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Escola na cidade de Santa Fé, Texas, onde um atirador matou dez pessoas e deixou outras dez feridas, na sexta-feira (18) | SCOTT OLSONAFP
Escola na cidade de Santa Fé, Texas, onde um atirador matou dez pessoas e deixou outras dez feridas, na sexta-feira (18)| Foto: SCOTT OLSONAFP

Um dia depois de um estudante fazer um tiroteio em uma escola de ensino médio no Texas, uma comunidade da área de Houston se deparou com uma realidade que se já desdobrou em tantos outros lugares do país.

Na manhã de sexta-feira, um estudante de 17 anos armado com uma espingarda e uma pistola invadiu sua escola nos arredores de Houston, matando 10 pessoas – a maioria estudantes – antes de se render aos policiais que o confrontaram, disseram autoridades. 

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Dez outros ficaram feridos, incluindo um oficial da segurança da escola que ficou em estado crítico, disse a polícia. 

A Santa Fe High School tornou-se o mais recente cenário de carnificina no que se tornou uma epidemia nacional de tiroteios em massa. Pela segunda vez nos últimos três meses, as vítimas eram crianças e seus professores. 

Desta vez, aconteceu durante o primeiro período. 

Isabelle Laymance, 15, estava na aula de artes, desenhando formas geométricas, quando ouviu tiros. Ela congelou por um momento, depois correu para uma porta dos fundos que dava para um pátio, mas estava trancada. Ela e outros sete estudantes entrincheiraram-se em um armário de depósito que conectava duas salas de aula de arte. Ela se deitou no chão e chamou a polícia, e depois ligou para a mãe, sussurrando "eu te amo" enquanto segurava a mão de um amigo. Eles se calaram, na esperança de evitar serem descobertos. 

Esconderijo

O atirador vestido de sobretudo – que a polícia identificou como o estudante Dimitrios Pagourtzis – entrou na primeira sala de aula de artes e começou a atirar. Ele sabia que os estudantes estavam escondidos no armário de suprimentos, disse Isabelle. 

"Ele disse 'surpresa', depois começou a atirar e matou uma ou duas pessoas. E atirou numa menina na perna. No armário. Ele atirou pela janela", disse ela. "Nós bloqueamos as portas e ele continuou tentando entrar e continuou atirando dentro do armário". 

Ela ligou para a polícia três vezes ao longo de 30 terríveis minutos. Um oficial disse a ela para ficar quieta e assegurou que a ajuda estava a caminho, ela disse. 

O atirador continuou atirando, xingando e gritando. Ele atirou em um policial que se aproximou, depois começou a discutir com outros policiais, oferecendo sua rendição. 

"Ele dizia: 'Se eu sair, não atire em mim'. Eles não atiraram nele, apenas o algemaram", disse ela. 

Pagourtzis, que os estudantes descreveram como um solitário quieto, foi detido na sexta-feira (18) sem fiança na cadeia do condado de Galveston, acusado de assassinato e agressão agravada contra um oficial. Não ficou claro o que motivou o ataque, já que as autoridades disseram que não houve qualquer aviso óbvio. 

Pagourtzis fez sua primeira aparição no tribunal na sexta-feira à noite, pouco mais de 10 horas após o massacre. Ele falou em voz baixa, dizendo "Sim, senhor" quando perguntado se ele queria um advogado nomeado pelo tribunal. Após a breve audiência, Pagourtzis foi levado embora. 

A polícia disse que Pagourtzis deu uma declaração assumindo a responsabilidade pelo tiroteio, de acordo com uma declaração de causa provável apresentada no tribunal. Pagourtzis disse à polícia que ele foi para a escola usando um sobretudo e empunhando duas armas com a intenção de matar pessoas. 

O documento do depoimento, que o identifica como Dimitrios Pagourtzis Jr., afirma que o rapaz de 17 anos disse à polícia que "ele não atirou em alunos de quem gostava para poder contar sua história". 

Explosivos

As duas armas usadas no tiroteio pertencem ao pai de Pagourtzis, de acordo com o governador republicano Greg Abbott, que disse não estar claro se o pai sabia que seu filho as havia levado. Ao contrário de muitos outros tiroteios em massa realizados com fuzis de alta potência como o AR-15, este, segundo as autoridades, incluiu armas relativamente comuns. 

A polícia disse que também encontrou dispositivos explosivos dentro da escola e em locais fora do campus. 

Autoridades disseram que também estavam examinando dois outros possíveis suspeitos no tiroteio. O xerife do condado de Harris, Ed Gonzalez, disse que as autoridades interrogaram outro estudante, descrito como "uma pessoa de interesse". Abbott disse que a polícia também espera falar com uma terceira pessoa que ele disse que poderia ter "certas informações", embora ele não tenha dado detalhes. 

Três policiais responderam ao ataque, disseram autoridades. O primeiro a confrontar o atirador foi o oficial de segurança da escola John Barnes, um policial aposentado de Houston que, segundo um ex-colega de Houston, capitão Jim Dale, se juntou à força policial do Distrito Escolar Independente de Santa Fé porque queria um trabalho menos estressante. 

