Estilo & Cultura

A reinvenção do azulejo no Brasil

Luan Galani
30/01/2016 00:00
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Diversas obras de Athos Bulcão espalhadas por Brasília resgatam temas, cores e formas brasileiras a partir de uma simplicidade modular impressionante. Fotos: Fundação Athos Bulcão/Acervo

Detalhe da entrada do Palácio Gustavo Capanema, no Rio, antiga sede do Ministério da Educação e Saúde, com painel de Cândido Portinari.<br>Foto: Márcio Vianna/Iphan
Detalhe da entrada do Palácio Gustavo Capanema, no Rio, antiga sede do Ministério da Educação e Saúde, com painel de Cândido Portinari.<br>Foto: Márcio Vianna/Iphan
Pouca gente sabe, mas foi graças ao arquiteto e pintor franco-suíço Le Corbusier (1887-1965) que o Brasil modernista resgatou o uso dos azulejos em suas edificações. Ele enxergou as possibilidades plásticas do revestimento e não cansava de repetir para seus jovens discípulos tupiniquins que os materiais do passado não deveriam ser desprezados.
A cidade de São Luís, no Maranhão, é o exemplo máximo do potencial dos azulejos, como destaca o fotógrafo Marcos Piffer, que lançou recentemente, junto do artista plástico Paulo von Poser e a museóloga Marilúcia Bottallo, o livro Patrimônio da Humanidade no Brasil: suas riquezas culturais e naturais. Fundada por franceses, reconquistada pelos portugueses e tomada novamente por invasores holandeses, a cidade foi reconhecida como Patrimônio Mundial pela Unesco por conseguir ter preservado seu padrão urbano de forma harmoniosa e excepcionalmente integrada ao ambiente por meio da azulejaria.
Foi esse o empurrãozinho de Corbusier que fez toda a diferença para que as superfícies azulejadas deixassem de ser peça meramente decorativa da casa da vovó para se transformarem em elemento arquitetônico e artístico com um quê brasileiro.
As paredes ganham vida
Azulejos do Brasil Colônia que repetiam um mesmo desenho: o país ainda não enxergava o revestimento como veículo para obras maiores. Foto: Marcos Piffer/Divulgação
Azulejos do Brasil Colônia que repetiam um mesmo desenho: o país ainda não enxergava o revestimento como veículo para obras maiores. Foto: Marcos Piffer/Divulgação
O azulejo era encarado como elemento decorativo na época colonial, adquirindo caráter artístico somente a partir de 1930.<br>Foto: Marcos Piffer/Divulgação
O azulejo era encarado como elemento decorativo na época colonial, adquirindo caráter artístico somente a partir de 1930.<br>Foto: Marcos Piffer/Divulgação
A retomada do azulejo acontece a partir década de 1930, como indicam alguns estudos da arquiteta Liliane Simi Amaral, que leciona no Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, com os principais expoentes da arquitetura modernista da época, como Oscar Niemeyer, Lúcio Costa, Affonso Eduardo Reidy e Carlos Leão.
Há duas razões para isso. Primeiro porque o revestimento cerâmico era uma proteção reconhecidamente eficaz contra as intempéries de um país tropical, como a abundância de chuva e a ação do sol. “Depois, esses arquitetos queriam levar arte à grande população, e o azulejo se provava um bom veículo”, sentencia o professor de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) Orlando Ribeiro. “Para o Niemeyer, por exemplo, em um país pobre e com dificuldade de acesso à arte como o nosso, o mínimo contato com a arte era sagrado.”
Ao integrar a arte plástica à linguagem arquitetônica, as novas construções também foram dotadas de uma certa garantia de eternização, já que fica mais difícil de fazer alterações construtivas posteriores quando há grandes obras artísticas a abraçar as estruturas.
Brasileirismos
Painel de Portinari para a Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, em Belo Horizonte, em que ele representa o santo e diversos animais. Fotos: Marcos Piffer/Divulgação
Painel de Portinari para a Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, em Belo Horizonte, em que ele representa o santo e diversos animais. Fotos: Marcos Piffer/Divulgação
Esse renascimento do azulejo se calcou sobre motivos e cores tipicamente brasileiras. A natureza dá o tom nas formas, com traços orgânicos ou desenhos que imitam nossas fauna e flora. Além do clássico azul, típico da azulejaria holandesa e portuguesa, também foram resgatados o verde e o amarelo.
Um dos pintores brasileiros mais famosos de todos os tempos, Cândido Portinari foi um dos que adotou o azulejo como base para seus trabalhos.
A obra mais representativa foi a Igreja de São Francisco de Assis, na Lagoa da Pampulha, em Minas Gerais, que desafiou a monotonia que rodeava a arquitetura da época. Com projeto de Niemeyer e paisagismo de Burle Marx, a igreja foi inaugurada em 1943, com uma composição de Portinari, que deu novo significado ao branco e azul clássico da azulejaria.
Mas foi o artista carioca Athos Bulcão quem deu continuidade ao azulejo como protagonista, principalmente em Brasília, virando objeto de estudo obrigatório em todos os cursos universitários de arquitetura pelo país.  Ele também adotou uma multiplicidade de suportes, indo além da cerâmica, e se destaca pela depuração cromática e pela repetição de módulos geométricos.

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