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Eu passei por disforia de gênero e explorei a transição na minha juventude. Eu tenho consciência das dificuldades emocionais, mas também tenho consciência da descoberta poderosa de que eu estou no controle da minha percepção do mundo. 

Em uma discussão recente no Twitter, Chelsea Manning (que era Bradley Manning), perdoada pelo presidente Obama após ter sido condenada por espionagem, defendeu que é necessário um “tratamento” transgênero para pessoas trans porque, segundo Chelsea, “a falta de atenção médica é fatal para pessoas trans”. 

O argumento de Manning não é único. Quando Leelah Alcorn, 17, cometeu suicídio em 2014, ativistas LGBT imediatamente culparam os seus pais e a sociedade como um todo por essa tragédia. Zack Ford, do ThinkProgress, escreveu

“A morte de Leelah Alcorn foi uma tragédia que poderia ter sido prevenida. Ela era uma garota de 17 anos com acesso a todas as informações disponíveis no século 21 sobre identidades transgênero, incluindo muitos modos seguros e eficazes de transição. Mas, conforme ela escreveu no seu bilhete de suicídio antes de se jogar na frente de um trator nesta semana, não havia esperança com essas possibilidades – nenhuma confiança de que a situação poderia, de fato, melhorar. Ela havia desistido de pedir ajuda.” 

Isso aconteceu apesar do apoio dos seus pais à sua identidade de gênero. Ele se matou porque o seus pais pediram que esperasse até completar dezoito anos antes de começar a transição. Eles também não pagariam pelo tratamento. 

O argumento pode ser resumido assim: sem tratamento médico (cirurgias caras e terapia hormonal pelo resto da vida), aceitação social, uso correto dos pronomes e acesso livre a banheiros, pessoas trans nunca se sentirão confortáveis nos seus corpos ou na sociedade. Consequentemente, elas têm um risco maior de suicídio e é uma injustiça não tornar esses “tratamentos” acessíveis; o crime de matar pessoas trans pode até mesmo ser atribuído a quem não toma essas atitudes. 

Esse argumento, feito por Manning, Ford e muitos outros, tem o objetivo de impedir qualquer crítica – ou até mesmo questionamento – à teoria de gênero, mas apresenta mais questões do que respostas. 

Se precisa de tratamento, não seria uma doença? 

Os diversos recursos liberais são surpreendentemente equivocados em relação ao que é identidade de gênero. Identidade de gênero é um “conhecimento intrínseco”, um problema de desequilíbrio hormonal, o resultado de um cérebro masculino em um corpo feminino, ou um cérebro “transexual”, talvez uma característica hereditária, e muitas outras possibilidades, dependendo de quem é questionado. De acordo com algumas pessoas, gênero é um estado inato e permanente; para outras, é uma consciência fluida que pode mudar diariamente

Como é possível que uma condição tão insuscetível de definição consistente possa ser declarada universalmente fatal sem tratamento médico? 

Além disso, se a transgeneridade exige tratamento médico, como isso pode formar a base da identidade de uma pessoa? Pessoas trans e seus aliados têm, é claro, insistido com grande indignação que a sua condição não é uma doença, mas é difícil ver como essa conclusão pode ser evitada, se há insistência de que isso deve ser tratado sob o risco de fatalidade. 

Doenças que exigem tratamento não constituem a identidade de uma pessoa. Ser soropositivo exige tratamento médico. Eu não me identifico como soropositivo como se isso me tornasse uma pessoa completamente diferente. É uma condição que eu preciso tratar para poder viver e ser saudável. Como ser trans é diferente disso? 

Buscando o alinhamento entre sexo e gênero 

O objetivo da maioria dos indivíduos transgênero é viver como o sexo oposto. Se isso não fosse verdade, não haveria preocupações sobre o “acesso a assistência médica” ou necessidades médicas. Se uma pessoa pudesse simplesmente usufruir de qualquer identidade de gênero que parecesse mais apropriada no momento, uma intervenção médica seria apenas algo cosmético. Então se concordamos que as pessoas que se identificam como transgênero desejam ser do sexo oposto do melhor jeito que estiver ao seu alcance – argumentando que internamente elas já são – então devemos aceitar que o estado ideal para todos os indivíduos é cisgênero, onde o gênero e o sexo se alinham naturalmente. 

Nas minhas experiências, essa afirmação é vista como odiosa e intolerante. Sugerir que as pessoas que se identificam como transgênero desejam ser “como os outros”, “normal” ou – ouso dizer – “saudável” ao alinhar o seu gênero ao seu sexo é sugerir que uma identidade transgênero é por si só um estado de erro. Mas é isso que parece ser pressuposto pelo argumento de que uma intervenção médica é tão vital que, sem ela, uma pessoa pode cometer suicídio. 

Para chegar a um estado saudável e mentalmente estável, uma pessoa trans deve ter o seu gênero e sexo de modo mais alinhado possível. Mas por que é necessário que o sexo biológico mude para se alinhar ao gênero? Por que o gênero não pode mudar? 

