• Carregando...
 | Vanessa Carvalho/AFP
| Foto: Vanessa Carvalho/AFP

“A empresa moderna é uma organização social.” Quem fez essa afirmação não foi um sociólogo, tampouco um economista com viés mais socialista. Não. Quem cunhou essa sentença, há mais de 50 anos, foi o principal pensador do mundo da gestão contemporânea: Peter Drucker. Como desdobramento de sua visão, o autor preconiza que o principal objetivo de uma organização não é o lucro financeiro, e sim a criação de valor à sociedade. Se esta reconhecer que o resultado da ação da organização é favorável e aceito, recompensa a empresa com o lucro financeiro. Se não ocorrer esse reconhecimento, pune com o prejuízo. Simples assim. Seguindo esse raciocínio, o lucro é a recompensa que a organização recebe por criar valor à sociedade onde está inserida. Assim, o resultado financeiro é consequência e não causa da ação empresarial.

O processo de geração de valor à sociedade assume diversos papéis, como a geração de recursos financeiros ao Estado por meio do pagamento dos impostos, a criação de empregos, a geração de oportunidades de crescimento para empresas fornecedoras e parceiras, o sentimento de pertencimento social dos trabalhadores e assim por diante. Um ambiente que oferece as condições para a prosperidade e evolução das empresas resulta em maior ganho para a comunidade, à medida que favorece o empreendedorismo como vetor de desenvolvimento social. É importante estar claro que construir um ambiente que favoreça o crescimento das empresas não é sinônimo de eliminar o risco envolvido em um novo empreendimento. Empreender envolve riscos e sempre será assim. A função do Estado deve ser o de diminuir as amarras para o crescimento das organizações por meio de sua ação institucional. Tudo que fuja disso é sinônimo de perigo e desequilíbrio nas relações entre esses agentes sociais e econômicos.

Quando o Estado atua proativamente para garantir o lucro de qualquer grupo econômico, ele está destruindo o livre mercado e, via de regra, favorecendo uns diante de outros. No período pós-guerra, foi cunhado o termo “capitalismo de compadrio” para definir os movimentos em que o sucesso do negócio depende da proximidade do empresário com o governo – ou de agentes públicos, para ser mais preciso.

Casos como o da JBS fortalecem a visão falsa de que “só é possível ganhar dinheiro no Brasil dessa forma”

Nada mais atual em nosso país que esse conceito. O que estamos testemunhando, estarrecidos, e suas consequências nefastas já havia sido estudado e descrito há mais de meio século. Teimosamente não enxergamos – ou não quisemos enxergar – a podridão por onde, inexoravelmente, essas relações descambam.

É incrível o desserviço à sociedade que esses pseudoempreendedores estão gerando. Não só no que se refere às espantosas perdas materiais ou à inconteste crise moral que abate todos os cidadãos. Ao se evidenciar a mediocridade desses bandidos disfarçados de empresários e executivos, transmite-se à sociedade que esse é o funcionamento regular de uma organização. Fortalece-se aquela visão de que “só é possível ganhar dinheiro no Brasil dessa forma”. Ledo engano. Essa é a muleta de bandidos para justificar o injustificável.

Na realidade, o país é composto, em sua esmagadora maioria, por empreendedores que prosperam sem transgredir a ética ou cometer ilicitudes. O maior empregador do Brasil não é o Estado, tampouco as grandes organizações. São as pequenas e médias empresas as principais protagonistas desse sistema. Só em abril deste ano 92% de todas as vagas criadas foram por organizações com esse perfil.

Esses empreendedores não têm um canal aberto com os crápulas do governo, não se dedicam a criar meios para bancar canalhas oferecendo propinas na forma de doações de campanha, nem perdem tempo dialogando com agentes públicos, pois não têm tempo para isso, já que estão dedicados à construção de seus projetos, estão focados na sobrevivência de seu negócio em meio ao caos que se instalou devido a esses destruidores de valor.

Opinião da Gazeta:A delação e a impunidade (editorial de 24 de maio de 2017)

Rodrigo Constantino:Capitalismo de compadres (artigo de 26 de maio de 2016)

O fato concreto é que, ao longo dos anos, as empresas assumiram um papel onipresente na sociedade. Como muito do que acontece no Brasil, não nos dedicamos a pressionar as autoridades pela construção de uma solução longeva que garanta a existência de um ambiente próspero, eliminando os obstáculos e amarras que dificultam a evolução de uma empresa. Com isso, o pau comeu solto e descobrimos, hoje, a pilhagem histórica com a qual, mobilizados pela falta de distinção do que é público e privado, larápios engomadinhos avançaram sobre nossos recursos.

É necessário prestar atenção às diferenças essenciais entre o verdadeiro empreendedorismo e o que está acontecendo agora. Esses fatos só vêm evidenciar a imperativa necessidade de manter o Estado a uma distância segura da iniciativa privada.

O empreendedorismo tem o potencial de ser o principal vetor de desenvolvimento social para o Brasil. Para isso, é necessário que exista um verdadeiro choque inserindo esse tema da forma correta na pauta de desenvolvimento do país. O problema hoje é encontrar essa pauta...

Sandro Magaldi é CEO da escola de empreendedorismo e negócios meuSucesso.com
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]