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Em 1991, depois de uma visita ao município de Piraquara, constatei que, ao mesmo tempo em que os moradores eram imensamente ricos por contar com mananciais límpidos, que abasteciam a Grande Curitiba, ainda eram carentes em diversos aspectos sociais. Então, propus que um imposto, dentre tantos pagos pelo contribuinte, fosse revertido em prol de localidades que preservam o meio ambiente. Assim foi criada a lei do ICMS Ecológico (Lei Complementar 59, de 1.º de outubro de 1991).

Há 25 anos aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado do Paraná, a lei garante desde então o repasse de recursos financeiros aos municípios que abrigam em seus territórios Unidades de Conservação ou ainda mananciais para abastecimento de municípios vizinhos. É uma espécie de premiação para localidades que mantêm áreas verdes em seus territórios. Recebem o ICMS Ecológico os municípios credenciados que se adequam ao conjunto de critérios ambientais estabelecidos pelo estado, os quais estão inseridos e mantêm em seu território áreas de preservação criadas segundo lei federal, estadual ou municipal. A ideia é remunerar as localidades que preservam o meio ambiente, compensando financeiramente a conservação e a manutenção de biomas. A verba recebida pode ser usada em diversas áreas que necessitem de investimento como educação, saúde, urbanismo e até mesmo meio ambiente.

A lei também fomentou a criação de novas áreas de proteção ambiental

É preciso destacar que nenhum imposto foi criado para a arrecadação da verba a ser repassada. O dinheiro distribuído aos municípios participantes é oriundo do ICMS já existente. Para entender como é feito esse repasse, primeiro é preciso saber que o ICMS é o imposto que todo cidadão paga sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte e de comunicação. Do total arrecadado desse tributo, 75% é destinado ao estado e 25% para os municípios, que recebem essa verba proporcionalmente, de acordo com critérios como a importância populacional, industrial e territorial. Com a criação do ICMS Ecológico, destinou-se 5% desse montante (de 25%) para ser distribuído a localidades eminentemente ecológicas: 2,5% para municípios que tenham em seu território mananciais de abastecimento; e 2,5% para municípios que tenham integrado em seu território Unidades de Conservação.

Nesses 25 anos, além de o repasse incentivar os municípios a manter suas áreas de conservação da biodiversidade protegidas, a lei também fomentou a criação de novas áreas de proteção ambiental, uma vez que os municípios viram quanto poderia ser financeiramente vantajoso – e ambientalmente correto – preservar a natureza. Essa verba, recebida pelos municípios, reflete diretamente na melhoria na qualidade de vida da coletividade, uma vez que é usada para diversas áreas. É importante frisar que esse incremento nas receitas vem apenas de repasse, e não de dinheiro tirado dos cofres públicos, e que os municípios têm autonomia para decidir o destino da verba recebida.

Centenas de municípios paranaenses tiveram suas realidades transformadas depois do ICMS Ecológico. São Jorge do Patrocínio, cidade situada no noroeste paranaense, por exemplo, por contar em seu território com o Parque Nacional de Ilha Grande, passou a receber uma verba até então inexistente. Hoje 30% da receita do município vem do ICMS Ecológico, aplicado em melhorias constantes como modernização e informatização das escolas, construção de um hospital equipado e de um laboratório. Guaraqueçaba, no Litoral do Paraná, os municípios do Vale da Ribeira e centenas de outras localidades pobres também aplicaram as receitas do ICMS Ecológico em prol dos cidadãos. Piraquara, por exemplo, local onde surgiu a ideia para a criação da lei, recebe R$ 2 milhões por mês referente ao ICMS Ecológico. O que seria do município sem essa verba?

No Paraná, nesses 25 anos, os números do impacto da lei impressionam: desde sua criação, segundo o Instituto Ambiental do Paraná (IAP), houve um aumento de 160% das áreas verdes – um acréscimo de 52 para 242 municípios beneficiados. Mais de R$ 8 bilhões já foram destinados aos municípios que preservam áreas ambientais; e houve a criação de 570 novas áreas de conservação no estado.

Tamanha foi a comprovação de que essa receita pode transformar a realidade das regiões que a lei do ICMS Ecológico se difundiu pelo país. Hoje, 17 estados brasileiros já adotam o mecanismo. Depois do estado do Paraná, também adotaram o ICMS Ecológico com diferentes critérios São Paulo (1993), Minas Gerais (1995), Amapá (1996), Rondônia (1996), Rio Grande do Sul (1997), Mato Grosso (2000), Mato Grosso do Sul (2000), Pernambuco (2000), Tocantins (2002), Acre (2004), Rio de Janeiro (2007), Ceará (2008), Piauí (2008), Goiás (2011), Paraíba (2011) e Pará (2012). Cada região tem sua própria legislação para beneficiar os municípios com o recebimento da verba, e inclui itens como a gestão de resíduos sólidos, o tratamento de esgoto e outras determinações. Para cerca de 500 municípios carentes brasileiros, o repasse é o único meio de sustento. Mais um dado que atesta a repercussão do regulamento: 2 mil pessoas no Brasil já defenderam teses de doutorado sobre o tema, que já foi premiado nacional e internacionalmente.

Vale destacar que todo ano é feito um controle dos índices ambientais dos municípios participantes. A revisão, feita sempre pela Secretaria do Meio Ambiente, consta na lei e serve para que os cuidados ambientais sejam mantidos. Assim, quem preserva mais recebe mais verba; quem diminui a qualidade dos cuidados passa a receber menos de um ano para outro.

O legado da Lei do ICMS Ecológico é, sem dúvidas, valioso! Mas ainda falta um amplo debate sobre o tema. Grande parcela da população desconhece a lei e como ela pode transformar o local onde mora. A população precisa saber mais sobre o assunto para poder contribuir e exigir o uso da verba em áreas necessitadas. Os governantes devem ser mais transparentes e o cidadão precisa entender, de forma clara e compreensível, sobre o assunto. Governantes e população unidos precisam conscientizar-se sobre o ICMS Ecológico, melhorando, assim, a qualidade de vida das pessoas. Afinal, segundo o artigo 255 da Constituição, “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Neivo Beraldin, ex-vereador de Curitiba e ex-deputado estadual, é autor da Lei do ICMS Ecológico.
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