Parece muito mais razoável – e medicinalmente mais ético e seguro – chegar a essa homeostase mudando o gênero para se alinhar ao sexo já estabelecido. Uma mulher que toma testosterona deve continuar tomando testosterona ou as suas características sexuais secundárias masculinas desaparecerão (apesar de que, se ela tiver removido os seus ovários, o seu corpo não conseguirá produzir estrogênio e trazer de volta as suas características sexuais femininas). 

Como muitos homens trans preferem manter os seus órgãos reprodutores e engravidar, esse risco é ainda maior. A tentativa agressiva e persistente do corpo de retornar a um estado, apesar das intervenções médicas para ultrapassá-lo, indicam que esse estado é “natural”. O corpo está sendo forçado medicinalmente a se adaptar a condições que ele não está preparado para lidar. 

Se o estado ideal é a homeostase, onde o gênero e o sexo são o mesmo, então por que as pessoas trans dedicariam as suas vidas a obrigar os seus corpos a se adaptarem a condições que eles não podem manter sozinhos? 

Parece muito mais racional reconhecer que o sexo biológico do nascimento é o padrão com o qual as percepções internas deveriam se alinhar. Logicamente, uma pessoa transgênero que sofre devido a um desalinhamento de gênero e sexo pode ser igualmente feliz alinhando o seu gênero ao seu sexo se o resultado final for que o gênero e o sexo são o mesmo? Por que a única opção aceitável é forçar, por meio de uma deformação física drástica, que o corpo se adapte à mente? 

Precisamos de uma cura real 

Alguns defensores da causa trans responderiam que o sexo pode mudar, e não o gênero, porque o sexo tem a capacidade de mudar, enquanto tentativas de mudar o gênero de uma pessoa geralmente terminam mal, mas essa resposta é de um pessimismo desnecessário. 

Eu passei por disforia de gênero e explorei a transição na minha juventude. Eu tenho consciência das dificuldades emocionais, e tenho empatia pelos sentimentos de frustração e desesperança. Mas também tenho consciência da descoberta poderosa de que eu estou no controle da minha percepção do mundo. Mesmo que eu prefira ser mulher, eu entendo que o meu corpo é masculino e, portanto, o plano mais eficaz e saudável é alinhar o meu senso de gênero a esse estado imutável. Eu tive sucesso, em grande parte, e hoje me sinto totalmente integrado e, não apenas me sinto confortável no meu corpo masculino, mas também consigo apreciar a busca por progresso físico masculino. 

Uma verdade desconfortável é que muitas pesquisas, incluindo um estudo sueco de 2011, indicam que as taxas de suicídio permanecem altas após a cirurgia de redesignação sexual (o estudo sueco relata que as pessoas que passaram por cirurgia de redesignação sexual têm 19 vezes mais chances de morrer por suicídio do que a população geral); e o Centro Nacional pela Igualdade de Transgêneros relatou em 2015 que 40% das pessoas que se identificam como transgênero tentaram o suicídio. A comunidade LGBT combate ativamente esses estudos e reprime as vozes das pessoas que, como eu, escolheram o alinhamento natural ou se arrependem de fazer a transição. A comunidade médica está atualmente desinteressada em reconhecer os perigos inerentes e o impacto em longo prazo da terapia de transição e está igualmente indisposta a desenvolver estudos que possam resultar em encontrar uma cura ou uma resolução para o problema. Defender que isso é um problema médico que precisa ser curado é ser acusado de promover genocídio. 

Mas problemas médicos precisam ser curados. Se a disforia de gênero é mesmo naturalmente fatal sem tratamento, a única solução ética é encontrar uma cura que exponha o corpo ao menor risco possível. Obviamente, isso significaria corrigir o problema biológico e/ou resolver o estresse psicológico diante da disforia. 

O movimento LGBT construiu uma civilização ao redor da validação de ser “quem você é” apesar de todas as tentativas de julgamento ou perseguição. Pessoas trans geralmente me dizem que agora estão no seu “gênero verdadeiro”. Defensores como Zack Ford e outros constantemente argumentam que um preconceito social extremo impede que as pessoas trans possam viver uma vida plena e feliz. Mas no centro desse turbilhão de indignação e ostentação de perseverança está a descoberta calma e constante de que essas pessoas são extremamente inseguras. 

Não podemos esquecer a tragédia real nisso tudo. Pessoas que sofrem de uma angústia mental genuína estão recebendo promessas de que, com cirurgias, camuflagem, aceitação social, proteção legal, campanhas educacionais, entre outros, elas finalmente se sentirão completas. Pior do que isso, dizem a elas que o único motivo pelo qual elas continuam a sofrer é devido ao ódio e intolerância daqueles ao seu redor. O método atual de resolver esse problema está apenas piorando-o. O tratamento precisa lidar com o problema principal. 

Chad Felix Greene é autor da série de artigos “Reasonably Gay: Essays and Arguments” (“Racionalmente Gay: Ensaios e Discussões”, em tradução livre) e é escritor social focado na verdade em mídia, ideias e objetivos conservadores e equidade real legal. Siga-o no Twitter @chadfelixg.

Originalmente publicado em Public Discourse: Transgender Suicides: What to Do About Them. Publicado em português com permissão.
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