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Quase nada do reino acadêmico apresentado pela empresa Axact, com sede em Karachi, é real. A Barkley University e Columbiana University são dois sítios ligados para Axact | Reprodução/
Quase nada do reino acadêmico apresentado pela empresa Axact, com sede em Karachi, é real. A Barkley University e Columbiana University são dois sítios ligados para Axact| Foto: Reprodução/

Visto da internet, é um império educacional vasto: centenas de universidades e escolas superiores com nomes elegantes e professores sorridentes, ocupando campi americanos ensolarados.

Os sofisticados sites das instituições oferecem diplomas on-line em dezenas de carreiras, como enfermagem e engenharia civil. Há endossos elogiosos no site CNN iReport, depoimentos entusiasmados em vídeo e certificados de autenticação do Departamento de Estado dos EUA com a assinatura do secretário John Kerry.

“Temos um dos corpos docentes mais renomados do mundo”, gaba-se uma mulher apresentada em vídeo como diretora de uma escola de direito. “Venha fazer parte da Newford University para ascender ao ápice da excelência.”

Mas a imagem tremula, como uma miragem. As reportagens são falsificadas. Os professores são atores. Dos campi universitários, só existem os nomes. Os diplomas não são reconhecidos. Os sites sofisticados trazem números de telefone americanos gratuitos e nomes que soam familiares, como Barkley e Columbiana.

A Barkley University e Columbiana University são dois sítios ligados para AxactReprodução

Neste reino acadêmico virtual, que abrange pelo menos 370 sites na internet, muito pouco é real —exceto, isto é, os milhões de dólares de receita que ele arrecada todos os anos de milhares de pessoas em todo o mundo, tudo pago a uma empresa paquistanesa de softwares que é cercada de sigilo.

A empresa, Axact, opera em Karachi, onde emprega mais de 2.000 pessoas e se diz a maior exportadora de softwares do Paquistão, oferecendo a seus funcionários mordomias ao estilo do Vale do Silício, como piscina e iate.

O coração do negócio é a equipe de vendas, formada por paquistaneses jovens e altamente instruídos, fluentes em inglês ou árabe, que trabalham atendendo clientes atraídos pelos sites. A empresa oferece diplomas de ensino médio por US$ 350 (R$ 1.050) e doutorados por US$ 4.000 (R$ 12 mil).

Gueixas se abrem a estrangeiros

Vestindo um quimono cinza-pérola, Reiko Tomimori, 62 anos, saúda os hóspedes com uma reverência em sua Ochaya Tomikiku, casa de chá no distrito de Gion. Ela então os leva até o segundo andar onde gueixas e aspirantes, que são chamadas de maikos, os entretêm.

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A Axact molda seus sites para suscitar o interesse de clientes em seus principais mercados, que incluem os EUA e países do golfo Pérsico. Um saudita gastou mais de US$ 400 mil (R$ 1,2 milhão) com falsos diplomas e certificados, contou um ex-funcionário.

Os valores desembolsados normalmente não são tão espantosos, mas não deixam de ser altos. No ano passado um egípcio pagou US$ 12 mil (R$ 36 mil) por um doutorado em tecnologia de engenharia da Nixon University e um certificado assinado por John Kerry.

Ele disse que sua experiência profissional era com publicidade, mas tinha certeza de que os documentos eram legítimos. “Pensei realmente que isto tinha vindo dos EUA. Tinha tantos carimbos! Era tão impressionante.”

A Axact de fato vende alguns aplicativos. Mas, de acordo com ex-funcionários, os registros da empresa e uma análise detalhada de seus sites, sua atividade principal é aplicar o golpe secular da venda de falsos diplomas acadêmicos, fazendo-o na internet e elevando-o a uma escala global.

À medida que cresce o interesse pelo ensino a distância, a empresa está posicionando agressivamente seus portais e seus sites de escolas para fazer com que apareçam com destaque em buscas, atraindo fregueses internacionais.

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Ex-funcionários da firma dizem que, em sua sede, os agentes de vendas telefônicas trabalham em turnos, 24 horas por dia. Às vezes vendem diplomas a clientes cientes de que estão comprando um diploma instantâneo e suspeito.

