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| Foto: Letícia Akemi/Gazeta do Povo

“Desculpe, mas você não pode votar”. Esta frase dirigida a um inquilino em uma assembleia de condomínio é comum, principalmente quando o encontro tratará de assuntos espinhosos, como reformas ou iniciativas questionáveis de moradores. Mas ela é legítima? Ou o inquilino pode se insurgir e conseguir voz e voto?

A questão é polêmica. Primeiro, porque o Código Civil de 2002 não trata desse assunto como a Lei 4.591 de 1974, que previa a possibilidade de o inquilino votar, com exceção das decisões envolvendo despesas extraordinárias, caso o proprietário não estivesse presente (parágrafo 4º. do artigo 24). Depois, porque em muitos edifícios existe o costume de permitir ao locatário votar nas assembleias, muitas vezes até incluído textualmente na convenção do condomínio. A interpretação, portanto, em uma briga judicial, depende do juiz e das circunstâncias, porque a dúvida continua em aberto.

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“Alguns juristas entendem que, como o Código Civil não tratou especificamente dessa questão, o parágrafo quarto do artigo 24 da lei antiga continua em vigor”, explica Alexandre Marques, vice-presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB-SP. Para ele, esta seria a melhor interpretação da lei, mas, como o tema não está pacificado, recorda que nem sempre os magistrados decidem dessa maneira.

“Acredito que o inquilino que se apresenta como inquilino, paga a cota patrimonial, se o proprietário não está presente ou ninguém que o esteja representando com uma procuração, possa votar nas despesas ordinárias, até porque quem vai pagar por essas despesas ordinárias é ele mesmo, conforme a lei de locação”, completa. A única exceção, para Alexandre, seria se a convenção fosse explícita sobre a necessidade de procuração com firma reconhecida para esse fim ou determinasse que só proprietários pudessem votar.

Já o advogado Bruno Schirati Guimarães, presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-PR, avalia o fato de forma diferente. Ele comunga com a visão de outros juristas ao avaliar que houve uma revogação tácita da lei antiga, por não ser possível “haver dois diplomas jurídicos tratando do mesmo tema” – mesmo sem a invalidação expressa da Lei 4.591 de 1964. Sendo assim, “uma vez que não há qualquer menção ao locatário nas disposições do Código Civil, o qual faz menção exclusivamente ao condômino, é de se sustentar que somente este pode votar, tanto no que se refere às despesas extraordinárias, quanto ordinárias”, afirma. 

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Os dois especialistas afirmam, por outro lado, que o locatário sempre poderá votar se tiver a procuração com firma reconhecida do dono do imóvel ou se a convenção do condomínio permitir essa faculdade. Bruno Schirati Guimarães acrescenta ainda que, neste último caso (permissão na convenção do condomínio), para ele ainda seria necessária a autorização do locador.

Usos e costumes

Para atuar de forma mais segura, Alexandre Marques recomenda muita transparência nos comunicados de assembleias e atenção aos usos e costumes. Segundo ele, há situações em que os juízes decidiram a favor de inquilinos mediante, por exemplo, a apresentação de atas de dezenas de assembleias anteriores em que pessoas votaram com procuração sem firma reconhecida. 

“Um exemplo prático. Em um determinado prédio, a firma reconhecida nunca foi exigida, não tem nada na convenção ou, pior, até traz essa previsibilidade, mas faz 30 anos que o inquilino mora lá e nunca precisou disso. Aí, ele chega a uma determinada assembleia para votar um assunto que é polêmico, ou até para se candidatar para alguma coisa, e na hora a pessoa que está organizando a assembleia impede o inquilino de votar porque a procuração não está com firma reconhecida. Isso não pode acontecer, a pessoa não pode ser surpreendida na hora da assembleia”, diz Alexandre. 

Para evitar esse problema, Alexandre recomenda que o síndico faça constar na convocação da assembleia que só poderão votar condôminos munidos de procuração com firma reconhecida, especialmente quando a tradição do prédio é diferente. 

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