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Acredita-se que o jovem ao centro da imagem seja Hamza bin Laden, um dos vinte filhos do terrorista saudita Osama bin Laden. A imagem, feita pela rede de televisão catari al-Jazeera, é de 07 de novembro de 2001. Hamza, hoje com 28 anos, é considerado uma estrela em ascensão dentro da al-Qaeda. Provavelmente por motivos de segurança, não existem imagens dele depois de adulto. | al-Jazeera/AFP
Acredita-se que o jovem ao centro da imagem seja Hamza bin Laden, um dos vinte filhos do terrorista saudita Osama bin Laden. A imagem, feita pela rede de televisão catari al-Jazeera, é de 07 de novembro de 2001. Hamza, hoje com 28 anos, é considerado uma estrela em ascensão dentro da al-Qaeda. Provavelmente por motivos de segurança, não existem imagens dele depois de adulto.| Foto: al-Jazeera/AFP

A voz é de um homem de 28 anos de tom suave, mas a mensagem é Osama bin Laden vintage, dando ordens para matar. Quando a gravação de áudio começou a aparecer em sites jihadistas há duas semanas, era como se o espírito do terrorista morto estivesse se manifestando por meio de seu filho favorito. 

“Preparem diligências para infligir perdas severas aos infiéis”, Hamza bin Laden, rebento do mentor do 11 de setembro, diz em uma voz fina de barítono que ecoa estranhamente seu pai. “Siga os passos daqueles que buscaram o martírio antes de você.” 

A gravação, divulgada pela primeira vez em 13 de maio, é uma em uma série de pronunciamentos do homem que muitos especialistas em terrorismo consideram o príncipe herdeiro da rede mundial da Al-Qaeda. Postado apenas duas semanas antes do ataque suicida de segunda-feira (22) em Manchester, na Inglaterra, a mensagem inclui um clamor específico por ataques em cidades europeias e norte-americanas para vingar a morte de crianças sírias em ataques aéreos. 

Mudanças sinistras

A gravação oferece evidências frescas de mudanças sinistras que estão acontecendo na agressiva organização que declarou guerra ao Ocidente quase duas décadas atrás, de acordo com especialistas em terrorismo e oficiais de inteligência dos Estados Unidos e de países da Europa e do Oriente Médio. Dizimado por ataques militares dos Estados Unidos e ofuscado por anos por seu rival terrorista, o Estado Islâmico, a Al-Qaeda parece estar sinalizando o começo de um novo capítulo violento na história do grupo, liderado por um novo bin Laden — um que jurou buscar vingança pela morte de seu pai. 

Encorajado pelos reveses do Estado Islâmico no Iraque e na Síria, a Al-Qaeda está fazendo uma jogada pela lealdade de seguidores descontentes do Estado Islâmico assim como legiões de simpatizantes ao redor do mundo, dizem os analistas. A promoção de um jovem representante de uma família icônica parece ser um elemento chave no esforço de renovação da marca que inclui uma mudança para ataques terroristas no estilo do Estado Islâmico contra adversário no Oriente Médio, na Europa e na América do Norte. 

“A Al-Qaeda está tentando aproveitar o momento – com o Daesh sob ataque – para oferecer uma nova alternativa aos jihadistas”, disse um oficial de segurança do Oriente Médio, que falou sob condição de anonimato para discutir diagnósticos de agências de contraterrorismo e que usou o acrônimo árabe para o Estado Islâmico. “E o que poderia ser mais efetivo do que um bin Laden?” 

Estrela ascendente

Hamza bin Laden dificilmente é algo novo para o mundo do islamismo militante. Sua coroação como um importante terrorista tem estado em curso desde pelo menos 2015, quando o líder de longa data da Al-Qaeda Ayman al-Zawahiri o apresentou em uma mensagem de vídeo como um “leão do covil” da rede terrorista de bin Laden. Mas, nos últimos meses, ele tem sido promovido como uma estrela ascendente em sites pró Al-Qaeda, com gravações de áudio suas urgindo seguidores a levar a cabo ataques ou comentando sobre fatos recentes. Analistas de terrorismo de longa data dizem que a promoção de Hamza bin Laden parece calculada para atrair jovens militantes islamistas que ainda admiram Osama bin Laden mas veem a Al-Qaeda como ultrapassada ou irrelevante. 

“Hamza é o indivíduo mais carismático e poderoso da nova geração de jihadistas simplesmente por causa da sua linhagem e sua história”, disse Bruce Riedel, que passou 30 anos na CIA e agora é diretor do Projeto de Inteligência do Instituto Brookings. 

“No momento em que Zawahiri e al-Baghdadi parecem estar esmorecendo, Hamza é o herdeiro presumido.” Abu Bakr al-Baghdadi é o líder do Estado Islâmico. 

