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Crianças da Eritreia são alvos frequentes de traficantes de pessoas. Imigrantes em um centro de detenção em Trípoli, na Líbia. | Tyler Hicks/The New York Times
Crianças da Eritreia são alvos frequentes de traficantes de pessoas. Imigrantes em um centro de detenção em Trípoli, na Líbia.| Foto: Tyler Hicks/The New York Times

A proposta era tentadora demais para as crianças. Traficantes de pessoas ofereceram aos meninos e meninas transporte para deixarem os acampamentos de refugiados na fronteira da Eritreia, atravessar desertos e o mar Mediterrâneo para ter vida nova na Europa.

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Ali, os traficantes lhes disseram, as crianças poderiam conseguir asilo em pouco tempo e então chamar seus pais. O pagamento poderia ser feito mais tarde.

Mas quando as crianças chegaram à Líbia, a oferta virou um ultimato. As crianças, algumas com apenas oito anos, telefonaram a seus pais para transmitir a exigência dos traficantes: US$ 3.200 (R$ 9.600). Se não mandassem o dinheiro, seus filhos seriam abandonados no meio do caos da Líbia.

Zacharias Hilo tem 19 anos e é o mais velho de 40 garotos eritreus em cativeiro. Ele contou que seu pai exclamou que não tinha dinheiro para pagar. “Então estou morto!”, Zackarias respondeu. “Meu pai então foi à cidade velha vender todas suas cabras. Foi a mesma coisa com todos nós.”

Máquina do tráfico

Há cerca de 80 meninos e meninas eritreus presos em dois centros de detenção aqui. Eles são as vítimas mais inocentes da máquina de tráfico humano que suga migrantes africanos para o redemoinho da Líbia e, dali, para as águas do Mediterrâneo. De cerca de 170 mil migrantes que chegaram à Itália pelo mar em 2014, vindos da Líbia, mais de 13 mil foram menores desacompanhados, e 3.394 deles eram eritreus, segundo a Organização Internacional para a Migração.

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Nas primeiras semanas da melhor época para as travessias marítimas deste ano, cerca de 30 mil migrantes já atravessaram o Mediterrâneo, incluindo cerca de 1.700 menores desacompanhados.

As famílias extorquidas pelos traficantes quase invariavelmente já são miseráveis. A renda média per capita na Eritreia é de cerca de US$ 550 (R$ 1.650) por ano, segundo as cifras mais recentes do Banco Mundial. Logo, um resgate exigido pelos traficantes pode consumir as economias de um vilarejo inteiro ou até mais.

“Os traficantes são muito criativos”, disse Meron Estefanos, ativista eritreia de direitos humanos que trabalha com imigrantes. “A partir do momento em que o traficante leva as crianças para a Líbia, os pais não têm outra opção senão mandar o dinheiro, porque não há como elas voltarem.”

Ela contou que, quando crianças conseguem chegar à Europa, “a primeira coisa que me perguntam sempre é ‘posso trazer meus pais para cá?’ ”.

As crianças desacompanhadas vêm de muitos países, segundo a Organização Internacional para a Migração. Mas o maior número delas vem da Eritreia, país governado por uma ditadura tão rígida que às vezes é comparado à Coreia do Norte. Os países ocidentais concedem asilo a quase todos os eritreus que chegam.

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Regime autoritário

Na Eritreia, todos os homens e mulheres de 18 anos são recrutados para um serviço militar brutal que frequentemente se prolonga por muitos anos e pode ser equivalente a um trabalho escravo.

Para escapar, centenas de milhares de adultos já fugiram do país, muitas vezes para campos de refugiados do outro lado da fronteira etíope. Todos os anos, centenas de crianças desacompanhadas seguem a mesma rota, caminhando até a Etiópia. Segundo funcionários humanitários, os campos abrigam mais de 1.500 crianças sem seus pais.

Efrem Fitwi e Hermon Angosom têm oito anos, estão no centro de detenção e apareceram em um artigo anterior do “New York Times” sobre imigrantes na Líbia.

“Eu vi o que aconteceu com meus irmãos; enxerguei meu futuro”, falou Efrem. “Não temos educação”, ele disse, acocorado no pátio de terra do centro de detenção e falando em tigrínia, uma língua nativa da Eritreia e Etiópia, enquanto Zackarias traduzia. “Meus irmãos não têm escola. Por isso queremos ir à Etiópia.”

A maioria das crianças que faz a longa viagem a pé se arrepende assim que chega, dizem funcionários humanitários. “Elas ficam isoladas nos campos de refugiados, sem ter para onde ir”, explicou Estefanos. É nesses campos que os traficantes de pessoas vão buscar passageiros. Garotos eritreus no centro de detenção líbia disseram que o traficante deles foi Ermias Ghermay, etíope procurado pela Itália pela morte de 366 migrantes em naufrágios ao largo da ilha de Lampedusa em 2013.

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Os homens de Ghermay levaram as crianças até o Sudão, de onde elas contaram que telefonaram as famílias. Hermon ligou para sua irmã mais velha, Haben, 22.

Ela percorreu uma rota semelhante recentemente, atravessando o Mediterrâneo e chegando à Noruega. Ela implorou a Hermon que voltasse ou ficasse no Sudão.

Hermon contou que teve medo de ficar sozinho e não sabia como voltar. Os traficantes o mantiveram preso até sua irmã conseguir mandar dinheiro suficiente para a travessia do Mediterrâneo. Ele foi capturado quase imediatamente.

Inicialmente, Hermon se manteve estoico. Então um jornalista visitante contou que tinha conseguido contatar o pai de Hermon, na Eritreia, que ficou emocionado ao ter notícias de seu filho.

Ouvindo isso, Hermon cobriu o rosto e chorou. Em ligação a Estefanos, ele perguntou: “Minha irmã está fazendo algo para me ajudar?” Estefanos respondeu: “Preocupe-se em cuidar de você mesmo”.

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