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Em suas primeiras palavras após a votação, Matteo Salvini, líder do partido de extrema-direita Liga, disse que se opunha a formar uma coalizão com o 5 Estrelas | PIERO CRUCIATTIAFP
Em suas primeiras palavras após a votação, Matteo Salvini, líder do partido de extrema-direita Liga, disse que se opunha a formar uma coalizão com o 5 Estrelas| Foto: PIERO CRUCIATTIAFP

Existem duas maneiras de observar os resultados das eleições gerais italianas de domingo (4)

Uma delas é simplesmente se concentrar na aritmética. Nessa perspectiva, o resultado não é realmente diferente do que se esperava. Não houve um vencedor definitivo: nem a coligação de centro-direita, nem a centro-esquerda, nem o Movimento 5 Estrelas antissistema conseguiram ganhar a maioria das cadeiras. A votação criou um Parlamento capengo, fazendo com que seja muito mais difícil formar um governo - muito menos um que seja estável. 

Isso significa que um período de instabilidade está por vir - embora se possa dizer que isso é o normal para a Itália. Entretanto, a aritmética simples realmente não conta a história do resultado dramático deste domingo. É possível considerar que este foi um triunfo antissistema da mesma magnitude do que o referendo do Brexit ou da vitória de Donald Trump nas eleições americanas. Duas forças populistas estão em curso juntas para garantir cerca de metade dos votos. O 5 Estrelas parece ser, de longe, o maior partido na Itália, com bem mais de 30% dos votos. Dentro do bloco de centro-direita, a Liga é o partido dominante, que tem resultados melhores do que o Força Itália de Silvio Berlusconi. 

O Movimento 5 Estrelas e a Liga são diferentes, mas têm muitos traços em comum. Ambos criticam o euro, embora o 5 Estrelas tenha atenuado o tom de sua retórica recentemente. São céticos quanto às soluções do governo italiano para a imigração, que têm sido basicamente o resgate de refugiados provenientes do mar Mediterrâneo. E, o que é mais preocupantemente, eles têm se mostrado receptivos a alegações de que as vacinas são perigosas - sintoma de um ceticismo mais amplo em relação à ciência e aos "especialistas".

Possíveis alianças

O que se fala em Roma é que as duas partes poderiam se aliar e formar uma aliança “eurocética”. Esta parceria provavelmente seria capaz de formar um governo, embora politicamente, isso seria difícil de sustentar. A Liga está formalmente em uma coalizão de governo com a centro-direita e agora está tomando as rédeas da situação: como o maior partido, pode escolher o seu próprio candidato a primeiro ministro. A base do 5 Estrelas é constituída por muitos esquerdistas, que seriam contra uma aliança com a Liga. Em suas primeiras palavras após a votação, Matteo Salvini, líder da Liga, disse que se opunha a formar uma coalizão com o 5 Estrelas. 

Mas, de certa forma, tudo isso é irrelevante. O ponto central é que a maioria dos eleitores escolheu dar as costas ao caminho que a Itália tomou desde o auge da crise da dívida pública europeia. O governo tecnocrático liderado por Mario Monti e as três administrações formadas em torno do Partido Democrata compartilharam uma característica: todos procuraram modernizar a economia da Itália - aumentando a idade da aposentadoria, aprovando reformas no mercado de trabalho. Eles também foram amplamente submissos às regras da zona do euro. Quando tiveram que buscar alternativas - tanto para assuntos bancários como fiscais - eles o fizeram de acordo com as instituições europeias. 

O Movimento 5 Estrelas e a Liga não querem nada disso. Seus programas incluem benefícios generosos, como renda básica universal (5 Estrelas), imposto único (Liga), redução da idade da aposentadoria (ambos); nenhum dos quais a Itália pode pagar sem cortes de gastos profundos. Em suma, eles querem romper com as regras fiscais europeias, alegando que a Itália precisa de um estímulo imediato. Alguns - particularmente dentro da Liga - estão prontos para abandonar o euro para ganhar o direito de gastar mais.

Problema para a UE

Isso representa um grande dilema para o resto da Zona do Euro - ironicamente, quando estava se abrindo uma janela de oportunidade para reformar a moeda do bloco. O presidente francês, Emmanuel Macron, estava à espera de uma nova administração em Berlim (aprovada no domingo) para testar suas ideias sobre uma maior partilha de riscos entre os países membros da zona do euro em troca de uma gestão mais rigorosa das finanças públicas. O sentimento popular demonstrado por meio das eleições na Itália é um desafio para esse compromisso.

Alemanha e França podem reagir de duas maneiras. Eles podem pausar o processo de uma integração maior - uma vez que é improvável que seja recebido com entusiasmo ao sul dos Alpes - ou podem tratar a Itália como uma criança problemática, seguir adiante com a solução preferida e depois pedir a quem estiver em Roma para assinar o que quer que tenha sido acordado. Uma coisa é clara: a Itália desempenhará papel menor na concepção das novas regras. 

Para os partidos antissistema que se regozijam hoje, este será um teste real. Até agora, eles venderam ao eleitorado um futuro construído com dinheiro fácil. No entanto, a realidade é muito mais difícil. Eles podem não gostar de regras europeias, mas por enquanto têm que trabalhar de acordo com elas. Quanto a deixar o euro, é muito mais fácil dizer do que fazer. O risco é que eles acabem como o Alexis Tsipras da Grécia: virando as costas às promessas que fizeram porque fazer o contrário seria desastroso. 

Existe um período de grande incerteza, tanto para a Itália quanto para a União Europeia. Os eleitores italianos falaram: o que eles disseram está confuso; nem de perto a mensagem que os parceiros da Itália na zona do euro queriam ouvir.

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