Estilos diferentes

Mas Hamza bin Laden não está defendendo um jihad no estilo seu pai. Osama bin Laden era notório por suas operações terroristas ambiciosas e cuidadosamente planejadas, dirigida pelos generais da Al-Qaeda e voltada a alvos estratégicos. Seu filho, em contraste, urge seguidores a aproveitar qualquer oportunidade de atacar interesses judeus, americanos, europeus, e de muçulmanos pró-Ocidente, usando qualquer arma que calhe estar disponível. 

“Não é necessário que seja uma arma militar”, ele diz na gravação de 13 de maio. “Se você conseguir por as mãos em uma arma de fogo, muito bom; se não, há muitas outras opções.” 

Astro do rock do mundo jihadista

Surpreendentemente, para um homem que aspira a ser o próximo astro do rock do mundo jihadista, Hamza bin Laden insiste em manter a maior parte de seus detalhes pessoais ocultos do olhar do público. Inclusive seu rosto. 

Não existem fotografias confirmadas do jovem terrorista desde sua infância, quando ele foi retratado múltiplas vezes como um filho devotado posando ao lado de seu famoso pai. Acredita-se que seja casado, com ao menos dois filhos, e viveu por um tempo na região tribunal do noroeste do Paquistão, embora seu paradeiro seja desconhecido. 

Sua recusa a permitir que sua imagem seja publicada pode refletir um receio fundado a respeito de sua segurança pessoal, mas complica a tarefa dos militantes de torná-lo um ícone terrorista, disse Steven Stalinsky, diretor executivo do Instituto de Pesquisa em Mídia do Oriente Médio, uma ONG com sede em Washington que monitora a militância islamista nas redes sociais. 

“Pessoas leais à al-Qaeda e contra o Estado Islâmcio estão buscando inspiração, e eles se deram conta de que podem fornecê-la”, disse Stalinsky. 

Mas os jovens de hoje precisam mais do que áudio e uma fotografia antiga. 

15º de 20 filhos

O que sabe a respeito de Hamza bin Laden vem de suas diversas gravações assim como de relatórios de inteligência e uma pilha documentos recolhidos durante o ataque de fuzileiros navais americanos ao esconderijo de Osama bin Laden em Abbottabad, no Paquistão. Incluídos no tesouro de documentos estavam cartas de Hamza para seu pai, assim como instruções em escrito do ancião dos bin Laden para seus assessores a respeito de como Hamza deveria ser educado e atendido. 

Os documentos revelam um laço especial entre Hamza bin Laden e seu pai que persistiu apesar de longos períodos de separação. O 15ª dos estimados 20 filhos de Osama bin Laden, Hamza foi o único nascido da terceira, e segundo alguns relatos a favorita, esposa do terrorista, Khairiah Sabar, uma mulher saudita cuja linhagem familiar está ligada ao profeta Maomé. 

Ele passou o começo de sua infância com seus pais, primeiro na Arábia Saudita e depois no Sudão e no Afeganistão, onde seu pai começou na juntar as peças de sua rede mundial de terrorismo. Um amigo da família que conheceu Hamza bin Laden quando criança disse que ele se mostrava promissor e precocemente ambicioso. 

“Ele era um jovem muito inteligente e sagaz, que gostava muito de andar a cavalo, como seu pai”, disse o amigo, um associado de longa data da rede da Al-Qaeda, contatado por meio do serviço de chat de uma rede social. “Embora seus pais quisessem que ele se mantivesse longe dos campos de batalha, ele tinha discussões com eles a respeito disso.” 

Vida no Irã

Então vieram os ataques de 11 de setembro, que renderam notoriedade internacional aos bin Laden e fizeram do pai de Hamza o homem mais procurado no mundo. Conforme milícias afegãs patrocinadas pelos Estados Unidos se aproximavam do reduto montanhoso da Al-Qaeda em Tora Bora, no leste do Afeganistão, Osama bin Laden despachou vários de seus filhos e suas esposas para o Irã, acreditando que os líderes da república islâmica ofereceriam proteção contra ataques aéreos dos Estados Unidos. 

Hamza raramente via seu pai depois disso, quando via. Ele ainda estava no Irã no início dos seus 20 anos, vivendo sob uma espécie de prisão domiciliar, quando escreveu uma longa carta a seu pai reclamando a respeito de sua vida “atrás das grades” e expressando o anseio de se juntar a seu pai como um mujahid, ou guerreiro santo, na sua luta contra o Ocidente, de acordo com uma cópia da carta encontrada no esconderijo de bin Laden. 

