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Reurbanização iniciada em 2006 não conseguiu inibir, por si só, o crime organizado no Parolin | Marcelo Elias/ Gazeta do Povo
Reurbanização iniciada em 2006 não conseguiu inibir, por si só, o crime organizado no Parolin| Foto: Marcelo Elias/ Gazeta do Povo

Números

• 68% das pessoas que moram na Vila Parolin têm até 30 anos, segundo dados da Cohab, o que indica uma população predominantemente jovem. Cerca de 70% delas estão fora da escola. Entre os moradores que não estudam mais, apenas 36% terminaram o ensino básico. Um total de 92,5% das famílias vivem com até três salários mínimos e apenas 25,7% dos moradores têm trabalho formal.

• Queda de 57% - Com a reurbanização promovida pela Cohab, o índice de homicídios no Parolin chegou a cair 57%, de acordo com dados oficiais do segundo semestre de 2008. Mas voltou a crescer. Fenômeno é comum em áreas de extrema violência.

• 1.507 famílias - O recenseamento da Vila Pa­­rolin, iniciado em 2006, in­­dicou que o local tem 240 mil metros quadrados e abrigava cerca de 11 mil habitantes. Desses, 41% viviam em sub-habitação de madeira, 70% contavam com saneamento básico e 50% tinham gatos de luz.

• R$ 52,4 milhões é quanto soma o investimento federal e municipal feito no esforço de reurbanizar a antiga Vila Parolin. Programa promoveu o asfaltamento de 25 becos, melhorias em 800 casas e prevê um total de 677 moradias populares: 336 foram entregues.

Parece piada, mas foi graças à antiga favela do Parolin – ocupada desde quinta-feira pela Unidade Paraná Seguro, a UPS – que Curitiba, pela primeira vez, se viu como cidade grande. O fato ocorreu nos idos de 1953. A Gazeta do Povo deu o sinal de alerta, falando de uma vila recém-nascida às margens do Córrego Guaíra e da linha do trem, debaixo do nariz de um dos bairros mais tradicionais da cidade, reduto de italianos, então ainda chamado por muitos de Colônia Dantas.

Por ironia, 1953 foi também o ano do centenário da emancipação política do Paraná, quando, sob auspícios do governador Bento Munhoz da Rocha, o estado virou uma festa. A capital ganhou um Centro Cívico e viu ser erguido o novo Teatro Guaíra e a Praça 19 de Dezembro, para citar algumas das reviravoltas urbanas daqueles dias.

Pois Curitiba ganhava ares metropolitanos, inclusive no que uma metrópole tem de menos agradável: a população sem teto, que podia ser vista andando pela Praça Tiradentes. Quem já imaginou a reação, acertou. Aquela legião de "catadores de monturos", como se dizia, causou indignação: a pobreza, a olhos vistos, teve uma recepção, digamos, medieval.

Via-se nos miseráveis um povo sujeito à promiscuidade, um abrigo de doenças, um perigo para as roupas no varal, para os bujões de gás e para as nossas meninas. O preconceito era escancarado. E não se deve culpar ninguém por isso. A mentalidade higienista podia ser verificada em todos os cantos do país.

Em pouco mais de uma década, o povo da vilinha do Guaíra, que tanto horror causava aos provincianos, seria convidado a sair dali. O episódio ainda há de render um longa-metragem. Caminhões do Departamento de Estrada e Rodagens, o DER, estacionaram no Parolin de Baixo e transportaram as famílias para a Vila Nossa Senhora da Luz, nas rebarbas do No­­vo Mundo.

Durou pouco. A "Luz", como se sabe, nem luz tinha. Viver nas cercanias do Centro podia não ser muito melhor do que aquilo, mas pelo menos não era tão longe e oferecia trabalho. Pouco a pouco a favela do Parolin voltou para onde estava, assim como tantas outras ex-favelas sujeitas a desmanche depois dela.

Ascensão do tráfico

Calcula-se que na década de 1970 Curitiba tinha pelo menos 40 favelas e, pelo que se sabe, a cidade foi se acostumando a elas, até chegar às mais de 250 ocupações irregulares do dia de hoje, várias delas sujeitas a um mau maior do que abrigar doenças e ladrões de galinhas, como se pensava: o tráfico de drogas.

Essa história ligeira talvez explique porque tantos olhos estejam voltados para o Parolin.

A vila virou sinônimo de favelização na capital. É, afinal, a pioneira e, de resto, a mais visível, plantada no final de ruas como a Brigadeiro Franco, Lamenha Lins e Westphalen, o que não impediu que tenha permanecido alijada das políticas públicas por inacreditáveis seis décadas.

Urbanização tardia, mas bem-vinda

A reação mais notável da prefeitura veio em 2006, quando os recenseadores da Cohab bateram de porta em porta, formando um diagnóstico certeiro da região. Em 2007, para surpresa da população que via na favela do Parolin um problema crônico, começaram os primeiros reassentamentos, precisamente na Rua Daysi Berno, via símbolo do novo Parolin, finalmente alvo de boas notícias.

Houve novos reassentamentos em 2008 e em 2011, cumprindo-se à risca o Plano de Aceleração do Desenvolvimento, o PAC, muitas vezes de forma corajosa. A alocação de parte dos moradores na zona nobre do bairro gerou protestos dos moradores das belas casas de alvenaria. O poder público não se intimidou, garantindo um modelo moderno, saudável e justo de ocupação urbana: é preciso viver junto.

O que causa estranheza é que a construção de tantas casas e o melhoramento de outras não tenha acabado com a criminalidade. Quando os 25 becos foram, afinal, asfaltados, o poderio dos traficantes do Morro do Sabão e da Cidade de Deus parecia com os dias contados. Não foi o que se deu.

A resposta ao impasse é simples. A reurbanização não faz milagre. Não fez em Bogotá e em Medellín, dois exemplos mundiais de redução da violência pelas vias do urbanismo. O crime cessa, mas como um comerciante que permanece na sua loja mesmo depois de tantos assaltos a seu estabelecimento, temendo perder a freguesia, o tráfico até sossegou por uns tempos, mas não arredou o pé de seu território. Ainda mais num local tão estratégico como aquele. Isso explica o vaivém do Parolin no noticiário policial.

Medo comum

Conta contra a vila, também, a baixa organização comunitária. Diferente de sua vizinha tão antiga quanto, a Vila das Torres, o Parolin é um lugar de poucas lideranças e muito medo. Os moradores são cheio de dedos e, mesmo com tantas casinhas de Cohab aqui e ali, trancafiam os filhos no final da tarde, temendo que algum deles seja recrutado pelo tráfico.

A chegada da UPS, espera-se, pode mudar esses hábitos, garantindo aos parolinenses lá de baixo que desfrutem do que alcançaram a duras penas – moradia, asfalto e o sentimento de fazer parte daquelas ruas famosas de Curitiba que acabam na porta da casa deles. Já não era sem tempo.

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