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Famílias do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que vivem na ocupação Zumbi dos Palmares, fazem passeata na praia do Leblon para comemorar Dia da Consciência Negra. 20/11/2014 | Fernando Frazão/
Agência Brasil
Famílias do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que vivem na ocupação Zumbi dos Palmares, fazem passeata na praia do Leblon para comemorar Dia da Consciência Negra. 20/11/2014| Foto: Fernando Frazão/ Agência Brasil

Comemorado em 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra marca o dia da morte de Zumbi dos Palmares, ocorrida em 1695, após anos defendendo o Quilombo de Palmares de expedições que pretendiam escravizar, novamente, os negros que conseguiram fugir. Desde 2003, com a aprovação da Lei 10.639, que instituiu o ensino da História e Cultura Afro-Brasileiras nas escolas, a data foi incluída no calendário escolar como o Dia Nacional da Consciência Negra. 

Atualmente o Projeto de Lei 296/15, do deputado Valmir Assunção (PT-BA), está em tramitação para transformar a data em feriado nacional. Aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, o projeto segue agora para análise do Plenário da Câmara. 

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Adotado em diversas cidades espalhadas pelo país, o feriado do Dia da Consciência Negra divide opiniões quando o assunto é torná-lo uma data “não útil”, como por exemplo, o 12 de outubro. 

“O feriado é importante”, afirma a professora Jeruse Romão, presidente do Fórum Estadual de Educação das Relações Étnico-Raciais de Santa Catarina. Posição que  vai ao encontro, justamente, da discussão feita em torno da necessidade de tornar a data um feriado nacional, o que implicaria, possivelmente, no fechamento do comércio. “Eu ainda vejo como um debate entre a Casa Grande e a senzala. É como se estivessem nos dizendo: como vocês ousam querer um feriado?”, afirma. 

De acordo com ela, o Brasil precisa pensar em atitudes reparatórias e “assumir o seu racismo”, deixando “de lado o discurso de democracia racial” que, para ela, não se sustenta quando, por exemplo, a maioria das vítimas de homicídio é negra ou quando entidades representativas de setores comerciais e industriais se organizam para derrubar um feriado que lembra a luta da população negra no país.

“A Consciência Negra não é dizer que os negros contribuíram para a formação e desenvolvimento do país, é ter consciência de que os negros foram os primeiros trabalhadores do Brasil, que foram os negros que construíram o país”, diz. 

Prejuízos no comércio 

Marco Antônio Guimarães, gerente executivo jurídico, de riscos e compliance do Sistema Fiep (Federação das Indústrias do Paraná), concorda que a data em que se celebra a participação da população negra na construção da sociedade brasileira precisa ser lembrada e propagada. 

Para ele, o Dia da Consciência Negra é necessário e precisa figurar entre as datas comemorativas do Brasil. O que não seria interessante e viável, na visão dele, é transformar o 20 de novembro em um feriado nacional. 

“O custo econômico de um novo feriado para o setor produtivo é enorme. A data precisa ser comemorada, mas não deve ser feriado”, afirma. 

E o custo, de acordo com estudo recente realizado pelo Sistema Fiep, ultrapassa os três dígitos. Conforme explica Marco Antônio, neste ano, o custo econômico de um feriado para o setor produtivo é de R$ 289,5 milhões. Quando somados todos os 16 feriados do ano, o prejuízo saltaria para R$ 3,175 bilhões

“Esse é um prejuízo muito grande. O número significativo de feriados afeta diretamente a economia produtiva do país”, explica. 

O gerente explica ainda que, atualmente, a flexibilização trabalhista permite algumas formas de reparação que podem compensar, em parte, o prejuízo causado pelos feriados, como por exemplo, a possibilidade de transferência das folgas de feriados que caem durante a semana para as segundas e sextas-feiras. 

“A modernização trabalhista tem incentivado os acordos coletivos para que permitam essa transferência. Hoje, essa é uma forma de remediação, além dessa, outra forma é não permitir que nenhum novo feriado seja estabelecido. Isso pode reduzir os impactos”, afirma. 

Apesar de ser contra a instituição do Dia da Consciência Negra como feriado nacional, Marco Antônio enfatiza que é necessário tratar a valorização da população negra na esfera política e social. 

