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Secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo | Andrew HarrerBloomberg
Secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo| Foto: Andrew HarrerBloomberg

A nova e agressiva estratégia do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em relação ao Irã depende da ajuda de parceiros dos EUA - os mesmos aliados que ele desprezou ao se retirar do acordo nuclear de 2015 com Teerã.

Em um discurso proferido segunda-feira (21), o secretário de Estado, Mike Pompeo, detalhou a estratégia dos EUA em relação ao Irã. Sua lista de 12 pontos exigia que o Irã aceitasse a presença dos EUA virtualmente em seu território. 

Esta é a diplomacia estilo Trump - uma promessa de "esmagar" agentes iranianos e impor as "piores sanções da história" a menos que a República Islâmica abandone todo o desenvolvimento nuclear. Qualquer empresa que faça negócios com o Irã será penalizada com sanções que os EUA planejam implementar dentro de alguns meses. 

Mas Trump e Pompeo têm um problema difícil de resolver: depois de quebrar alianças e desconsiderar a diplomacia em favor de uma ação rápida, a Casa Branca não poderá colocar totalmente em prática esse regime de sanções ou restringir o papel regional do Irã sem a participação das outras cinco nações que assinaram o acordo em 2015. E há poucos sinais de que eles querem seguir os Estados Unidos. 

"É muito difícil ter um regime internacional de sanções que não inclua mais ninguém", disse Suzanne DiMaggio, diretora do Iran Iniciative na Fundação New America. "É chocante como eles avançariam com um anúncio de política que realmente ninguém concorda".

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O governo prevê uma campanha de "pressão máxima" semelhante à que estrangulou a economia da Coreia do Norte, mas num ambiente em que há muito menos unidade. Além disso, o discurso de Pompeo não mencionou a Rússia ou a China, dois parceiros no acordo nuclear original que poderiam ajudar o Irã a enfrentar sanções mais duras. Juntamente com os EUA, outros envolvidos no acordo incluíam a França, o Reino Unido e a Alemanha. 

"O desafio é converter essa pressão em resultados políticos, e isso exige diplomacia", disse Michael Singh, diretor do Instituto Washington e ex-diretor sênior para Assuntos do Oriente Médio do governo George W. Bush. "Nós nunca tentamos impor este tipo de regime de sanções em meio a uma divergência estratégica realmente nítida com nossos aliados mais próximos". 

Pompeo foi desafiador em seu discurso, citando osg comportamentos iranianos que atormentaram os líderes americanos por décadas. Ele insistiu que o Irã dê aos inspetores nucleares acesso irrestrito ao país e pare de financiar os rebeldes no Iêmen. Exigiu também que o país deve cessar qualquer enriquecimento de urânio e retirar suas forças da Síria e que o financiamento do Hezbollah e do Hamas deve terminar. 

"Não é um sonho inalcançável pedir à liderança iraniana que se comporte como um país normal e responsável", escreveu Pompeo no Twitter horas após seu discurso. "Nossos pedidos são simples".

O que diz a União Europeia  

Bem antes de Pompeo falar, os líderes europeus sugeriram que a abordagem dos EUA não funcionaria. A União Europeia estuda formas de proteger suas empresas das sanções e manter intacto o acordo de 2015, conhecido como Plano de Ação Integral Conjunto, sem os EUA. A chefe de relações exteriores da UE, Federica Mogherini, disse segunda-feira que "não há alternativa" ao acordo. 

Mesmo o Reino Unido estava disposto a romper abertamente com os EUA. Pompeo se recusou a comprometer-se com um cronograma para a nova diplomacia americana, e o ministro das Relações Exteriores britânico, Boris Johnson, sugeriu que isso não aconteceria tão cedo. 

"Se você tentar rearranjar uma nova e enorme negociação com o Irã, um novo tratado - isso é o que parece estar previsto - eu não vejo isso como sendo algo muito fácil de alcançar, em um período razoável", disse Johnson antes do discurso de Pompeo. Ele disse ainda que a perspectiva de um novo acordo "será muito, muito difícil".

