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| Foto: Cesar Machado/Arquivo Gazeta do Povo

Desde a sua publicação em setembro, a Medida Provisória (MP) da reforma do ensino médio destampou uma caixa similar à de Pandora, na qual ficaram evidentes as mazelas da educação básica no Brasil. A discussão sobre como melhorar a aprendizagem dos jovens de 15 a 17 anos, obrigados a estudar em quatro ou cinco horas diárias um currículo enciclopédico, criado na época da ditadura, é pauta de especialistas em educação há mais de 10 anos, mas só agora com a tentativa de alteração à força saiu do âmbito dos educadores para a opinião pública. Com essa mudança de cenário, há muita desinformação, causada principalmente por pontos obscuros do texto, impostos na MP sem ampla discussão. Confira alguns deles apontados por especialistas.

1. É necessário flexibilizar as matérias, mas sem deixar de dar disciplinas importantes.

Ninguém nega que é preciso mudar o currículo do ensino médio, e até dar menos horas para algumas matérias e mais para outras. Mas reduzir pela metade o currículo obrigatório, como prevê a MP, parece demasiado. “A parte flexível [de escolha das matérias] na MP é muito flexível. No projeto de lei [em tramitação na Câmara dos Deputados] estava se discutindo 30% ou40%. O risco é o de oferecer muito menos conteúdos do que o necessário”, diz Remi Castioni, professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e autor de emendas ao texto da MP. “Parece que eles querem apenas treinar ‘português’ e ‘matemática’ para ter melhores notas no Ideb [avaliação nacional nessas matérias], deixando de lado outras matérias, é um empobrecimento”, afirma a professora Mônica Pereira, do Observatório do Ensino Médio da Universidade Federal do Paraná.

2. O incentivo de ensino integral, sem assegurar investimentos e controle de qualidade, pode levar a ter ‘dois turnos precários’.

Outro consenso entre os educadores é que uma carga horária maior poderia ser adotada em mais escolas de ensino médio, com reforço escolar no contraturno, cursos livres direcionados à vocação econômica de cada região, entre outras medidas. Os educadores questionam, porém, a expansão das escolas de tempo integral sem nenhuma garantia na MP de investimentos continuados e melhor formação de professores.

3. Formação técnica é importante, mas só se forem garantidas horas para as outras matérias.

“Não é a mesmo coisa fazer o currículo comum na escola e fazer um curso técnico no Senac”, exemplifica a professora Mônica Pereira. “O que propúnhamos era um ensino médio integrado, profissional e com currículo, não uma saída profissional de qualquer jeito”, completa a professora. Ou seja, no momento em que o governo tenta criar uma nova figura de educação profissional, sem explicar muito como, fica no ar a dúvida se, de fato, estará preocupado em garantir o mínimo de disciplinas ensinadas normalmente a jovens de 15 a 17 anos em todo o mundo ou se apenas está formando técnicos – não com o nível feito em países como Alemanha ou Coreia do Sul.

4. O ‘notório saber’ e o foco nos cursos técnicos abre portas para uma parceria com a rede privada sem fiscalização.

As parcerias com o setor produtivo são bem-vindas e há casos de sucesso no país, desde que sejam dentro da lei e respeitando os acordos. O problema do texto da MP, para os educadores, é que não é muito claro neste ponto – tanto que alguns temem até a privatização do ensino público no futuro. A professora Angela Soligo, que é contra privatizações no ensino, aponta esse quesito como uma das reivindicações dos alunos nas ocupações. “Os estudantes estão bombardeados por uma série de informações e nenhuma dessas informações é uma inverdade. A impressão é a de um movimento de privatização com redução de conhecimento”, acredita.

5. O uso de uma medida provisória, impondo uma mudança com urgência, dá margem para especulações.

A MP prevê que o novo currículo entre em vigência só depois da aprovação de um currículo comum (a Base Nacional Curricular Comum), que só estará pronto no ano que vem. Com isso, a ideia já era que as redes de ensino viriam a adotar as mudanças só em 2018 ou 2019. Ou seja, para que usar uma MP alegando urgência? “Não há motivo de urgência como justificou o governo. Lamento o fato de ser por uma MP, porque era possível aprofundar a discussão do projeto de lei que está no Congresso e fazer as coisas de melhor forma”, declara o professor Remi Castione.

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