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Rita de Cássia Cartelli de Oliveira, secretária de Educação de Campo Mourão, município que adota um sistema particular | Dirceu Portugal/Gazeta do Povo
Rita de Cássia Cartelli de Oliveira, secretária de Educação de Campo Mourão, município que adota um sistema particular| Foto: Dirceu Portugal/Gazeta do Povo

Controvérsia

Alternativa à má-formação de docentes

Para o diretor-geral do Grupo Educacional Expoente, Armindo Angerer, os sistemas estruturados de ensino são importantes principalmente quando os professores não estão preparados para a sala de aula. Ele considera que a formação dos docentes no Brasil é falha e por isso muitos precisam de apoio para realizar o planejamento das aulas. O sistema de ensino do Expoente está presente em cerca de 500 escolas públicas do país, a maioria delas no estado de São Paulo.

De acordo com a professora Theresa Adrião, da Unicamp, o argumento de que os métodos de ensino compensam a má-formação dos professores traz uma concepção equivocada sobre o que representa investir em qualidade de ensino. "Não precisamos de professores qualificados para reproduzir. Aliás, esta é a justificativa de muitos gestores para a adoção das apostilas: é mais barato comprar o material do que investir em formação das equipes das secretarias e das escolas", diz. Segundo ela, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação indica que a comunidade escolar deve participar da elaboração da proposta pedagógica da instituição de ensino.

A professora Andrea Barbosa Gouveia, do Departamento de Educação da Universidade Federal do Paraná, considera que o uso dos sistemas privados de ensino subestima a capacidade dos professores e dos programas de formação ofertados pelas secretarias de educação. Já para a doutora em Educação Guiomar Namo de Mello, a autonomia dos professores é importante quando promove o aprendizado. "Para isso é preciso domínio dos conteúdos e competência para gerenciar os tempos e espaços de aprendizagem. Isso exige experiência, vários anos de prática e capacidade de estabelecer vínculos positivos com os alunos. Se o professor consegue fazer por sua própria conta, melhor. Caso contrário, é preciso disponibilizar materiais estruturados, apoio e acompanhamento para o professor", diz.

Na tentativa de melhorar o desempenho dos estudantes, escolas municipais do Paraná estão levando materiais e métodos de famosos sistemas particulares de ensino para as salas de aula. Em Campo Mourão, na região central, a secretaria municipal de Educa­­ção iniciou neste ano uma parceria como o Sistema de Ensino Aprende Brasil, desenvolvido pela Editora Positivo e presente hoje em 29 cidades do estado. A secretária de Educação do município, Rita de Cássia Cartelli de Oliveira, diz que a parceria é importante porque auxilia o professor e vem acompanhada de capacitação pedagógica. Já para alguns estudiosos, os sistemas privados engessam o trabalho dos docentes, pois os temas das aulas vêm pré-estabelecidos e há um manual de como trabalhar os conteúdos.O uso de métodos de ensino de empresas particulares, que se inicia no Paraná, é um fenômeno comum no estado de São Paulo. Uma pesquisa realizada no ano passado pela Fundação Lemann mostra que 34% dos municípios paulistas usam sistemas privados. Eles normalmente oferecem um pacote com materiais didáticos destinados a alunos e professores, capacitação dos docentes, acompanhamento do trabalho dos professores e acesso a portais educativos. "Nosso sistema também traz sugestões de estratégias metodológicas e materiais alternativos que o professor pode utilizar", afirma José Luiz do Carmo, coordenador pedagógico do Núcleo de Apoio à Municipalização do Ensino (Name), método ligado ao Sistema COC.

No Paraná, o Name é utilizado pelas escolas municipais de Nova América da Colina, no Norte Pioneiro, que atendem crianças da educação infantil à 5.ª série do ensino fundamental. A parceria começou em 2008. Segundo a diretora da Escola Municipal Francisco Escorsin, Ana Rogatti, o investimento no sistema fez com que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) da cidade, nas séries iniciais do ensino fundamental, passasse de 1,5 em 2005 para 5,5 em 2009. Uma análise da série histórica do Ideb, entretanto, mostra que, em 2007, antes do início da parceria, o Ideb de Nova América da Colina já havia subido para 4,4.

