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Felipe Lima

A crise institucional está tocando fundo na Venezuela. O chavismo acabou com o país. A prova mais forte dessa trágica situação é a fuga em massa dos cidadãos venezuelanos para o Brasil e a Colômbia. Já são mais de 30 mil os que cruzaram a fronteira com o nosso país, no longínquo estado de Roraima. E a onda humana continuará a aumentar, o que obrigará o governo brasileiro a tomar medidas extraordinárias. Algo semelhante ocorre na Colômbia, onde têm procurado refúgio centenas de venezuelanos que fogem porque não têm mais o que comer no seu país de origem.

As desgraças que os nossos vizinhos venezuelanos sofrem já eram previstas. Ao longo dos últimos 15 anos, a “Revolução Bolivariana” do coronel Chávez e do seu sucessor, o inepto Maduro, passou a gerir ideologicamente o país, algo que no Brasil conhecemos de perto ao longo do ciclo lulopetralha. Ambos os casos são episódios da “onda vermelha” que percorreu o continente latino-americano após a criação do Foro de São Paulo por Lula e Fidel Castro, nos anos 90 do século passado. Nessa organização refugiaram-se as “viúvas da Praça Vermelha” após o desmanche do império soviético, em 1989. Os regimes surgidos desse pacto do atraso levaram justamente para o buraco os países que acreditaram na falsa saída: Argentina, Bolívia, Equador, Brasil e Venezuela, para não falar de países menores da América Central e do próprio México, que também sofreram os abalos da proposta de revivescência do comunismo. Os nossos vizinhos colombianos viram-se às voltas com as tentativas totalitárias das Farc para fazer desse país a sede de mais um governo da esquerda troglodita.

As desgraças que os nossos vizinhos venezuelanos sofrem já eram previstas

A “onda vermelha”, felizmente, está chegando ao seu fim. Mas o caso mais dramático é o desmanche da Venezuela, que está afetando diretamente a vida de milhões de habitantes desse país. O maluco coronel Chávez, que considerava ser a reencarnação do libertador Simón Bolívar, simplesmente deitou por terra as instituições republicanas do seu país ao transformar o Estado venezuelano numa espécie de extensão da sua própria casa, à maneira como o ditador Juan Vicente Gómez privatizou as instituições venezuelanas num regime familístico que se estendeu de 1908 até 1938 e inspirou o Nobel colombiano Gabriel García Márquez em sua obra-prima sobre os ditadores latino-americanos, O outono do patriarca.

O chavismo tentou privatizar o Estado e transformá-lo em empreendimento familiar do déspota e do seu séquito. Essa lenta transformação teve três variáveis: econômica, política e cultural. No terreno econômico, o coronel simplesmente destruiu a empresa privada venezuelana, passando a estatizar, primeiro, as maiores produtoras de alimentos. Desde a sua chegada ao poder até a morte do ditador, foram estatizadas 1,3 mil grandes empresas do setor agropecuário. Moral da história: o país passou a importar alimentos. Quando os preços do petróleo descambaram no mercado internacional, a crise alimentar se instalou e começou a faltar comida nos supermercados. Hoje os venezuelanos fogem do país para não morrerem de fome.

No terreno político, a “Revolução Bolivariana” de Chávez centralizou todos os poderes no Executivo hipertrofiado. As leis passaram a ser ditadas pelo presidente. O Legislativo e o Judiciário converteram-se em cópias do Executivo, numa dinâmica rompida apenas recentemente com a vitória parlamentar da oposição. A monótona figura de Chávez e, depois, de Maduro, paramentados de vermelho e brandindo a “Constituição Bolivariana”, converteu-se em símbolo do despotismo implantado. Os opositores ao regime passaram a ser tratados como “inimigos da Nação”. Os que não foram assassinados amargam longas condenações impostas pelo Judiciário submetido à vontade do presidente de plantão.

No terreno cultural, passou a se instalar a figura do “Big Brother”, o líder vermelho. Convenhamos que as coisas pioraram após a morte de Chávez, em 2013. Ele tinha carisma e se tornou o pop star da mídia venezuelana. O mesmo não ocorre com o casmurro Maduro, que passou a agir à sombra da memória do líder falecido, que lhe falava “através de um passarinho”. Ridícula etapa do populismo chavista que, se não fosse trágica – em decorrência das centenas de vidas humanas que estão sendo sacrificadas pelo regime repressor –, não passaria de uma comédia pastelão.

Ricardo Vélez Rodríguez, doutor em Filosofia com pós-doutorado em Ciência Política pelo Instituto Raymond Aron (Paris), é docente da Faculdade Arthur Thomas, em Londrina, e professor emérito da Eceme.
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