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 | Gianfranco Panda Beting/Azul Linhas Aéreas
| Foto: Gianfranco Panda Beting/Azul Linhas Aéreas

A decisão do governo federal de vetar a ampliação da participação de capital estrangeiro em companhias aéreas nacionais adiou a abertura de um dos setores mais protegidos da economia brasileira. A expectativa era que a fatia aumentasse dos atuais 20% para 100%. Ao ceder à pressão de senadores e manter o limite atual, pouca coisa muda até que o projeto que estabelece o novo Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) seja votado e o tema retorne à pauta.

A proposta de ampliação tinha como principal objetivo atrair investimentos. “Se mantivermos o limite, a companhia estrangeira entra apenas para fins de compartilhamento de linhas e aeronaves”, explica Marcio Peppe, sócio da KPMG no Brasil. “Mantendo o que temos hoje, permanecemos dependendo necessariamente de capital nacional para investimento”, completa.

Aéreas brasileiras reivindicam medidas para ganhar competitividade

O foco das companhias aéreas nacionais, representadas pela Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), é a retomada da agenda da aviação brasileira. Entre as reivindicações, estão a uniformização da cobrança do ICMS sobre o querosene de aviação, a revisão dos contratos e a atualização do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA).

“Na medida em que o preço da passagem [doméstica] é o mais alto, vamos lutar para retirar os custos que só existem no Brasil”, diz Eduardo Sanovicz, presidente da Abear. Segundo ele, as companhias aéreas competem em desigualdade com as empresas internacionais pois há custos e restrições que encarecem o custo da atividade no Brasil.

A medida também serviria como uma fonte de financiamento para as principais companhias aéreas nacionais, que amargam perdas desde 2011. Somente no ano passado, Avianca, Azul, Gol e TAM, as quatro maiores, acumularam juntas prejuízos de R$ 5,9 bilhões.

A Gol é a companhia com a pior situação financeira e passa por um processo de renegociação da dívida. A empresa teve prejuízo de R$ 3,5 bilhões somente em 2015, segundo dados compilados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

As ações da empresa subiram nas últimas semanas com a expectativa de que o capital estrangeiro pudesse socorrê-la. A notícia de que o governo manterá o limite de 20% jogou um balde de água fria nos investidores. As ações preferenciais da companhia chegaram a cair 15,49% na última quarta-feira (29).

Veto

Com a promessa de vetar parte da Medida Provisória (MP) 714, o governo adiou a abertura de um dos setores mais fechados da economia brasileira. Enquanto setores como de óleo e gás e de comunicações permitem 100% de investimento estrangeiro, o aéreo tem um limite de 20% por ser considerado estratégico para a soberania nacional.

Mas o próprio governo, tanto da presidente afastada Dilma Rousseff quanto do presidente interino Michel Temer, admite que o atual modelo precisa de mudanças. A crise econômica, que resultou em uma queda na demanda dos voos domésticos, somada à alta do dólar, que puxou para cima os custos operacionais, acertou em cheio o setor.

Atualmente, quatro companhias aéreas dominam o mercado. Com o cenário recessivo, parte das empresas diminuiu a frequência de voos ou cancelou rotas consideradas não vantajosas para controlar custos. No Paraná, o número de voos domésticos nos cinco aeroportos do estado caiu 10% no primeiro trimestre de 2016 se comparado ao mesmo período de 2015.

Abertura total do capital gera discórdia entre especialistas

A abertura total para a presença de capital estrangeiro em aéreas nacionais ainda é um ponto de discórdia entre parlamentares e especialistas do setor. Quem defende a abertura aponta como benefícios o aumento da competição, a atração de investimentos, o maior acesso a fontes de financiamento e o desenvolvimento da cadeia produtiva.

Já quem é contra diz que a medida afetaria a soberania nacional, causaria dumping no preço das passagens (estrangeiros praticando preços muito baixos para levar concorrentes nacionais à falência) e prejudicaria a aviação regional. O único consenso entre ambos os lados é que mesmo uma abertura gradual de 49% não resultaria em investimentos imediatos.

Para o sócio da KPMG no Brasil, Marcio Peppe, a abertura total para capital estrangeiro significa pensar no longo prazo. Ele afirma que a medida atrairia novas empresas para o país, que gerariam uma demanda por reformas da infraestrutura aeroportuária. A reforma impactaria, principalmente, o interior do país, que conta com localidades não atendidas pela falta de aeroportos com capacidade para voos diários.

“Existem alguns gargalos de infraestrutura aeroportuária que precisam ser resolvidos. Por exemplo, há poucos aeroportos que podem ter pouso de duas aeronaves simultaneamente porque não há estrutura e equipamentos para isso”, diz o especialista. Ele cita que em Santa Catarina, por exemplo, há aeroportos sem torre de controle.

A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) se posiciona a favor do aumento de capital estrangeiro para até 49%, mas não acredita que a medida causaria um impacto imediato na aviação nacional. “Não há expectativa de mudança no curto prazo para ninguém. Ninguém iria na semana que vem comprar nada”, afirma Eduardo Sanovicz, presidente da associação.

O professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Jorge Eduardo Leal Medeiros, acredita que a abertura de capital deve ser aos poucos e que somente com a redução do “custo Brasil” será possível reduzir tarifas.

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