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Crianças no gramado do Couto para homenagem. | Hugo Harada/Gazeta do Povo
Crianças no gramado do Couto para homenagem.| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

7 de dezembro de 2016 será um dia que demorará para terminar na memória de cada um que acompanhou as homenagens às vítimas da tragédia do voo da Chapecoense. Desde o princípio, as 30 mil pessoas que foram ao Couto Pereira percebiam em gestos, em estranhos silêncios, a noite incomum pela frente. Logo na entrada do estádio, minutos antes do início do protocolo oficial, torcedores de Paraná, Coritiba e Atlético dividiam harmoniosamente a Rua Mauá e entoavam cânticos de “Vamos, Chape!”, marco da ascensão do clube catarinense. Blocos de crianças corriam entre adultos, cena cada vez mais rara, e colocavam em risco as bebidas.

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Amigos se reencontravam nas esquinas e pouco diziam, como se o luto atravessasse a pele e invadisse até o território das lembranças. Torcedores bebiam numa velocidade mais lenta e, de fato, as crianças, sem parar de correr, pareciam não entender muito o que estava acontecendo. O menino Nicolas, de cinco anos, estava triste porque o pai estava também. Antônio, camisa do Vasco, se limitou a dizer: “Cara, não dá pra acreditar”.

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Dentro do estádio, diversas faixas e cartazes buscavam fornecer conforto à equipe catarinense, à cidade, aos familiares envoltos nas perdas, algum amparo, algum entusiasmo diante da força do destino. No gramado, cada colega jornalista parecia prestes a desabar. E se, por um dia, fosse permitido deixar a isenção de lado e poder pertencer ao imaginário coletivo, esse dia foi hoje. Alguns narravam histórias com os profissionais que morreram no voo fatídico da LaMia. Outros saiam de perto enquanto se contavam as histórias. Cada qual chorava sua dor ao seu canto.

O minuto de silêncio, às 21h45, pareceu durar a criação de dois mundos. Mal se ouviam as respirações na arquibancada. Contudo, como se houvesse um chamado intencional, um bebê começou a chorar, um choro firme, intenso, a vida querendo estourar para fora. Então, as luzes se apagaram, a negra tinta da noite foi interrompida pelas luzes de celulares, pelo retumbar de fogos de artifício, os cânticos vieram ainda mais altos – pela voz a tentativa de expurgar a dor. Se lágrimas quase envergonhadas escorriam de um cinegrafista, as crianças com uniformes da Chapecoense pulavam, e pulavam como se fosse possível seguir em frente, como se o Couto Pereira, Curitiba e o Paraná estivessem a fazer a festa mais grandiosa desse mundo, tão triste quanto inexplicável. Quem tinha de fazer passagens ao vivo parecia que não ia dar conta. A brevidade da vida não podia ser levada ao ar, assim, tão pungente.

Ao fim da cerimônia oficial, 71 morteiros depois, os torcedores foram saindo numa velocidade atônita, descrentes de que um time inteiro pode desaparecer numa travessia. Nas ruas, alguns ainda entoavam “Vamos, Chape”, enquanto um bêbado caía e se machucava. Um táxi quase atropelou dois pedestres, a vida, enfim, ansiando em continuar. Na barraquinha de cachorro-quente, um pai tentava fazer o filho parar de chorar. E o futebol, esse coração aos tropeços, terminava de prestar uma das homenagens mais bonitas a um dos capítulos mais trágicos de nossa história.

Fique bem, Chape.

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