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A Alemanha também expressou sua determinação em manter o acordo em face da retirada dos EUA.

"É claro que gostaríamos que um parceiro importante e forte como os EUA tivesse permanecido no acordo de Viena", disse Peter Beyer, coordenador das relações transatlânticas do governo da chanceler alemã Angela Merkel, em uma entrevista na ZDF na terça-feira (22). "Os europeus estão no caminho certo e vale a pena cada gota de suor para manter o acordo".

O que diz o Irã

Não surpreendentemente, o Irã também rejeitou as exigências de Pompeo. O presidente Hassan Rouhani disse que as ideias do secretário de Estado norte-americano "não são aceitáveis de maneira alguma". Um membro do comitê de segurança nacional do parlamento iraniano sugeriu que a melhor abordagem seria esperar que a política dos EUA mudasse assim que Trump deixasse o cargo. 

"A essência do radicalismo passa rapidamente", disse Heshmatollah Falahatpisheh à Agência de Notícias de Estudantes Iranianos. Ele disse que o Irã deveria simplesmente "deixar que esta era de extremismo termine".

Relação com as negociações da Coreia do Norte

O discurso de Pompeo foi um novo exemplo da estratégia ofensiva do governo Trump, que também está sendo aplicada em relação ao programa nuclear da Coreia do Norte. O governo americano diz que não aceitará uma estratégia de concessões sincronizadas à Coreia do Norte, dando gradualmente demandas para que o país de Kim Jong-un abandone seu programa nuclear. Em vez disso, Trump quer que a Coreia do Norte desista de tudo primeiro. 

Pompeo fez contato direto com a Coreia do Norte, dizendo que a disposição de Trump em se encontrar com Kim é exemplo da dedicação do governo à diplomacia. "Essa disposição foi acompanhada por uma dolorosa campanha de pressão que reflete nosso compromisso de resolver esse desafio para sempre", disse ele. 

Mas diferenças entre os dois acordos são significativas. As sanções da Coreia eram possíveis em parte por causa das contínuas provocações de Pyongyang - principalmente o teste de bombas nucleares - que desafiaram anos de resoluções do Conselho de Segurança da ONU. E a Coreia do Norte já estava muito mais isolada da economia global do que o Irã é agora. 

Os EUA foram capazes de estimular os países - mais notadamente a China - a cortar a atividade econômica com Pyongyang, contribuindo para a nova disposição da Coreia do Norte em considerar concessões. Mesmo assim, analistas argumentam que o tom mais gentil de Kim foi resultado de considerações internas e não totalmente dependente da ação dos EUA.

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Para o Irã, o governo norte-americano está apostando em ser capaz de reconstituir um regime de sanções complexas que não lhe dará escolha senão ceder. Há menos apetite por isso entre os europeus, e menos ainda entre outros países dispostos a comprar petróleo iraniano, como a China e a Índia. 

Tanto dentro quanto fora do Irã, a sensação persistente era de que Pompeo havia soletrado uma série de exigências tão onerosas que o único objetivo poderia ser alcançado derrubando o atual regime, uma vez que é muito improvável que o país concordasse com qualquer um desses requisitos. 

Pompeo alimentou essas suspeitas apelando ao povo iraniano durante todo o discurso. Depois disso, ele foi perguntado sobre como os EUA avançariam nessa nova estratégia. Ele respondeu que o povo do Irã deve ser o único a decidir e "fazer uma escolha sobre sua liderança". 

"Pessoas como Pompeo e Bolton não estão interessadas em nenhum tipo de acordo político com o governo iraniano", disse Foad Izadi, especialista em política externa da Universidade de Teerã. "Eles estão interessados em mudanças de regime. É por isso que a lista sobre a qual Pompeo falou é uma lista extremista. É uma lista construída para que o Irã a rejeite".

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