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Ao menos temporariamente, o terremoto que abalou o Nepal derrubou um símbolo da divisão de classes sociais na capital. Antes exclusivo a seus 300 sócios, o campo do Royal Nepal Golf Club, em Katmandu, foi invadido por desabrigados após o devastador tremor de sábado (25).

Um buraco na cerca de arame abriu caminho para que dezenas de famílias instalassem tendas e cozinhas improvisadas sobre o bem cuidado gramado. A invasão fez a alegria de jovens que podem treinar suas tacadas à vontade e a aflição dos administradores do clube.

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O campo de golfe é um dos muitos acampamentos surgidos em Katmandu desde sábado, ocupados por vítimas do terremoto. Muitos estão sem teto, mas mesmo os que não perderam suas casas temem um novo terremoto e preferem ficar ao ar livre. Os tremores menores que se seguiram ao terremoto de sábado os convenceram de que voltar para casa ainda é arriscado demais.

Cercado de crianças, o desempregado Rajiv Deula, 24, exibia sua habilidade mandando as bolas para além de uma colina, enquanto relembrava os momentos de pânicos vividos no terremoto.

“Era a hora do almoço, eu comia num restaurante quando tudo começou a tremer. Achei que iria morrer, mas corri para a rua e escapei”, contou Rajiv. “Nossa casa ficou intacta, mas minha família decidiu que era melhor ficar aqui no campo de golfe”.

Para que não falte o básico para ninguém, as famílias fizeram um esquema de mutirão, em que cada um contribui com o que tem e as refeições são preparadas de forma coletiva, em grandes panelas. O lixo já começa a tomar conta de boa parte do campo, sem falar nas necessidades feitas pelos moradores em cantos mais discretos, já que não há banheiro próximo.

Observando tudo à distância, Deepak Thapa, 46, treinador de golfe e administrador do clube, não esconde sua preocupação com os estragos causados ao “green”, como é conhecida a parte mais aparada do campo. Ele conta que na véspera do terremoto o clube havia acabado de finalizar uma reforma do “green”, que custou 300 mil rúpias (R$ 8,6 mil).

“Agora provavelmente teremos que refazer a reforma em algumas partes do gramado, mas não tem problema. Vivemos uma tragédia e o importante é que essas pessoas tenham onde ficar. Só estou fiscalizando para o estrago não ser grande demais”, diz.

Quando a noite cai, conta o treinador, o campo fica lotado de famílias que entram pelo buraco na cerca. A taxa de uso do campo nem é tão alta, cerca de R$ 80, mas para os padrões nepaleses é acessível para poucos, num país em que esse é o salário mensal de um trabalhador simples.

O estudante Firoz Deula, 16, era um dos que aproveitaram a estadia forçada no campo de golfe para praticar o esporte, seu favorito. “Fiquei com muito medo quando aconteceu o terremoto, mas agora pelo menos posso jogar todo dia”, conta Deula, que aprendeu os movimentos básicos com um tio quando era pequeno. Hoje, seu sonho é tornar-se profissional da modalidade e seguir os passos do número um do golfe nepalês, Shiva Ram Shrestha.

Não muito longe dali, na sede do clube, Shiva sorri ao saber que há fãs dele entre os “invasores”, mas confessa que não é muito diferente deles quando o assunto é o terremoto. “Foi terrível, achei quee não iria escapar”, relembra.

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