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Caminhão leva um  protótipo do sistema pensado pela Nasa: uma asa de pouco mais de 9 metros, a mesma de um pequeno avião, equipada com 18 motores elétricos, cada um com uma pequena hélice vermelha. | EMILY BERL/NYT
Caminhão leva um protótipo do sistema pensado pela Nasa: uma asa de pouco mais de 9 metros, a mesma de um pequeno avião, equipada com 18 motores elétricos, cada um com uma pequena hélice vermelha.| Foto: EMILY BERL/NYT

Ele nunca voará pelo céu azul, mas o caminhão Peterbilt empoeirado, estacionado em frente a um hangar do Centro de Pesquisa Aérea Armstrong da NASA, pode representar o futuro da aviação com baixas taxas de carbono.

Presa a suportes de aço atrás da cabine do caminhão há uma asa de pouco mais de 9 metros, a mesma de um pequeno avião; porém, em vez de ter um ou dois motores queimando combustível fóssil, ela é equipada com 18 motores elétricos, cada um com uma pequena hélice vermelha.

O híbrido faz parte um projeto da NASA chamado LeapTech, que visa testar uma nova abordagem de combustível aéreo: quando técnicos e engenheiros dirigem o caminhão pelo leito seco de um lago dessa base no deserto, a mais de 110 km/h, as hélices movidas a bateria giram como em uma decolagem iminente.

“Somos capazes de simular configurações de decolagem e aterrissagem completas e medir sustentação, resistência, eficiência do motor e desempenho aerodinâmico”, disse Sean Clarke, engenheiro e principal pesquisador do projeto.

O conceito, chamado propulsão distribuída, é um dos vários sendo estudados neste e em outros centros de pesquisa para desenvolver tecnologias que resultem em projetos de aeronaves completamente novos e muito menos poluentes.

Os aviões do futuro poderão ser alimentados por baterias ou sistemas híbridos gasolina/eletricidade, por exemplo, e ter asas mais leves que mudem rapidamente de forma a lidar melhor com as tensões provocadas por turbulências. Outros podem eliminar o modelo convencional de asas e fuselagem por um que combine os dois elementos, tudo para contribuir com a diminuição de emissões.

Poluição

A aviação comercial é responsável por cerca de 2% do total global de dióxido de carbono liberado anualmente pela atividade humana, ou um pouco menos do que é produzido pela Alemanha.

Embora fabricantes e companhias aéreas tenham melhorado a eficiência das viagens – o Grupo de Ação de Transporte Aéreo, uma organização do setor, estima que as emissões por assento/milha tenham diminuído 70% desde a década de 60, quando os jatos começaram a operar – o enorme crescimento da indústria resultou em emissões totais mais elevadas.

E esse crescimento não dá sinais de que vá parar. A Organização Internacional da Aviação Civil (OIAC), agência das Nações Unidas que supervisiona o setor, prevê que a frota comercial mundial irá dobrar nos próximos 15 anos, chegando a cerca de 40 mil aviões. E um relatório recente da Comissão Europeia observou que, conforme os países e outras indústrias diminuem suas emissões, a aviação poderia eventualmente ser responsável por mais de um quinto do total global.

Embora o setor tenha sido deixado de fora do acordo sobre o clima adotado em Paris no mês passado – essa omissão fez alguns ambientalistas se perguntarem se o acordo era realmente “histórico” –, reduzir as emissões continua a ser uma prioridade para a OIAC, disse um porta-voz. Entre outras iniciativas, a agência deverá aprovar normas de certificação que visam limitar as emissões de CO2 em novas aeronaves.

Economia

As emissões estão diretamente relacionadas ao consumo de combustível e este compõe um terço ou mais dos custos de uma companhia aérea; por isso, as empresas e os fabricantes continuam a buscar melhorias.

Os aviões se tornaram mais leves com o uso de materiais compostos, como os que compõem cerca de metade da fuselagem de um Boeing 787; os motores a jato se tornaram mais eficientes; combustíveis alternativos, como os biocombustíveis, estão começando a ser usados e podem diminuir drasticamente as emissões de carbono; medidas operacionais como a melhor gestão do tráfego aéreo, tanto em aeroportos quanto no ar, conseguiram reduzi-las ainda mais.

Daniel Rutherford, que estuda emissões de aeronaves como diretor do programa do grupo de pesquisa Conselho Internacional de Transportes Limpos, disse que as melhorias no consumo de combustível, que chegaram à média de redução de 1,3% ao ano, devem continuar na próxima década.

