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O número de ações judiciais por dano moral está crescendo e já é difícil imaginar um processo de reparação na Justiça que não inclua esse tipo de pedido. Para conter o que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) considera excesso, muitas das decisões mencionam a expressão “meros aborrecimentos do cotidiano” como uma maneira de medir se cabe, ou não, a indenização por danos morais.

Além da dificuldade de quantificar um dano que abala a integridade de alguém, a previsão desse tipo de indenização é relativamente recente e foi incluída formalmente na legislação brasileira com a Constituição de 1988. De modo geral, esse tipo de indenização cumpre as funções de punir, prevenir e compensar.

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O advogado Zulmar Duarte explica que ao contrário dos Estados Unidos, onde o dano moral é essencialmente punitivo, no Brasil há uma maior tolerância por parte dos juízes que tendem a se colocar no lugar de ambas as partes. 

 Para professor de Direito Civil da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) Marcelo Calixto não é possível determinar de antemão em quais casos o ganho de danos morais está garantido porque ainda há pouco consenso e poucas súmulas, documentos que reúnem o entendimento comum dos magistrados, sobre o tema. 

Há décadas a professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Celina Bodin pesquisa as decisões do STJ e avalia as modificações do tema ao longo dos anos. Ela considera que houve avanços na proteção de direitos humanos que antes eram considerados irrelevantes para a lei. “De certo modo, o direito se sensibilizou e, consequentemente, também as vítimas se tornaram mais sensíveis a certos fatos lesivos. Se no passado se tinha certeza quanto às situações que geravam danos juridicamente relevantes, hoje reina a incerteza”, diz Bodin. Para ela, com tanta incerteza é natural que as pessoas procurem a Justiça para saber se os casos delas também envolvem dano moral. 

A professora enxerga como positiva a postura do Tribunal de negar indenizações alegando “mero aborrecimento” como forma de valorizar os pedidos de dano moral e evitar o exagero da judicialização da vida em sociedade. Se em um primeiro momento pode parecer positivo cada um defendendo o seu direito, isso também pode significar a diminuição da tolerância. “Na verdade, serve a diminuir a tolerância e a cordialidade social e viraremos todos autores e réus, como ocorre em alguns países que não primam pela tolerância, como os EUA”, diz. 

Ela também aponta que um grande número de pedidos leva à diminuição das indenizações e exemplifica. “Foi o que ocorreu com a negativação indevida do nome nos cadastros de crédito: Nas primeiras indenizações, os juízes frequentemente davam 100 salários mínimos de indenização. Hoje, os valores raramente ultrapassam um salário mínimo”, diz.

Quebra de contrato 

Solicitar um produto e ter problemas com a entrega ou defeito, no entendimento geral no STJ não significam dano moral, ainda que o consumidor tenha direito a reparação do dano material e eventual multa por quebra de contrato. 

 Foi o que o decidiu o STJ em relação à consumidora que comprou azulejos que mudaram de cor após a instalação. Apesar de ter direito a receber o dinheiro da compra, a indenização por dano material, o Tribunal não atendeu ao pedido de dano moral. 

 Um caso recorrente citado pelo professor Marcelo Calixto é do cliente que ao deixar o seu carro no conserto, recebe um provisório e não se agrada do carro. Nesse caso, também não há previsão de ressarcimento por dano moral. 

 Riscos 

 Para a advogada Ana Terra Pagliuca, uma das preocupações ao definir o mero aborrecimento é a naturalização de maus serviços prestados por bancos e empresas de telefonia, por exemplo, as campeãs de reclamações. O que, para ela, não significa ignorar o direito da empresa em corrigir algum erro no serviço prestado ou na entrega do produto, mas isso dentro dos prazos já observados pelo Código de Defesa do Consumidor. 

 Memes políticos 

 Antes de arrumar uma briga é bom lembrar que calúnia e difamação tem previsão para indenização moral. Mas como definir o que é difamação na política? O vereador de Assis, cidade do interior de São Paulo, pediu indenização por memes que usavam sua foto e o associavam como corrupto, mas perdeu a causa. Nesse caso, a 2ª vara Cível de Assis (SP) entendeu que a pessoa pública está sujeita a comentários pelo cargo que ocupa. 

Coração partido não tem preço 

 Querer reparação financeira pela dor de um pé na bunda, traição ou relação conflituosa entre pais e filhos dificilmente terá ganho de causa. Para estes casos, a maioria dos magistrados entendem que não se deve monetarizar as relações familiares e afetivas.

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