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Homem escreve mensagem para o Prêmio Nobel da Paz de 2010 Lu Xiaobo no memorial improvisado em frente a um escritório do governo chinês em Hong Kong | ISAAC LAWRENCE/AFP
Homem escreve mensagem para o Prêmio Nobel da Paz de 2010 Lu Xiaobo no memorial improvisado em frente a um escritório do governo chinês em Hong Kong| Foto: ISAAC LAWRENCE/AFP

A dissidência política é ótima, linda e misteriosa. Para aqueles que vivem sob um regime repressivo, o caminho de menos resistência é não resistir — se acomodar para sobreviver ou, em casos raros mas menos honrados, colaborar com o sistema. Ainda assim, muitos escolhem o caminho decente e mais difícil. Por idealismo, necessidade ou pura recusa a se submeter, eles se levantam, enfrentam e assumem riscos.

Liu Xiaobo, da China, personificou a tradição dissidente, lutando implacavelmente mas pacificamente contra o regime que impôs ao seu país um autoritarismo diário — até que morreu de câncer de fígado na quinta-feira, aos 61 anos

Liu nasceu em 1955, na agonia do começo da República Popular da China, e estudou literatura e filosofia, terminando seu doutorado em 1988. Movido pela queda do comunismo na Europa e a abertura limitada de Deng Xiaoping na China, ele se juntou aos protestos estudantis na Praça da Paz Celestial em 1989. Esse ativismo consciente lhe deu uma sentença de dois anos na prisão. Mais tarde ele serviu ainda três anos em um campo de trabalho por outras ofensas políticas. As causas de Liu eram libertárias, democráticas e, na opinião dele, aplicáveis universalmente, não apenas tendências ocidentais para as quais seu país não “estaria pronto”. 

Sua demanda específica era que as autoridades do Comunismo Chinês aceitassem a necessidade de uma revisão da constituição que garantisse eleições, regulasse a justiça e a liberdade de expressão e de culto religioso. 

Em dezembro de 2008, Liu se juntou a outros intelectuais para publicar a Carta 08, um manifesto pró-democrático inspirado pela Carta 77 feita por dissidentes tchecos contra a União Soviética 31 anos antes. Notavelmente, o documento não só chamou atenção para a inabilidade dos comandantes chineses de criar um futuro melhor para a população, mas também falou a verdade sobre o preço gigantesco pago pelos chineses desde a revolução de 1949: “dezenas de milhares perderam suas vidas, e várias gerações perderam a liberdade, a felicidade e a dignidade humana”, observou o documento. 

Por falar sobre o passado, o presente e o futuro da China, Liu ganhou uma sentença de 11 anos. A justificativa era por “incitar a subversão contra o poder do Estado”. A sentença começou no fim de 2009 e ele ainda estava cumprindo o tempo quando faleceu (com uma licença temporária no hospital). Sua dissidência firme também lhe rendeu o Prêmio Nobel da Paz em 2010, ainda que Beijing tenha proibido que viajasse para a cerimônia de entrega do prêmio. O governo também proibiu que ele recebesse amigos nos seus últimos dias ou que fosse fazer um tratamento médico no exterior. 

Essas indignidades finais pretendiam humilhar e degradar, mas a tentativa foi fútil e vergonhosa. Logo antes da morte de Liu, o homem responsável por isso, o presidente chinês Xi Jinping, estava em Hamburgo para a reunião do G-20, vivendo no meio do glamour e da glória da política internacional. Mas, apesar de ser governada por Xi, os verdadeiros lugares de honra na China são aqueles ocupados por Liu Xiaobo.

Vigília em memória de Lu Xiaobo em TaipeiSAM YEH/AFP
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