Estilo & Cultura

Muito além de um Niemeyer: MON faz 15 anos como referência internacional

Aléxia Saraiva
27/03/2018 01:00
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O museu ocupa uma área nobre em meio ao Centro Cívico de Curitiba. Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

O Museu Oscar Niemeyer acabou de debutar. Celebrou seus 15 anos no último mês de novembro. Esse, no entanto, não foi o único motivo que a atual gestão teve para comemorar. Em 2017, o museu chegou ao marco de 361 mil visitantes no ano, batendo seu próprio recorde de público. Assim, mais do que um célebre marco arquitetônico ou um badalado centro cultural, o “Museu do Olho” já se consolidou como um espaço permanente no mapa afetivo dos curitibanos.
MAIS SOBRE O MON
À fama não se chegou por acaso. Para a diretora-presidente do museu, Juliana Vosnika, essa é consequência de um processo de amadurecimento pelo qual a instituição tem passado. O MON se dedica às artes visuais, arquitetura e design. São cerca de 20 exposições anuais que abrangem as três áreas.
Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Já a linha curatorial do museu recentemente passou a contemplar não só artistas do estado e do país, mas da América Latina, África e Ásia. Pouco depois desta nova resolução, o MON foi presenteado com a doação de cerca de 3 mil peças de arte asiática pelo diplomata Fausto Godoy, o que quase dobrou o número de obras que compõem o acervo.
“A maioria dos outros museus do Brasil têm foco na produção eurocêntrica. Queríamos fugir um pouco disso. No fim, foi providencial. Inauguramos a primeira exposição com essas obras no dia 1º de março; um presente de valor incalculável para Curitiba”, comenta Vosnika. Uma das condições de Godoy na negociação foi que o museu mantivesse uma sala expositiva permanente dedicada a exposições de parte deste acervo.
A primeira exposição com as obras doadas por Godoy está em cartaz desde 1º de março. "Ásia: a Terra, os Homens, os Deuses" será de longa duração. Foto: divulgação/MON
A primeira exposição com as obras doadas por Godoy está em cartaz desde 1º de março. "Ásia: a Terra, os Homens, os Deuses" será de longa duração. Foto: divulgação/MON

História

Localizado no coração do Centro Cívico, o MON tem 35 mil metros quadrados de área construída. Desses, são dedicados à área expositiva 17 mil m² — o que dá a ele o título de maior museu da América Latina. Sua história começa em 1967, com o início da obra desenhada por Oscar Niemeyer para abrigar o Instituto de Educação do Paraná, ainda sem o “olho”. O prédio foi concluído 11 anos depois e acabou se tornando a sede de uma série de secretarias estaduais.
Foto: Reprodução/MON
Foto: Reprodução/MON
O famoso prédio do olho, ícone do MON, foi construído em 2001, quando o arquiteto projetou uma readequação para o espaço. O MON foi efetivamente inaugurado apenas em 2002, com o nome de Novo Museu, para depois ser rebatizado com o nome de seu idealizador.
Na visão de Adriana Vaz, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que estudou o MON no seu doutorado em sociologia, o museu leva o mérito por ter se tornado um importante espaço de sociabilidade na cidade. “Independentemente das salas de exposição, as pessoas passeiam com seus cachorros e visitam externamente pelo próprio símbolo arquitetônico. Não são só estudantes de arte que querem ir ao museu. Se criou um vínculo afetivo muito grande com o espaço do olho”, relata.
Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

E a arte local?

José Antônio de Lima é artista plástico e mora em Curitiba há três décadas. Por seu currículo passam inúmeras exposições internacionais. Japão, Suécia e Alemanha são alguns dos países pelos quais passou por último. No Museu Oscar Niemeyer, teve uma mostra individual em 2006, ocasião em que doou algumas de suas peças para o acervo da instituição.
Segundo ele, são inegáveis os méritos do MON como espaço de arte agregador de conhecimento, mas a instituição peca, na visão dele, em alguns aspectos. Um deles é a falta de visibilidade para artistas locais.
"Visibilidades", exposição autoral de José Antonio de Lima no MON em 2006. Foto: reprodução/José Antonio de Lima
"Visibilidades", exposição autoral de José Antonio de Lima no MON em 2006. Foto: reprodução/José Antonio de Lima
“[O espaço para artistas locais] é uma luta já há muito tempo. Um espaço para exposição individual ou coletiva seria interessante não só para mostrar o trabalho, mas um ponto de encontro”, explica ele. “Quando você faz uma exposição com artistas locais há uma série de trocas. Mesmo um artista de ponta ainda tem muito o que aprender”.
Lima aponta que outros espaços de discussão de arte na capital paranaense, tais como o Museu de Arte Contemporânea e a Casa Andrade Muricy, acabaram minguando pela imponência do MON. “Tem muita gente que desiste porque não tem condições nem espaço. É uma política de estado que tinha que privilegiar a sua população local”.
Endossa o discurso a vice-presidente da Associação de Artistas Plásticos do Paraná (APAP), Sabine Feres. “O artista paranaense deveria ter lugar cativo, e o acervo mais completo. Para um artista local, expor no MON é um incentivo para a continuidade da carreira”, aponta. Ela concorda que o museu é uma grande referência, tanto pela arquitetura como pelas exposições. “O artista precisa se alimentar disso. Cézanne ia toda tarde no Louvre estudar na frente do Delacroix. Isso propicia uma melhoria no currículo do artista”. Atualmente, o museu conta com 12 salas de exposição.
O Museu Oscar Niemeyer tem atualmente 12 salas de exposição, totalizando 17 mil m² de área dedicada às obras. Foto: André Rodrigues
O Museu Oscar Niemeyer tem atualmente 12 salas de exposição, totalizando 17 mil m² de área dedicada às obras. Foto: André Rodrigues