Segundo Ana, professora há 27 anos, o método dá liberdade para que os professores insiram projetos e conteúdos relacionados à realidade local. "Eu sou totalmente favorável ao sistema de ensino", afirma a diretora. Alguns pesquisadores, por sua vez, dizem que os sistemas de ensino privados são impositivos. "O que temos ouvido dos professores que trabalham com esses materiais é que os docentes são bastante fiscalizados e, se não cumprirem ao final da semana aquele conteúdo pré-determinado, são repreendidos", afirma Maria Marcia Sigrist Malavasi, professora da Univer­­sidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Pesquisadora das parcerias público-privadas há mais de 20 anos, a professora Vera Peroni, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, diz que os sistemas impedem que o professor altere a aula de acordo com necessidades específicas dos alunos. Estudo realizado por Vera em uma escola gaúcha mostrou que uma professora foi criticada porque, juntamente com os estudantes, decidiu trabalhar outro assunto que não o previsto para o período pelo sistema de ensino de uma organização não governamental. Em 2007, o projeto desenvolvido pela docente saiu em uma revista pedagógica em reconhecimento às atividades realizadas na turma.

Parceria melhorou Ideb em SP

Uma pesquisa realizada no ano passado pela Fundação Lemann avaliou o impacto na Prova Brasil do uso de sistemas estruturados de ensino por municípios de São Paulo. Segundo a coordenadora do estudo, Paula Louzano, os resultados mostraram que estruturar as aulas e estabelecer um controle indireto do que acontece em sala tem impacto positivo no aprendizado dos alunos.

Todas as escolas das redes municipais de São Paulo foram avaliadas. Os colégios foram divididos em três grupos: o grupo de tratamento (escolas que passaram a usar sistemas privados entre 2006 e 2007), o grupo controle (escolas que nunca utilizaram sistemas de ensino) e o grupo placebo (escolas que passaram a usar sistemas privados de ensino a partir de 2008). Os pesquisadores compararam as notas dos municípios em 2005 e 2007. "Criamos o grupo placebo porque queríamos controlar a diferença na gestão das escolas. Um secretário que busca o sistema privado, só pelo fato de ir atrás de algo novo, já é um secretário diferente. E isso pode interferir no resultado dos alunos", explica.

No grupo de tratamento, a média em Matemática na Prova Brasil subiu 4,9 pontos a mais do que no grupo placebo. Em Português, o impacto foi de 5,1 pontos. "Como os sistemas de ensino estruturam a rotina pedagógica da escola e organizam o currículo, eles melhoram o uso do tempo. Uma das coisas que o sistema evita é a cópia de conteúdos do quadro. A cópia ocorre porque muitas vezes os alunos não têm livros consumíveis, já que não há material para todos e os livros distribuídos pelo governo devem ser repassados para outros alunos no fim do ano", avalia Paula.

Autonomia

Embora a pesquisa mostre que escolas que utilizaram métodos privados tiveram melhora no desempenho dos alunos, Curitiba é um exemplo de que também é possível conseguir bons índices de forma autônoma. O município conquistou por três vezes consecutivas a melhor média entre as capitais brasileiras na primeira etapa do ensino fundamental (1.ª à 4.ª série). Segundo a Secretaria Municipal de Educação, as escolas da rede utilizam os livros didáticos distribuídos gratuitamente pelo governo federal, além de materiais produzidos pelo Departamento de Ensino Fundamental da secretaria.

A Secretaria Estadual de Educação do Paraná (Seed) também utiliza diversos materiais complementares produzidos por gestores e professores da rede. Segundo a Seed, a melhora do desempenho dos alunos é resultado de vários fatores e não apenas do uso de materiais pedagógicos.

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