Em muitos casos, porém, os agentes manipulam pessoas interessadas em ensino legítimo, levando-as a se matricularem para receber materiais didáticos que nunca aparecem ou garantindo a elas que sua vivência é o bastante para lhes valer um diploma.

Para reforçar os lucros, os vendedores recorrem a artifícios como fazer-se passar por funcionários governamentais americanos, para persuadir clientes a comprar certificações ou documentos de autenticação de preço alto.

A receita da empresa, estimada por ex-funcionários e por especialistas em fraude em vários milhões de dólares por mês, é reciclada através de uma rede de firmas sediadas em outros países.

Ao mesmo tempo, o papel da Axact como proprietária desse falso império educacional é oculto pelo uso de servidores proxy de internet e táticas legais combativas, somadas à crônica ausência de regulamentação no Paquistão.

“Os clientes pensam que é uma universidade, mas não é”, disse Yasir Jamshaid, funcionário de controle de qualidade que deixou a Axact em outubro. “É uma operação que só visa o dinheiro.”

Sob um supermercado, uma história sinistra

Passando as gôndolas de acessórios para o cabelo no térreo do supermercado Monoprix, na esquina da Rue Réaumur e o Boulevard de Sébastopol, no 2« arrondissement, há uma porta em que se lê: “Entrada permitida somente para funcionários”.

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Resposta

Em carta ao “New York Times”, advogados da Axact negaram terminantemente o teor da reportagem, acusando um repórter do jornal de “abordar nosso cliente com histórias sem fundamento e teorias conspiratórias”.

Mas, depois da reportagem inicial do “NYT” sobre o assunto, o governo paquistanês abriu uma investigação. Os escritórios da empresa foram fechados. Investigadores apreenderam computadores e arquivos e detiveram pessoas para interrogatório.

Em entrevista de 2013 sobre o setor da mídia no Paquistão, o fundador da Axact, Shoaib Ahmed Shaikh, descreveu a empresa como “companhia de informática e serviços de rede informatizada” que presta serviços a pequenas e médias empresas.

“Produzimos milhares de projetos diariamente. Nossa lista de clientes é longa”, disse, sem revelar os nomes dos clientes.

A proliferação de esquemas on-line que fornecem diplomas suscita receios em relação ao uso de falsos diplomas em fraudes de imigração, além dos perigos que isso pode representar para a segurança. Alguns fraudadores já foram flagrados.

Em 2007 uma corte britânica ordenou a prisão de Gene Morrison, falso criminologista policial que afirmava ter diplomas da Rochville University, pertencente à Axact. A polícia teve que rever 700 causas nas quais Morrison tinha trabalhado.

No Oriente Médio, a Axact já vendeu diplomas de aeronáutica a funcionários de companhias aéreas e diplomas médicos a funcionários hospitalares. Uma enfermeira de um hospital em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, confessou ter pago US$ 60 mil (R$ 180 mil) por um diploma emitido pela Axact, para conseguir uma promoção.

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Magnata

No Paquistão, Shaiqh se descreve como magnata que subiu na vida sem ajuda externa. Ele afirma doar 65% da receita da empresa a causas beneficentes. No site da empresa, ele disse que quer se tornar “o homem mais rico do planeta, mais rico até que Bill Gates”.

Shaiqh está trabalhando para tentar converter-se no mais influente magnata da mídia do Paquistão. A Axact está construindo um estúdio de TV e recrutando jornalistas para trabalhar no Bol, grupo de mídia que deve entrar em operação em 2016.

Quando jornalistas do “New York Times” contataram 12 sites operados pela Axact, representantes dos sites afirmaram estar sediados nos EUA, negaram qualquer vínculo com a Axact ou desligaram imediatamente.

Dois dias depois que o “New York Times” publicou sua primeira reportagem sobre o tema, as ligações feitas para alguns dos sites não estavam sendo atendidas.

“Esta operação é de longe a maior que já vimos”, comentou Allen Ezell, agente aposentado do FBI que investiga a Axact. “É um golpe avassalador.”

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