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Trabalho de Henner inclui fotografias de fazendas de gado, como “Coronado Feeders, Dalhart, Texas” e “Centerfire Feedyard, Ulysses, Kansas”. | Haslam,Andy/for The New York Times
Trabalho de Henner inclui fotografias de fazendas de gado, como “Coronado Feeders, Dalhart, Texas” e “Centerfire Feedyard, Ulysses, Kansas”.| Foto: Haslam,Andy/for The New York Times

“Há um absurdo em viver numa época em que tudo é fotografado”, disse o artista de origem belga Mishka Henner, enfatizando que cada pedaço de chão parece já ter sido registrado e que tudo isso está acessível on-line —incluindo alguns dos lugares mais secretos do mundo.

Henner abraça esse absurdo para criar suas próprias imagens. Ele é parte de um crescente contingente de artistas que vem fazendo uso da capacidade de vigilância dos satélites de imagem e do Google Street View em trabalhos que refletem a forma como a era da internet alterou a nossa experiência visual.

Ele se dispõe a enxergar à distância as múltiplas atividades humanas no planeta —seja em pastos ou em instalações militares americanas. Vistos em fotografias que cobrem paredes inteiras, esses terrenos se tornam registros do impacto humano na paisagem global.

Henner salienta a forma como os espectadores estão cada vez mais condicionados a enxergar um mundo mediado por câmeras de vigilância. “Meu trabalho não trata apenas da vigilância”, disse Henner, 39. “Trata também de estética, do surrealismo.”

É o caso de uma série que será incluída em “Semi-Automatic” —primeira exposição individual de Henner, em cartaz até 24 de outubro na Galeria Bruce Silverstein, em Nova York,— que cataloga instalações militares americanas no mundo todo.

Henner ficou impressionado com a perversidade decorrente de expor bases ditas “protegidas”. Como prova de sua acessibilidade, ele incluiu a localização de cada instalação, com sua respectiva cidade e país.

As imagens e livros de Henner são desenvolvidos com meticuloso cuidado estético, exemplificando um desafio que museus, galerias e casas de leilões enfrentam: como categorizar a produção artística surgida na internet? Para Quentin Bajac, curador-chefe de fotografia no Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York, a obra de Henner está “na encruzilhada de muitos gêneros e práticas diferentes” e, sendo assim, é “parte de uma estratégia de neoapropriação que você encontra atualmente na fotografia”.

Mishka Henner/Galeria Bruce Silverstein

Usando a tela do computador como ateliê, Henner abre o Google Earth, marca um local no mapa e posiciona a altura de acordo com a área que deseja incluir na imagem. Ele faz centenas de capturas de tela e as junta cuidadosamente para compor a imagem final. As fotos parecem desenhos sobre um mapa, com detalhes meticulosos que aproveitam a precisão cartográfica.

“De início foi um gesto zombeteiro”, disse Henner sobre a série “51 Postos Militares Avançados dos EUA”, explicando que se inspirou nas séries “26 Postos de Gasolina” (1963) e “34 Estacionamentos” (1967), de Ed Ruscha, que cataloga a banalidade suburbana fingindo seriedade. A documentação das bases militares, no entanto, se tornou aos poucos para ele uma tipologia da hegemonia global dos EUA.

Henner começou a usar imagens de satélite em 2010, quando ele e sua companheira, Liz Lock, documentavam as prostitutas de Manchester (Reino Unido). Ao pesquisar na internet, o artista descobriu que algumas dessas mulheres apareciam nas imagens do Street View, o que o levou a produzir a série “No Man’s Land”.

Com um olho no Espaço, disse Henner, ele pôde enxergar coisas que nunca encontraria com uma câmera no solo.

Mishka Henner
Galeria Bruce Silverstein

“Semi-Automatic” inclui imagens de “No Man’s Land” e “Feedlots” (“pastagens”), imagens de fazendas de pecuária, incluindo uma que mostra um claro padrão de linhas quadriculadas (estábulos) e pontos (vacas) interrompido por uma massa oval e vermelha. Essa irrupção impressionista é um lago composto por esterco, contendo nitratos e antibióticos.

“Astronomical” (“astronômico”), talvez o trabalho mais ambicioso de Henner, é uma reprodução em escala do Sistema Solar, com 12 volumes e 6.000 páginas, a ser incluído no MoMA.

Uma imagem de cada um dos nove planetas (ele inclui Plutão) aparece em sua própria página como um pontinho na vastidão do espaço. A Terra só aparece na página 155 do primeiro volume; Júpiter, na página 283 no volume 2. O espaço entre os planetas é ocupado principalmente por páginas negras, cada uma representando uma parte da distância entre o Sol e Plutão.

Artistas como Henner, que aproveitam cada vez mais o olhar da câmera do Google Street View, chamam nossa atenção para as questões relativas a privacidade e vigilância.

Katrina Sluis, curadora de arte digital da Photographers’ Gallery, de Londres, se refere a eles como “arqueólogos da web”, navegando em “uma cultura cada vez mais informatizada” atrás de elementos da experiência humana.

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