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 | Ilustração: Robson Vilalba
| Foto: Ilustração: Robson Vilalba

Enojadas

Grávidas são mais sensíveis

Pesquisadores têm tentado reconhecer os detalhes sobre os mecanismos e valor evolucionários do nojo. Daniel Fessler, antropólogo do Centro para Comportamento, Evolução e Cultura (BEC, na sigla em inglês) da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, investigou com seus colegas o porquê de mulheres grávidas serem mais sensíveis ao nojo.

O que eles descobriram foi que, no que subiam os níveis de progesterona, aumentava também a sensibilidade ao nojo. Isso foi válido para o primeiro trimestre de gravidez, quando qualquer perturbação no desenvolvimento fetal pode ter as mais severas consequências. Num trabalho muito recente, segundo Fessler, os pesquisadores descobriram que, mesmo mulheres que não estavam grávidas e não sofriam de náuseas, o nojo aumentava junto aos níveis de progesterona.

Uma função importante da progesterona, segundo Fessler, é que ela debilita uma parte de alerta do sistema imunológico, a inflamação, que pode evitar com que o embrião se implante na placenta. O embrião de oito células "na verdade destrói os tecidos enquanto se instala", se­­gundo Fessler. "Deixado à própria vontade, o sistema imunológico materno destruiria o embrião."

As­­sim, pelo que ele e seus colegas raciocinaram, enquanto o corpo diminui um tipo de proteção, ele au­­menta o nojo, outro tipo de de­­fesa.

Quaisquer que sejam os detalhes do nojo, seu poder de afetar o comportamento é inquestionável, e esse poder deve ser posto para bom uso, segundo a "nojóloga" Valerie Curtis. Então, em um de seus projetos, ela trabalhou com uma agência indiana de relações públicas para criar uma campanha com base no nojo para encorajar a lavagem das mãos entre mães de pequenas vilas, que poderia salvar incontáveis vidas de crianças, que se perdem por conta da diarreia e outras doenças.

O resultado, agora em teste, é uma cena envolvendo dois personagens, uma supermãe e um homem sujo e nojento. O homem faz doces usando lama e vermes, interrompe sua performance no meio para correr porque tem diarreia, nunca lava as mãos e faz tudo o possível para ser repugnante. A supermãe é escrupulosamente limpa. A cena deixa claro que seus filhos não ficam doentes. Na verdade, seu bebê se torna um médico depois de crescer. Ela lava as mãos o tempo todo.

A proeminência da diarreia nessa campanha não é por acaso. Uma das coisas sobre se estudar o nojo, segundo Curtis, é que ele lhe faz perceber o quanto é importante falar sobre as coisas que nos causam nojo, porque elas com frequência apresentam perigos à saúde pública.

A prova número um é o excremento. "Precisamos falar sobre o excremento", disse ela, usando uma palavra muito mais forte de duas sílabas, para efeito máximo – uma palavra que ela usa sem pedir licença, conforme beneficia uma nojóloga. "O que é pior?" perguntou Curtis. Falar sobre isso, "ou deixar as crianças morrerem?"

O nojo é a Cinderela das emoções. Enquanto o medo, a tristeza e a raiva, suas irmãs desagradáveis e espalhafatosas, têm prendido a atenção dos psicólogos, o po­­bre nojo tem sido escondido no canto, deixado para chafurdar nas cinzas.

Isso mudou agora. O nojo está tendo seu momento sob os holofotes, enquanto os pesquisadores descobrem que ele faz mais do que causar a sensação de enjoo no estômago. Ele protege os seres humanos de doenças e parasitas e afeta quase todos os aspectos das relações humanas, do romance à política.

Em vários novos livros e num fluxo constante de trabalhos de pesquisa, cientistas estão explorando a evolução do nojo e seu pa­­pel em atitudes em relação à co­­mi­­da, sexualidade e outras pessoas.

Paul Rozin, psicólogo, professor emérito da Universidade da Pen­­silvânia e pioneiro da pesquisa moderna sobre o nojo, começou a trabalhar com alguns poucos colaboradores nos anos 90, quando o nojo estava longe de ser um assuntos principal.

"Era sempre a outra emoção", ele disse. "Agora está na pauta."

Ele ainda não vai usar sapatinhos de cristal, o que não faz mal, considerando o tipo de coisa em que ele tem que andar. De qualquer modo, seu alcance leva o no­­jo além dos reinos da podridão e do excremento.

Falando semana passada nu­­ma conferência sobre o nojo na Alemanha, Valerie Curtis, uma profissional que se autodescreve como uma "nojóloga" da Escola Londrina de Higiene e Medicina Tropical (LSHTM, na sigla em in­­glês), descreveu sua emoção favorita como sendo "incrivelmente importante".

Ela continuou: "Ele está em nossa vida cotidiana. Determina nossos comportamentos de higiene. Determina o quanto queremos nos aproximar dos outros. Determina quem iremos beijar, com quem iremos procriar, perto de quem iremos sentar. Deter­­mina as pessoas que nós excluímos, e isso é algo que fazemos bastante".

Ele começa cedo, segundo ela: "Crianças no playground acusam outras crianças de terem piolhos. E funciona, e as pessoas sentem vergonha quando o nojo é virado contra elas".

Alguns estudos sugeriram que os conservadores políticos são mais suscetíveis ao nojo do que os liberais. E é claro que o que as pessoas acham nojento elas também acham imoral.

O que também aumenta a po­­pularidade do nojo como objeto de estudo básico é o fato de ele ser mais fácil de provocar de uma maneira ética do que medo ou raiva. Você não precisa insultar al­­guém ou fazer com que ele tema pela sua vida – basta um cheiro ruim. E o nojo tem sido relativamente fácil de localizar no cérebro, onde frequenta o córtex insular, as amídalas cerebelosas e outras regiões.

"Ele está se tornando uma emoção modelo", disse Jonathan Haidt da Universidade da Virgínia, um pioneiro do nojo com Rozin.

E a pesquisa pode ter benefícios práticos, inclusive pistas para compreender o transtorno obsessivo-compulsivo, alguns aspectos do qual – como a excessiva lavagem das mãos – parecem uma versão desenfreada do nojo.

Tradução de Adriano Scandolara.

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