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Arena da Baixada em verde para homenagear a Chapecoense. | Lineu Filho/Tribuna do Parana
Arena da Baixada em verde para homenagear a Chapecoense.| Foto: Lineu Filho/Tribuna do Parana

É muito fácil perder a objetividade na análise da hipótese de criação da Arena Atletiba, afinal de contas ela mexe com a maior rivalidade do futebol do estado e gera todo tipo de interpretação passional. Ao mesmo tempo, até agora a ideia foi apenas ventilada não oficialmente, oferecendo poucas informações e dados confiáveis relativos ao negócio para que seja possível fazer qualquer análise mais aprofundada e responder a única pergunta pertinente em tudo isso: um estádio compartilhado seria um bom negócio para Atlético e Coritiba?

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Nesse momento, a resposta precisa ser baseada em uma garimpada nas informações disponíveis. A principal fonte, e também a mais fácil de encontrar, é o balanço financeiro dos clubes. Nele, é possível encontrar o impacto que a nova Arena teve nas finanças do Atlético e dão pistas sobre por que o clube está disposto a deixar a rivalidade de lado a compartilhar a sua casa com o seu maior rival.

Em 2015, ano da inauguração do teto retrátil, o custo do clube com o estádio e centro de treinamento mais que triplicou, saltando de pouco mais de R$ 5 milhões em 2012 para R$ 16 milhões. Nesse mesmo período, as receitas do estádio – incluindo aluguel para outros eventos – tiveram um crescimento de apenas de R$ 700 mil, subindo de R$ 3,9 milhões para R$ 4,7 milhões, um desequilíbrio evidente. Ainda que o Atlético conte hoje com uma arrecadação muito maior proveniente de sócios e televisão, o sucesso da Arena pós-Copa como unidade de negócio é bastante questionável. Em 2015, o clube recebeu um valor menor do aluguel de lojas do estádio do que em 2008.

Uma análise mais detalhada só será possível após a divulgação do novo balanço financeiro, o que deve ocorrer nos próximos meses, mas já dão um indício do impacto financeiro que a estrutura gera nas contas do clube. Porém, as informações disponíveis nos borderôs das partidas também dão algumas pistas. Desde que foi reinaugurado, a Arena continuou apresentando as mesmas médias de público dos anos anteriores. Das 47 partidas do Campeonato Brasileiro disputadas depois da Copa do Mundo, 15 geraram renda líquida negativa. A área VIP, uma das principais fontes de receita de estádios com o mesmo formato e plano de negócios, vem sofrendo uma constante redução de valor do ingresso por conta da falta de demanda. Começou custando R$ 800. Em abril de 2015, caiu para R$500. Em julho de 2016 foi para R$ 350, uma redução de 56% em apenas dois anos. Mesmo assim, no jogo contra o Cruzeiro no final de outubro, nenhum ingresso para o setor foi vendido.

A Arena é um estádio pronto, com um dos melhores padrões possíveis para assistir futebol. Mas não consegue gerar receita porque não existe mercado disposto a pagar por isso. Se fosse metade do tamanho, seria o estádio perfeito. Como é o dobro do que deveria ser, gera gastos correntes com operação e manutenção que não conseguem ser absorvidos pelo clube, e uma das soluções que parecem mais simples seria adicionar um outro inquilino que possa dividir a conta.

O Coritiba é a opção lógica. O problema é que a média de público de Atlético e Coritiba são semelhantes. E, como dito, uma boa parte das partidas gera renda negativa, problema que possivelmente continuará a existir. Para o Coritiba, uma hipótese inicial otimista para o plano de negócios dessa mudança seria a obtenção dos mesmos números que o Atlético tem hoje. Nesse caso, a mudança para a Arena geraria uma renda líquida das partidas de por volta de R$ 2 milhões por ano, um valor muito pequeno para justificar a ampliação dos custos de manutenção para um clube com caixa tão limitado e que sequer leva em conta qualquer outro gasto com aluguel e afins.

Mais do que isso, o compartilhamento do estádio por dois clubes com médias de público parecidas não necessariamente resolve o problema. Afinal, ao mesmo tempo em que o novo inquilino dobrará o número de cadeiras ocupadas por jogo, ele também dobrará o número de cadeiras não vendidas, que é onde está o principal gargalo operacional do projeto. Sobe a receita, mas também sobe a despesa.

Um outro fator que põe em dúvida o sucesso da operação é que é muito difícil achar exemplos de estádios compartilhados no mundo do futebol, ainda mais bem-sucedidos. Os poucos compartilhamentos que existem se concentram na Itália e estão longe de ser um sucesso. Depois de décadas de convívio, Juventus e Torino adotaram estádios diferentes em 2011 e parecem estar bem felizes com o resultado. A Roma também já anunciou que se separará da Lazio e se mudará para uma nova casa nos próximos anos. Milan e Internazionale reclamam publicamente há anos de que o compartilhamento do San Siro é incompatível com seus planos de desenvolvimento.

O caso mais emblemático, porém, talvez seja o que acontece na Allianz Arena com o Bayern Munique e o 1860 Munique. Em 2001, os dois clubes, que já dividiam o uso do Estádio Olímpico, se uniram para construir um novo estádio mais moderno e dividiram a os custos metade para cada um. Até aí tudo ótimo. O problema é que o Bayern sempre lotava o antigo estádio e continuou lotando quando se mudou para o novo. O 1860, por sua vez, tinha uma média de público mais tímida, por volta de 30 mil pessoas por jogo, menos da metade da nova capacidade. Ao se mudar para a nova casa, as médias continuaram as mesmas. Com metade do novo estádio vazio, o 1860 não conseguiu arcar com os enormes custos operacionais e, em 2006, precisou vender a sua metade para o Bayern para evitar a falência. Cinco anos depois, ainda sem conseguir respirar financeiramente e, naturalmente, sem conseguir resultados em campo, quase fechou as portas mais uma vez, sendo salvo por um investidor estrangeiro. Agora, enquanto batalha para não ser rebaixado para a terceira divisão do futebol alemão e complicar ainda mais sua situação, o 1860 busca desesperadamente sua independência da Allianz Arena.

Cada um desses casos possui suas próprias peculiaridades e não querem dizer que a hipotética divisão do estádio será obrigatoriamente um mau negócio. Porém, eles deixam claro o tamanho do desafio e do risco que será assumido. Os dados disponíveis e os exemplos pela Europa jogam contra a ideia. É bom pensar direito.

*Oliver Seitz é curitibano, PhD em Indústria do Futebol, Consultor do Johan Cruyff Institute e Diretor do Mestrado em Football Business do FC Barcelona.

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