Barnes foi baleado nos dois braços, disse Dale. Um segundo oficial da força policial do Distrito Escolar de Santa Fé chegou, puxou Barnes para um lugar seguro e aplicou um torniquete. Um terceiro oficial, um policial estadual, também enfrentou o atirador, segundo um policial estadual. 

As autoridades ainda não forneceram uma linha do tempo mostrando quanto tempo levou para responder às chamadas de emergência, nem revelaram muitos detalhes sobre suas interações com o atirador. 

Barnes foi levado de helicóptero para o centro de trauma da Faculdade de Medicina da Universidade do Texas, em Galveston, onde corria o risco de "hemorragia" quando chegasse, disse a repórteres o médico-chefe Gulshan Sharmer. Dale, o capitão da polícia de Houston, disse que muitos policiais foram ao hospital para mostrar seu apoio, e a família está com bom ânimo depois de ouvir dos médicos que os ferimentos de Barnes provavelmente não foram fatais. 

A Escola Secundária de Santa Fe, casa dos Indians, havia vencido um prêmio estadual por seu programa de segurança. Como um presságio ameaçador para o tiroteio de sexta-feira, a escola havia passado por um falso alarme de atirador ativo em fevereiro, um evento que atraiu uma enorme resposta de emergência e a chegada caótica de pais amedrontados. 

Muitos dos 1.400 alunos realizaram uma passeata em 20 de abril, como parte de um protesto nacional contra tiroteios em escolas, parte de um movimento de base entre jovens americanos após o massacre de 17 estudantes e funcionários na Escola Marjory Stoneman Douglas em Parkland, Flórida. 

Uma placa levada por estudantes de Santa Fé durante o protesto de abril: "#NeverAgain". 

Quatro sextas-feiras depois, a escola deles foi atacada. 

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Gage Slaughter, 17, disse que estava sentado em sua aula de história quando o tiroteio começou. Quando ele ouviu os tiros, ele pensou – como tantas vezes acontece nos tiroteios em massa – que eram apenas fogos de artifício. Alguém acionou um alarme de incêndio, ele disse, e todos foram para fora. Em seguida, um treinador e alguns professores disseram aos alunos para começar a correr. 

"Havia pessoas que estavam começando a chorar", disse ele. "Eu não sabia o que estava acontecendo até que eu estava um pouco mais distante na rua e ouvi um dos professores dizendo que era um atirador na escola." 

Nas horas que se seguiram, policiais fortemente armados em equipamentos táticos cercaram a escola. As autoridades disseram que foram encontrados explosivos na escola e nas áreas vizinhas, e colocaram avisos nas mídias sociais para as pessoas que as pessoas evitassem tocar em algo que não era familiar. 

Os pais estavam pegando seus filhos mais cedo em outras escolas da região, enquanto viam o horror que tinha chegado à comunidade deles. 

“Eu só preciso abraçar minha menininha”, disse Catharine Lindsey, uma mãe que mora nas proximidades e disse que podia ouvir os helicópteros de resgate de sua casa. "Desde Parkland, eu tive que dizer à minha filha de 13 anos para 'não ser uma heroína, se esconder e ficar segura com a professora' se algo assim acontecer, porque ela é do tipo que tentaria conversar e convencer o atirador”. 

Este foi o 16ª tiroteio em escolas até agora este ano, de acordo com uma análise do Washington Post. Esse é o maior número dessa época em qualquer ano desde 1999, o ano do massacre de Columbine High. A análise do Post constatou que, desde 1999, os tiroteios em escolas mataram pelo menos 141 crianças, educadores e outras pessoas, com outros 284 feridos. 

Havia poucas informações sólidas sobre as vítimas em Santa Fe High nas horas após o tiroteio. 

Aluna de intercâmbio

A Embaixada do Paquistão confirmou na noite de sexta-feira que Sabika Sheikh, uma estudante de intercâmbio paquistanesa, foi morta no ataque. 

"Nossos pensamentos e orações estão com a família e os amigos de Sabika", disse em nota o embaixador Aizaz Ahmad Chaudhry. 

Outro aluno de intercâmbio, Sayyed Zaman Haider, disse que Sabika era da cidade de Karachi e estava estudando através do Programa de Intercâmbio e Estudo para Jovens Kennedy-Lugar, financiado pelo Bureau de Assuntos Educacionais e Culturais do Departamento de Estado dos Estados Unidos. Um porta-voz da agência não respondeu imediatamente a um pedido de comentários. Haider disse que Sheikh estava prestes a voltar para casa: o ano acadêmico estava terminando, então ela estava quase terminando seu intercâmbio cultural. 

Professora substituta

Cynthia Tisdale, 63 anos, professora substituta da Santa Fe High School, morreu durante o tiroteio no local, sua família confirmou na sexta-feira. Tisdale trabalhava na escola com frequência, disse seu filho Recie Tisdale. 