“O que me faz verdadeiramente triste”, escreveu em 2009, “são que as legiões de mujahideen marcharam e eu não me juntei as elas.” 

O Irã permitiu que o clã bin Laden deixasse o país no ano seguinte, e na época do ataque dos fuzileiros navais em 2011, a mãe de Hamza e outros membros da família estavam vivendo no esconderijo do ancião no Paquistão. Notavelmente ausente do complexo em Abbottabad estava Hamza. Sob ordens de Osama bin Laden, assessores o mantiveram em um esconderijo separado com planos de mandá-lo para o Qatar ser educado, de acordo com oficiais de contraterrorismo dos Estados Unidos e do Paquistão. Já naquela época, o patriarca já estava começando a ver seu filho como um futuro líder da Al-Qaeda, julgando pelas cartas que escreveu a seus assessores pouco antes de morrer. 

“Hamza é um dos mujahideen, e carrega seus pensamentos e aflições”, Osama bin Laden escreveu em uma dessas cartas. “E, ao mesmo tempo, ele pode interagir com a nação muçulmana.” 

"Somos todos Osama”

O senso de predestinação pessoal de Hamza bin Laden apenas se aprofundou com as mortes de seu pai e de seu meio irmã Khalid pelas mãos de soldados americanos. 

Em 2015, quando Zwahiri apresentou Hamza ao mundo como um “leão” da Al-Qaeda, o homem de então 26 anos já tinha a voz de um militante islamista veterano, urgindo seguidores em uma gravação de áudio a infligir o “maior número possível de ataques dolorosos” a cidades ocidentais, de Washington a Paris. 

Um ano depois, ele entregou uma mensagem mais pessoal com o propósito de pagar tributo a seu pai morto. Intitulado “Somos todos Osama”, o ensaio falado de 21 minutos incluía um voto de vingança. 

“Se vocês acham que o crime que perpetraram em Abbottabad passou sem retaliação, estão errados”, disse. “Seu acerto de contas será caro. Somos uma nação que não releva a injustiça.” 

Figura unificadora

Analistas de terrorismo notaram diversos temas recorrentes nas postagens de áudio de Hamza bin Laden que distinguem sua filosofia islamista militante das visões expressadas tanto por seu pai quanto pelo líder putativo da al-Qaeda, Zawahiri. Uma distinção: diferentemente de Zawahiri, Hamza bin Laden tem evitado críticas abertas ao Estado Islâmico, talvez para evitar antagonizar quaisquer seguidores do grupo terrorista que podem estar inclinados a mudar para a al-Qaeda. 

O amigo da família bin Laden sugeriu que a omissão é deliberada, parte de um esforço de posicionar Hamza bin Laden como uma figura unificadora para os militantes islamistas. O associado, que falou sob condição de anonimato para poder comentar livremente, notou que Hamza bin Laden goza de múltiplas vantagens a seu lado, reivindicando ser tanto descendente do profeta como filho da realeza jihadista. 

“O cálculo é de que será muito difícil para a liderança do Daesh denunciar Hamza, dado quem ele é”, disse o amigo da família. 

A outra distinção são os persistentes clamores de Hamza bin Laden por ataques solitários e autoplanejados contra uma ampla gama de alvos. Aqui, ele parece estar emprestando diretamente do roteiro do Estado Islâmico, que tem promovido uma espécie de jihad do homem comum que não depende de instruções ou permissão de superiores. Suas postagens na internet celebraram o psiquiatra do exército e atirador condenado do atentado no Forte Hood Nidal Hasan, que assassinou 13 pessoas em um ataque na base texana em 2009; assim como os dois ingleses de descendência nigeriana que retalharam o soldado inglês Lee Rigby em uma rua do lado de fora de seu quartel, em Londres, em 2013. 

Nenhum desses agressores eram reconhecidamente membros da al-Qaeda. Ainda assim, ao aplaudir tais ataques, Hamza bin Laden parece associar-se a um estilo mais agressivo de terrorismo que atrai jovens militantes islamistas, especialistas e analistas disseram. Tais mensagens também transmitem a impressão de que a rede terrorista, embora abatida, está longe de ter sido derrotada, disse Bruce Hoffman, um ex-assessor para contraterrorismo dos Estados Unidos e diretor do Centro de Estudos de Segurança da Universidade de Georgetown. 

“Ele traz a certeza de que, embora a al-Qaeda tenha sofrido golpes nos últimos anos, ainda está em boa mãos, com um jovem bin Laden que está na situação ideal de levar sua luta adiante”, disse Hoffman. “Desde muito jovem, Hamza bin Laden queria seguir os passos do pai. E da perspectiva da Al-Qaeda, agora é o momento crítico de atingir a maturidade e tomar as rédeas da autoridade.”

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