Arquitetura

5 fatos estranhos sobre a casa demolida pelo Greca

Luan Galani
28/06/2017 18:00
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Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Há exatas duas semanas a casa Erbo Stenzel encontrou seu fim. No último dia 14 a casinha rosa do Parque São Lourenço, considerada por especialistas como a casa de madeira mais importante de Curitiba, foi vítima de um incêndio que condenou metade de sua estrutura. Poucas horas depois a construção que ainda estava de pé foi derrubada pela prefeitura com ordem direta do prefeito Rafael Greca (PMN).
A investigação do crime está com a Polícia Civil e corre no 4º. Distrito Policial, do Boa Vista, que aguarda a perícia técnica do incêndio por parte da Polícia Científica. O laudo pericial deve ser divulgado nas próximas semanas e só então os investigadores prosseguirão com a apuração.
Até lá, outros fatos merecem atenção.

1-Decisão precipitada

A Casa Stenzel foi demolida pela Prefeitura depois de ter sido atingida por um incêndio em 14 de junho de 2017. Foto: Arquivo/Hugo Harada/Gazeta do Povo
A Casa Stenzel foi demolida pela Prefeitura depois de ter sido atingida por um incêndio em 14 de junho de 2017. Foto: Arquivo/Hugo Harada/Gazeta do Povo
A demolição autorizada pela prefeitura aconteceu em questão de poucas horas após o incêndio. Dois fatos no processo decisório deixam sérios questionamentos no ar. Primeiro, técnicos e especialistas de patrimônio da prefeitura não foram consultados. Como HAUS apurou no dia 14, a decisão de derrubar a casa não foi formalmente discutida com o diretor de patrimônio da Fundação Cultural de Curitiba (FCC) nem com o coordenador da Comissão de Segurança de Edificações e Imóveis (Cosedi). Foi decidida pelo prefeito em reunião com alguns secretários, como confirmou assessoria de imprensa da prefeitura.
Segundo ponto crítico: a casa foi tratada como um imóvel qualquer durante o ocorrido, e justamente depois de ter sido completamente destruída começou a ser elogiada nas redes sociais, como mostra o print abaixo. A própria prefeitura noticiou no Portal Administrativo do Município que “o incidente […] resultou na perda de uma unidade arquitetônica de grande interesse para o patrimônio cultural da cidade, pelo valor histórico da própria edificação e por fazer parte da vida e da obra de um dos seus maiores artistas”.
Pena que a valorização da casa, que era uma Unidade de Interesse de Preservação (UIP), pelas autoridades veio tarde demais.

2-O local do incêndio desapareceu

Ainda não se sabe a causa do incêndio, mas, como a própria assessoria de comunicação da prefeitura adiantou em nota após o ocorrido, três garrafas de álcool foram encontradas no local. O laudo pericial da Polícia Científica, que vai sair em aproximadamente 20 dias, de acordo com a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Administração Penitenciária do Paraná (Sesp-PR), irá apontar as possíveis causas do fogo.
Muitos podem aventar: e se os peritos tiverem dúvidas? Uma das alternativas seria o perito voltar ao local do incêndio, como explica um membro do Corpo de Bombeiros que não quis se identificar. Neste caso, porém, a casa não existe mais. Segundo a Sesp-PR, responsável pela Polícia Científica, todas as informações necessárias foram coletadas no dia do incêndio. Apesar da confirmação oficial, a dúvida permanece.

3-Sumiço de peças

Arquitetonicamente falando, a casa não se encaixa em nenhuma tipologia conhecida pelos almanaques. É única. Sua exclusividade reside no pé direito externo, que foi aumentado para facilitar a habitabilidade do sótão. E a construção se torna ainda mais especial por guardar histórias da família Stenzel, cujo seu membro mais ilustre foi o escultor Erbo Stenzel (1911-1980). (Foto: Fred Kendi / Gazeta do Povo)
Arquitetonicamente falando, a casa não se encaixa em nenhuma tipologia conhecida pelos almanaques. É única. Sua exclusividade reside no pé direito externo, que foi aumentado para facilitar a habitabilidade do sótão. E a construção se torna ainda mais especial por guardar histórias da família Stenzel, cujo seu membro mais ilustre foi o escultor Erbo Stenzel (1911-1980). (Foto: Fred Kendi / Gazeta do Povo)
Quando a casa ainda estava aberta ao público no parque, com diversos itens do escultor paranaense Erbo Stenzel (1911-1980) à mostra, diversos objetos sumiram do dia para a noite. Entre eles: pincéis, espátulas, frascos e uma bomba de ar comprimido em latão. De acordo com nota da FCC enviada à reportagem, foi registrado boletim de ocorrência na época e aberto processo de sindicância contra alguns servidores públicos. Mas o processo foi arquivado por falta de indícios da participação de funcionários da prefeitura. Ainda segundo a FCC, os 11 itens que desapareceram foram retirados da casa por vândalos “devido à vulnerabilidade do local onde as peças estavam expostas”. Novamente: pena que a vulnerabilidade do local foi percebida tarde demais.
Depois que o processo foi finalizado, em 2009, todo o acervo de obras e documentos do artista foi transferido para o Museu Oscar Niemeyer (MON).

4-Casa Stenzel vai ganhar uma réplica

A prefeitura sinaliza que vai reconstruir a casa em 2018 por meio de parcerias ou por edital específico. De acordo com a FCC, as madeiras, portas e janelas “estavam em condições de serem reaproveitadas”, e foram recolhidas para serem utilizadas na reconstrução. Apesar do bom estado do que sobrou, a opção escolhida foi o trator.
Não faltou, portanto, mais carinho com a casa? Grandes nomes do patrimônio ouvidos pela reportagem defendem que era possível sim ter isolado o local para não ferir os usuários do parque, e desmontar as partes intactas da casa de uma forma mais profissional.

5-Improbidade administrativa?

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação
A casa era uma Unidade de Interesse de Preservação (UIP) e em breve poderia até ser tombada pelo novo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Curitiba, que está discutindo possíveis tombamentos de mais de 600 imóveis da capital paranaense. Foi vítima, porém, de diversas gestões, incluindo a atual.
Por este motivo, alguns grupos e associações, que por enquanto preferem anonimato, já estão fazendo consultas jurídicas para em um futuro próximo entrar com ações individuais ou uma ação civil pública por improbidade administrativa contra o prefeito Rafael Greca.
Segundo o advogado Luiz Gustavo Vardanega Vidal Pinto, presidente da Comissão de Assuntos Culturais da OAB Paraná e da Comissão Especial de Cultura e Arte da OAB nacional, ainda é cedo para qualquer conclusão, mas ele confirma que juridicamente as ações caberiam.

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