"Ela começou a trabalhar como professora substituta porque adorava ajudar crianças", disse ele. "Ela não precisava fazer isso. Ela fazia porque ela adorava". 

Recie Tisdale é um detetive da polícia na cidade vizinha League City. Cynthia Tisdale vivia em Dickinson, Texas, com seu marido, casados há quase 47 anos, William Tisdale. 

O casal teve três filhos e 11 netos. William Tisdale disse que sua esposa também foi paralegal por 22 anos. "Ela era uma boa mulher", disse ele. "Ela cuidava de mim." 

Entre os feridos estava o aluno de segundo ano Rome Shubert, um arremessador do time de beisebol da escola, que disse que uma bala passou de raspão por sua cabeça. "Sou muito grato e abençoado por Deus ter poupado minha vida hoje", escreveu Shubert em um tweet. "Hoje eu fui baleado na nuca, mas estou completamente bem e estável." 

Na noite de sexta-feira, os estudantes se reuniram em uma vigília aqui vestindo camisetas, feitas depois do furacão Harvey, que diziam "Texas Tough" [forte do Texas]. Na parte de trás: "Indians got your back" [Os Indians te apoiam]. 

O tiroteio imediatamente trouxe condenação em todo o país. O presidente Donald Trump rapidamente condenou o tiroteio no Texas. 

"Isso vem acontecendo há muito tempo em nosso país – muitos anos, muitas décadas", disse Trump em Washington. "Sofremos pela terrível perda de vidas e mandamos o nosso apoio e amor a todos os afetados por esse ataque absolutamente horrível." 

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Em Santa Fé, o senador republicano Ted Cruz disse: "Mais uma vez o Texas viu a face do mal." 

Na sexta-feira, a estrela do Houston Texans J.J. Watt se ofereceu para cobrir pessoalmente os custos do funeral de todas as vítimas do tiroteio de Santa Fé. 

Em sua foto de registro da prisão, o suspeito, Pagourtzis, tem uma expressão vazia, como se estivesse entediado. 

Em uma página do Facebook, Pagourtzis postou uma foto de uma camiseta com os dizeres “Born to Kill” [Nascido para Matar], disse Abbott durante uma coletiva de imprensa na tarde. Mas Abbott disse que o suspeito não tinha ficha criminal nem mostrava sinais de ser violento. Ele disse que, neste caso, não havia o tipo de alerta visto em outros tiroteios em massa, como o do ano passado em uma igreja em Sutherland Springs, Texas, ou o de Parkland. 

O suspeito registrava seus pensamentos em seu computador e celular, e os escritos revelaram não apenas que ele pretendia cometer o tiroteio, mas também planejava cometer suicídio, disse o governador. Ele disse que o atirador não teve "coragem" de seguir adiante com o suicídio. 

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Cópia de crimes

Especialistas em tiroteios em massa notam que os assassinos estudam seus predecessores, copiam seus movimentos e até mesmo suas escolhas de roupa. O atirador em Santa Fe High pareceu copiar elementos do massacre de Columbine: um sobretudo preto, uma espingarda, explosivos. 

Mais de 30 atiradores copiaram os assassinos de Columbine, e admitiram que o fizeram, segundo Adam Lankford, um professor de criminologia na Universidade do Alabama. 

"Esta parece ser uma versão mais extrema por causa de todos os diferentes elementos que parecem ter sido copiados, de roupas a armas e modus operandi em termos de plantar bombas", disse Lankford. "É uma forma de adoração a celebridades. As celebridades neste caso são as celebridades assassinas – os assassinos de Columbine." 

Abbott disse que convocará uma mesa-redonda de especialistas para discutir maneiras de evitar outro tiroteio em escola, incluindo acelerar verificações de antecedentes sobre compradores de armas, colocar mais recursos para tratamento de saúde mental e aumentando pessoal de segurança. 

O vice-governador Dan Patrick disse que a infraestrutura é um problema: “As escolas têm muitas entradas e saídas e precisam ser reformadas”. 

“Podemos precisar endurecer nossas escolas e torná-las mais seguras”, disse Patrick. 

O noticiário de TV e as mídias sociais foram dominados na sexta-feira por imagens dolorosamente familiares de estudantes sendo levados para fora da escola por oficiais armados. Sobreviventes do massacre de Parkland e seus parentes, muitos dos quais se tornaram ativos defensores de leis mais rígidas de controle de armas, publicamente ofereceram apoio à comunidade de Santa Fé – e enviaram mensagens de raiva para políticos que eles dizem não ter agido para evitar tais massacres. 

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Berman, Achenbach e Wang fizeram a cobertura de Washington. Christian Davenport e Stephanie Kuzydym, do The Washington Post, de Santa Fé, Texas; e William Wan, Julie Tate, Alice Crites, Jennifer Jenkins, Jenna Johnson, Susan Svrluga, Emily Wax, Matt Zapotosky, Nick Anderson e Abigail Hauslohner em Washington contribuíram para essa matéria.

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