“Os projetos eficientes desenvolvidos na década passada, quando os preços dos combustíveis estavam altos, estão chegando ao mercado agora”, disse ele.

Muitas das melhorias envolvem mudanças em aviões já em uso – como adicionar aletas às asas, para reduzir a resistência e melhorar a capacidade em alguns pontos percentuais, ou substituir os motores mais velhos por modelos mais econômicos. “A chamada reengenharia, na verdade, foi o fator que mais contribuiu para melhorar a eficiência do combustível no longo prazo”, disse Rutherford.

Algumas aeronaves foram parcialmente reprojetadas. No fim desta década, por exemplo, a Boeing irá introduzir uma variante do seu modelo 777, o 777x, com novas asas compostas e motores mais eficientes.

Engenharia

Para alcançar a drástica redução de emissões que pode ser necessária até meados deste século – tornar a aviação o mais livre possível do carbono – podem ser necessários novos projetos de aeronaves “limpas”, que incorporem novas tecnologias e abordagens. É aí que entra o Centro de Pesquisa Aérea Armstrong, que desenvolve conceitos tecnológicos que os fabricantes podem utilizar um dia em projetos radicalmente novos.

Não muito longe do LeapTech, há outro hangar contendo um jato Gulfstream que foi completamente desmontado e recebeu centenas de sensores. É uma área de teste de tecnologia aérea que busca modificações para as asas. Onde normalmente haveria um flap, há uma superfície contínua e curva que altera as características aerodinâmicas da asa.

O conceito ainda está sendo desenvolvido, mas o objetivo final são asas que poderiam se transformar em tempo real, de acordo com as condições existentes.

“A ideia é substituir toda a extremidade de uma asa com tecnologia como essa para poder alterar continuamente sua forma visando reduzir a resistência e aumentar o suporte”, disse Ethan Baumann, engenheiro-chefe do jato de teste. A tecnologia também poderia permitir que as forças de resistência e sustentação fossem distribuídas pelas asas para evitar a sobrecarga, para que elas fossem mais leves do que as convencionais.

A ideia por trás da propulsão distribuída é tirar os motores da sua posição habitual, pendurado sob as asas, e colocá-los em outro lugar. Os motores de um jato são dispositivos complexos e pesados, por isso projetos de propulsão distribuída quase sempre envolvem pequenos motores elétricos mais simples.

“Faz sentido repensar a localização dos motores ao se projetar um veículo do zero”, afirmou Clarke.

Em uma turbina a jato típica, o núcleo central queima combustível e ar, fornecendo energia para ligar um ventilador. Esse ventilador traz mais ar, que passa pelo núcleo e sai pela parte de trás, produzindo maior impulsão. Os motores se tornaram mais eficientes ao incorporar ventiladores maiores para aumentar a quantidade do ar que movimentam, mas há um limite para seu tamanho.

Um projeto distribuído pode simplesmente adicionar mais ventiladores, desde que haja eletricidade suficiente para fazê-los funcionar. “Agora não estamos limitados ao tamanho do motor”, disse Panagiotis Laskaridis, que pesquisa propulsão distribuída na Universidade Cranfield, na Grã-Bretanha.

A distribuição dos motores pelo avião também pode trazer vantagens aerodinâmicas. Com a asa do LeapTech, a posição dos motores causou uma aceleração do fluxo de ar, aumentando a sustentação em baixas velocidades de pouso e decolagem. Como resultado, a asa pode ser mais estreita, o que melhora a eficiência em velocidades de cruzeiro, reduzindo a resistência.

O projeto final de um avião com propulsão distribuída pode ter motores na frente da asa somente para pouso e decolagem e um único motor em cada ponta, que seriam usados em cruzeiros.

O LeapTech usa baterias para alimentar os motores, mas Laskaridis e um colega da Cranfield, Devaiah Nalianda, estão estudando a viabilidade dos sistemas de turbina elétrica híbrida que pode usar baterias e um único motor a jato para gerar eletricidade para os motores.

Para os pesquisadores da NASA, o próximo passo é modificar uma aeronave real – um modelo italiano de quatro lugares – para que funcione com baterias e motores de asa.

Dada a limitação atual das baterias, a aeronave modificada só seria capaz de fazer voos curtos. Talvez a tecnologia das baterias nunca se torne boa o suficiente para que aviões elétricos sejam práticos, afirmou Clarke, mas um projeto híbrido, que incluiria uma bateria, é uma possibilidade realista.

“Consigo imaginar esse tipo de tecnologia sendo integrado a aeronaves em 20 anos”, disse ele.

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