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| Foto: Arnaldo Alves/ANPr

A escalada de lotes vazios nos leilões de transmissão expõe um paradoxo que pode comprometer a expansão do sistema elétrico no país: sobram oportunidades de investimento em linhas e subestações para ligar a produção de energia ao consumo, mas faltam empresas interessadas. Só neste ano, até agora, R$ 4,6 bilhões em transmissão ficaram à espera de investidores.

Confira a evolução do capital das empresas de transmissão após a MP 579

Embora venha aumentando ano a ano, o esvaziamento dos leilões ficou mais evidente a partir de 2012, após a MP 579 que antecipou a renovação das concessões do setor elétrico. Em 2015, 14 dos 25 lotes ofertados não tiveram empresas interessadas. Neste ano, dos 24 lotes ofertados na primeira etapa do leilão de transmissão realizada em abril, 10 tiveram salas vazias. Mesmo assim, a taxa de sucesso foi de 58,3%, a maior desde 2013. Para a segunda etapa, no início de setembro, mais 22 lotes serão disponibilizados, totalizando um investimento de R$ 23,2 bilhões só em 2016, somadas as duas etapas. De antemão, a expectativa não é das melhores.

Sem concorrência

A ausência de empresas interessadas impactou outra questão importante nos leilões – a concorrência. Antes da MP 579, a média de proponentes por lote era de 4,5, detalha Mario Miranda, presidente da Abrate. Após a medida provisória, o número caiu para 0,9 e, em 2015, recuou para 0,5 proponente por lote ofertado de transmissão. “Antes não importava se a RAP [Receita Anual Permitida] era superestimada, tínhamos concorrência, o mercado regulava isso. Agora acabou a competição”, diz Miranda.

“Se esses projetos são colocados nos leilões é porque são tidos como necessários para a expansão do setor, portanto, essa frustração nos certames é grave. É preciso melhorar o preço teto e criar um ambiente mais encorajador para investimentos em transmissão”, avalia Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil.

De problemas regulatórios e entraves ambientais a dificuldades de financiamento, uma soma de fatores minou o caixa e a capacidade de investimento das concessionárias , contribuindo para afugentar as empresas do mercado. Ao reduzir em cerca de 70% a Receita Anual Permitida (RAP) do setor, a MP 579 teve um efeito devastador na área de transmissão, afirma Mário Miranda, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica (Abrate). Em alguns casos, o valor da RAP ficou abaixo dos custos de operação das empresas.

A prorrogação antecipada das concessões impactou fortemente o grupo das chamadas concessionárias “tradicionais” – Chesf, Eletronorte, Eletrosul, Furnas, CEEE, Celg, Cemig GT, Copel GT e ISA CTEEP – em especial as estatais federais pertencentes à Eletrobras (Chesf, Furnas, Eletronorte e Eletrosul), que enfrenta uma série de problemas financeiros, de corrupção e gestão. Sem dinheiro em caixa e com dificuldade para captar recursos, elas se retiraram dos leilões, a participação dessas empresas na RAP contratada nos certames caiu de 73%, antes da MP 579, para 37% depois.

Para voltar a respirar, as empresas aguardam ansiosamente o pagamento de cerca de R$ 24 bilhões das indenizações relativas ao período anterior a maio de 2000 – os quase R$ 13 bilhões das indenizações pós-maio de 2000 já foram pagos entre 2013 e 2015 e ajudaram a desafogar o caixa de algumas empresas.

“Neste momento, o mais importante para nós é a Aneel regulamentar o pagamento da indenização, que será escalonado em oito anos. Isso é crucial para que possamos ir ao mercado captar recursos para novos investimentos. Só neste ano, precisamos de 2,2 bilhões de capital próprio para a contrapartida em investimentos”, afirma Miranda.

A questão é se as empresas terão fôlego para cumprir um cronograma de investimentos que prevê R$ 108 bilhões até 2024, segundo o Plano Decenal de Energia. Ao todo, estão previstos R$ 78 bilhões em linhas de transmissão e R$ 30 bilhões em subestações para expandir a rede em 85 mil quilômetros. Sem isso, o setor corre o risco de não ter linhas para escoar a energia nos próximos anos.

Licenciamento ambiental é calcanhar de Aquiles da transmissão

O processo de licenciamento ambiental é outro calcanhar de Aquiles das empresas de transmissão. De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), 60% das obras para escoar energia estão atrasadas, em média, em quase um ano e meio. Na maioria dos casos (62%), a demora na liberação da licença ambiental é a principal razão dos atrasos.

Para tentar amenizar essa questão, que acaba elevando os custos dos empreendimentos para as empresas e aumentando riscos de penalidades junto ao órgão regulador, a Aneel aumentou para 48 a 60 meses o prazo de conclusão dos projetos.

Além disso, no leilão de transmissão que será realizado em setembro, os lotes serão ofertados com grau de vinculação, por meio de linhas condicionantes e condicionadas. Na prática caso um lote condicionante não possua proponente, necessariamente será descartada a licitação dos seus lotes condicionados. Já um lote condicionante pode ser licitado separadamente.

“É um conceito inovador. Isso diminuiu o tamanho dos projetos para permitir a entrada de um maior número de investidores e evita que linhas secundárias fiquem prontas antes de linhas prioritárias para o escoamento de energia”, diz Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil. “Hoje já percebemos uma sensibilidade maior da Aneel na tentativa de equacionar esses problemas, mas ainda não estão resolvidos ainda”, acrescenta.

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