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É moda em outros países e deve chegar ao Brasil: cresce o número de filhos que iniciam processos judiciais contra os pais pedindo a retirada de fotos e vídeos de redes sociais. O caso de maior repercussão nas últimas semanas foi o de uma mãe italiana condenada a pagar uma indenização de 10 mil euros caso não apagasse as imagens do filho de 16 anos de seus perfis no Facebook e no Instagram. Mas o que diz o ordenamento jurídico brasileiro sobre isso? Seria possível a mesma sentença por aqui?

A resposta é sim, mas depende muito do conteúdo postado, afirmam especialistas. Ainda que, como não existem precedentes, é difícil saber como os juízes brasileiros se comportariam em demandas desse gênero.

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Quando pai ou mãe abusam do poder familiar e causam danos aos filhos por meio de imagens em redes sociais, esse comportamento poderia fundamentar uma sentença que obrigasse os pais a suprimirem esses dados e até a pagar uma indenização. Seria um dos atos ilícitos previstos no artigo 187 do Código Civil.

“É conforme ao ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade abstrata, hipotética, de uma exposição indevida da criança, de gerar uma pretensão indenizatória, pelo exercício abusivo do poder familiar”, explica Rodrigo Xavier Leonardo, advogado e professor de Direito Civil da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

O recurso à Justiça poderia ser feito pelo próprio interessado, se decidir esperar os 18 anos, ou antes, por meio de um curador especial. “O adolescente menor de 18 anos poderia ingressar um pedido, dizendo que sabe que não tem legitimidade, e requerer que o juiz nomeie um curador especial para representá-lo uma vez que seus pais serão os réus da demanda”, explica Mayta Lobo, coordenadora da pós-graduação de Psicologia Jurídica da UniBrasil e sócia do Instituto Dialogação.

Em casos de pedidos de indenização de fotos da época de infância ou adolescência, não importa a data da postagem, desde que o interessado entre com a requisição antes dos 21 anos. “A prescrição para questões indenizatórias no Código Civil é de 3 anos; nesses casos, o prazo iniciaria a partir da capacidade civil absoluta, 18 anos, e terminaria em três anos, aos 21”, diz Rodrigo Xavier, da UFPR.

“Uma situação é a mãe postar uma foto ao lado do filho, e o adolescente, em uma fase de rebeldia, dizer ‘eu não queria’. Nesse caso, talvez o juiz entendesse que não era o caso de proibir a mãe de postar a foto. Outro caso é a mãe postar imagens dos filhos, em poses questionáveis ou em uma situação que beira ao ridículo, que pode causar humilhação, ou um vídeo vexatório”

Mayta LoboCoordenadora da pós-graduação de Psicologia Jurídica da UniBrasil e sócia do Instituto Dialogação

Registro familiar e “videocassetada”

Sobre o conteúdo, os especialistas acreditam que seria muito diferente a análise do pedido de retirada de um simples abraço dos pais com o filho e de um vídeo de conteúdo humilhante, como uma “videocassetada”. As solicitações de indenização por supostos danos extrapatrimoniais abrem espaço para a subjetividade e o juiz interpretará se houve abuso ou uma simples frivolidade.

De acordo com Mayta Lobo, é preciso respeitar tanto o interesse do pai ou da mãe de mostrar a família quanto o da criança ou adolescente de não ter a sua intimidade violada. Seguindo a letra da lei, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente explicitado na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a requisição de retirada poderia ter uma eventual procedência, a depender do entendimento do magistrado que assumir a causa.

“Uma situação é a mãe postar uma foto ao lado do filho, e o adolescente, em uma fase de rebeldia, dizer ‘eu não queria’. Nesse caso, talvez o juiz entendesse que não era o caso de proibir a mãe de postar a foto”, exemplifica Mayta Lobo. “Outra situação é a mãe postar imagens dos filhos, em poses questionáveis ou em uma situação que beira ao ridículo, que pode causar humilhação, ou um vídeo vexatório”, compara.

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Precisa mesmo? Esse é o melhor caminho?

Quando há crime envolvido em exposição de fotos ou vídeos, ninguém duvida de que é preciso acionar o Judiciário. Nos casos mais graves, o juiz pode determinar a suspensão ou a perda do poder familiar. Mas quando o motivo para recorrer aos tribunais é vil ou fútil, dificilmente seria bem-sucedida.

“Levar esse tipo de questão para o poder judiciário resolver demonstraria uma patologia nas relações, faria parte de uma cultura de judicialização que me parece funesta”, opina Rodrigo Xavier, da UFPR.

Para Mayta Lobo, uma saída para que esse tipo de rixa seja resolvido da melhor forma possível são os serviços de mediação familiar, previstos no novo Código de Processo Civil. “Se uma situação similar chega ao poder judiciário, isso significa que é uma família que não tem diálogo, onde se quebrou uma confiança, e aí o papel do mediador seria justamente isso, de buscar restabelecer relações”, considera.

As feridas deixadas após uma briga judicial são difíceis de curar. “O Judiciário não é uma boa ferramenta para resolver problemas judiciais porque é cara, é morosa, não pensa nas emoções, nos sentimentos, resolve tudo com dinheiro”, diz.

Direitos de imagem

Nunca é demais lembrar que, a rigor, todas as fotos postadas em redes sociais necessitam de autorização das pessoas que aparecem na imagem. Mesmo que não seja comum pedir autorização aos amigos, há casos de processos em que os juízes entenderam que a imagem de uma pessoa foi utilizada de forma indevida e, portanto, passível de indenização.

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