consolidação fiscal".

Outro dispositivo aprovado durante a pandemia, a Emenda Constitucional 109/2021, chamada originalmente de PEC Emergencial, veda em seu artigo 167 reajuste salarial aos servidores caso as despesas obrigatórias de estados e municípios atinjam 95% das despesas totais do governo.

O último reajuste salarial a servidores federais foi aprovado em 2016 e começou a vigorar em 2017, de forma escalonada. Em 2019 foram concedidos reajustes salariais apenas à categoria dos militares.

Taxa de reposição caiu aos menores níveis da história

Outro medida tomada no âmbito do que o governo tem chamado de "reforma administrativa silenciosa" foi a redução significativa da reposição de aposentados no funcionalismo. Segundo dados do Painel Estatístico de Pessoal (PEP), a máquina pública federal brasileira entrou em uma trajetória de enxugamento do quadro de servidores a partir de 2018. O total de funcionários ativos do governo federal diminuiu em mais de 60 mil pessoas desde então, de 635,7 mil em abril daquele ano para 574,6 mil em março de 2022 – menor número desde 2010.

A soma de servidores ativos, aposentados e instituidores de pensão passou a diminuir a partir de 2019. No pico alcançado em julho daquele ano, o quadro total beirava 1,278 milhão de pessoas; no mês passado, a soma era de 1,229 milhão, menor número desde 2013.

"Atualmente o país apresenta a menor taxa de taxa de reposição da série histórica, na média dos últimos três anos pouco mais de 11 mil novos servidores foram contratados", informou o Ministério da Economia em nota de julho de 2011. Nos últimos cinco anos, o enxugamento do quadro de servidores públicos federais levou a uma queda de aproximadamente R$ 20 bilhões nas despesas com pessoal, segundo a pasta.

Houve, ainda, desde 2019, um corte de 628 cargos comissionados no funcionalismo, que são de livre indicação – medida que contribuiu de forma mais modesta para o enxugamento da máquina pública. Atualmente, são 22.544 postos dessa natureza, contra 23.172 registrados em dezembro de 2018.

"Não obstante os impactos fiscais, a redução do efetivo público pode promover importantes transformações na economia brasileira por meio do aumento da produtividade e a consequente promoção do crescimento econômico", afirmou o Ministério da Economia na nota de julho de 2011.

Digitalização de serviços públicos

O enxugamento de pessoal têm sido acompanhado pelo avanço da digitalização de serviços públicos por meio do chamado Governo Digital e contribuído para os resultados positivos. Levantamento realizado pelo Banco Mundial mostra o Brasil na sétima posição – entre 198 países – em termos de "maturidade de serviços públicos digitais".

"Nós demos choque de digitalização, muita gente se aposentou, e aumentamos a produtividade [no setor público]", disse Guedes em evento do banco Bradesco. Em outra ocasião, o titular da pasta afirmou que "governos anteriores contrataram 160 mil funcionários e deram aumento de 5% acima da inflação quando tinha o caos instaurado no Brasil".

De todos os serviços existentes do governo federal, 72% já estão digitalizados na plataforma gov.br, com destaque para as soluções digitais de impacto massivo como auxílio emergencial, Meu INSS, seguro desemprego e seguro desemprego do empregado doméstico, carteiras digitais de trabalho e de trânsito e o Pix. Desde janeiro de 2019, a União conseguiu economizar pelo menos R$ 3 bilhões anuais com o processo de digitalização.

Enviada pelo governo em 2020, reforma administrativa está parada no Congresso

A proposta de reforma administrativa, enviada pelo governo ao Congresso em setembro de 2020, está parada no Legislativo. Foi aprovada em comissão especial da Câmara dos Deputados em setembro de 2021, mas desde então não saiu do lugar e segue sem previsão de votação em plenário.

O governo não conta com o capital político necessário e tempo suficiente para aprovação da proposta, e o próprio presidente Bolsonaro já admitiu que a janela para reformas estruturantes no atual mandato se fechou.

Entre os principais pontos da reforma administrativa que tramita no Congresso está a previsão de estabilidade a todos os servidores, ainda que com possibilidade de demissão por desempenho insuficiente; corte transitório de jornada de trabalho em até 25%, com redução de remuneração em caso de crise fiscal; permissão para contratação temporária pelo prazo máximo de dez anos; travas para privilégios; e fim da aposentadoria compulsória como modalidade de punição.

Conteúdo editado por:Fernando Jasper
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