Domingo, dia de museu

A professora Adriana Vaz aponta que um dos fatores que contribuiu para a crescente popularidade do MON foi a antiga política de gratuidade em domingos, que proporcionava a visita de diferentes setores da sociedade. “Quando o cidadão está sem trabalhar durante o final de semana, ele vai escolher uma atividade que seja prazerosa. O fato de ter um domingo gratuito ajudava com que as pessoas escolhessem o museu como espaço de lazer”, conclui.
Atualmente, a entrada é franca em todas as quartas-feiras, das 10 às 18 horas, e nas primeiras quintas-feiras do mês, entre 18 e 20 horas. Menores de 12 anos, maiores de 60 e visitas agendadas por escolas públicas também não pagam.
Lima concorda que essa mudança não veio sem prejuízo. Se, antes, o domingo era um dia cheio de famílias que vinham de vários cantos da cidade para aproveitar o tempo livre, isso se perdeu com a troca da gratuidade para um dia de semana. E as consequências não ficam só no plano do número de visitantes.
“A arte só se torna necessidade a partir do momento em que as pessoas entram em contato com ela. O ensino da arte é deficiente nas escolas do Brasil todo. Se um museu desse porte tem a entrada dificultada para famílias mais pobres, fica muito elitizante”, critica o artista.
Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo
Nesse sentido, Vosnika reforça que não faltam projetos educativos dentro do museu que englobam todas as idades, com mais de 70 mil pessoas participando anualmente. “O museu tem que ser um espaço democrático. A gente quer que a população conviva no espaço mas que também entre no museu”. Entre as ações promovidas pelo MON estão o Arte para Maiores, voltada à terceira idade, e o Uma Noite no MON, destinado a crianças de 7 a 10 anos.

Referência internacional

Em março de 2018, o MON passou a integrar a plataforma do Google Arts and Culture. Três exposições estão disponíveis para ser visitadas virtualmente em 360º graus. Além disso, ele integra a lista dos museus mais espetaculares do mundo pela BBC Culture e de exposições mais visitadas pela The Arts Newspaper.
O reconhecimento internacional não é surpresa para Zilda Fraletti. A galerista curitibana integra o Programa de Patronos do MON. Criado em 2015, a iniciativa angaria fundos para a compra de obras para o acervo do museu através de doações. Em contrapartida, os mecenas podem participar na escolha das peças. Fraletti acredita que essas soluções ajudam a sustentar o status de referência internacional que o museu trouxe para Curitiba.
Obras apreendidas pela Polícia Federal durante a operação Lava Jato ficaram sob os cuidados do MON. Cerca de 220 peças estão na reserva técnica do museu. Foto: Brunno Covello
Obras apreendidas pela Polícia Federal durante a operação Lava Jato ficaram sob os cuidados do MON. Cerca de 220 peças estão na reserva técnica do museu. Foto: Brunno Covello
“A gente entrou no meio cultural brasileiro e internacional. Vieram exposições muito importantes pra cá. E isso abre a possibilidade de ter contato com arte de altíssimo nível para artistas, galerias e para o público em geral”, acrescenta.
O patronato é mais um ponto que Vosnika aponta como consequência do amadurecimento do museu em sua gestão, que se encerra em 2019. “O museu é um negócio mas é um gerador de conhecimento e um importante vetor na cadeia produtiva da economia criativa, da arte e da cultura do país”, conclui a diretora do museu. “Além de ser um prédio bonito, hoje a gente tem muito mais conteúdo para apresentar. A arte e a cultura fazem parte de qualquer sociedade. E esse é nosso papel: sensibilizar a pessoa para a arte e para a cultura”.

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