“Estamos avançando no que diz respeito a políticas afirmativas de resgate social e valorização dos negros, mas é simplista tratar essa evolução apenas instituindo um feriado. Precisamos fazer com que aconteça, cada vez mais na forma de políticas públicas, educação, comunicação e políticas afirmativas. Não é um feriado que o fará se sentir mais valorizado”, diz. 

Com um posicionamento muito semelhante, a Federação do Comércio do Estado do Paraná (Fecomércio) também se mostra contrária à instituição da data como feriado, tornando o 20 de novembro um “dia não útil”. Para Rodrigo Salem, diretor de planejamento e gestão da federação, o Brasil já possui excesso de feriados. Ressaltando a importância da data, ele afirma que a entidade é favorável ao Dia da Consciência Negra, pois defende “a comemoração e a reflexão. Nós respeitamos demais a história e a importância do negro no Brasil”. Apesar disso, reitera que “o impacto econômico não o justifica como feriado”. 

Segundo Rodrigo, a estimativa realizada pela Fecomércio e que leva em conta um mês com 24 a 25 dias úteis para o comércio, é de que com o fechamento devido ao feriado, o impacto na economia seja de uma perda direta de 4%. “Este ano a gente pode falar de 5% de redução com esse feriado, levando em consideração que o 20 de novembro é em uma segunda-feira, o que compromete também o sábado anterior”, explica. 

Para o diretor, o Brasil já sofre o impacto por possuir muitos feriados. “Não precisamos desse número excessivo de feriados, mas se não dá para eliminar o que já está instituído, pelo menos que não se produza novos”, avalia. 

Criação ou extinção de feriados depende de lei 

Em 2017, foram 16 os feriados registrados no Brasil, o que o coloca em uma posição confortável se comparado a outros países. O ranking é liderado por Bangladesh, que supera os 30 dias de feriado no ano, enquanto o Brasil ocupa a 46ª posição. 

Marco Aurélio Serau Junior, professor de Direito do Trabalho da Universidade Federal do Paraná, não acredita que o Brasil possui um número excessivo de feriados. Além disso, ele alerta para a jornada excessiva de trabalho dos brasileiros. “A nossa jornada é excessiva, é comum até mesmo que horas extras irregulares sejam praticadas. Então, os feriados acabam sendo uma forma de compensação”, opina. 

O trâmite legal para tornar uma data comemorativa é bastante simples. O caminho começa nas comissões, passa pela CCJ e se encerra no Plenário — onde o PL que torna o Dia da Consciência Negra feriado encontra-se no momento, aguardando para ser analisado. 

“O ponto central é a discussão social. A sociedade precisa entender que aquela data merece ser feriado ou não”, diz. 

A partir do momento que um projeto passa a ser considerado lei, ou seja, é aprovado e torna, efetivamente, a data em feriado, aquele dia passa a ser considerado um dia de descanso remunerado, tendo o mesmo efeito que o domingo. 

De acordo com Marco Aurélio, todos os setores são atingidos com a não prestação de trabalho naquele feriado, excluindo-se situações pontuais, como os trabalhadores que trabalham em regime de horário diferenciado. “É impositivo que o trabalhador goze do feriado e, se houver jornada de trabalho, a remuneração é aplicada como jornada extra”, explica. 

Apesar disso, em um feriado pode haver atividade comercial, desde que obedeça a dois pontos: acordo coletivo de trabalho que autorize a abertura do comércio em determinada data e legislação municipal que regulamente o funcionamento do comércio naquela data. 

Sem o estabelecimento de um limite de datas que possam ser consideradas feriado, o professor afirma que esse “teto” é o da razoabilidade e explica que não existe a possibilidade de “substituição” de feriados, ou seja, não há como retirar uma data em detrimento da outra. “Um feriado nacional novo é um acréscimo. O feriado só é retirado do calendário através de uma lei que ordene que, a partir daquele momento, aquela data não é mais considerada feriado, do contrário, não existe essa possibilidade”, diz. 

O único caso em que pode haver essa substituição é nos feriados estaduais. E este também é o único caso em que existe um limite. Cada estado brasileiro possui uma data considerada feriado durante o ano, ficando a cargo de cada um determinar qual o cunho desta data comemorativa e cabendo também ao estado substitui-la de acordo com o apelo das comemorações.

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