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Não é necessário ser administrador para saber que o orçamento público é um instrumento de planejamento e execução das finanças públicas. Ele contém a estimativa das receitas e autorização para a realização de despesas da administração pública, direta e indireta, em determinado exercício – que, no Brasil, coincide com o ano civil.

Se a previsão da receita for superior à estimativa da despesa, o governo encaminha ao Legislativo um projeto de lei pedindo autorização para incorporar e executar o excesso de arrecadação, por meio de créditos adicionais. No caso contrário, se as despesas superarem as receitas, o governo fica impossibilitado de executar o orçamento em sua totalidade, sendo obrigado a cortar gastos.

A farsa de uma proposta de orçamento, para o próximo exercício, “realista e transparente” – como o governo quer que acreditemos –, entregue ao presidente do Senado, Renan Calheiros, pelos ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, apresenta um déficit primário de R$ 30,5 bilhões, valor que representa 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Esta é primeira vez que uma peça orçamentária foi encaminhada ao Congresso Nacional com previsão de receitas menores do que despesas. Com essa proposta, o governo da presidente Dilma Rousseff admite formalmente que a meta fiscal, de 0,7% do PIB de 2016, fixada em julho deste ano, não será atingida. Assim, a previsão de crescimento da economia para o próximo ano é de minguado 0,2% e, para a inflação, foi estimado índice de 5,4%.

Seria cômico, se não fosse trágico, saber como são aplicados os impostos arrecadados pelo governo

Para equilibrar o orçamento do próximo ano, o governo federal anunciou, em setembro deste ano, algumas medidas fiscais: adiamento do reajuste dos servidores; suspensão de concursos públicos; eliminação do abono de permanência; implementação do teto remuneratório do serviço público; redução do gasto com custeio administrativo; mudança de fonte do PAC (Minha Casa, Minha Vida); revisão da estimativa de gasto com subvenção agrícola. Com isso, o governo pretende economizar cerca de R$ 26 bilhões e evitar novo rebaixamento da nota brasileira pelas agências de classificação de risco. Além dessas medidas, o governo anunciou que irá propor oficialmente o retorno da famigerada Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF), conhecido como o “imposto do cheque”, com alíquota de 0,2%.

O governo federal considera que o orçamento deficitário enviado ao Congresso Nacional é uma peça “realista e transparente”. Será mesmo? Ou vamos presenciar de novo as chamadas “pedaladas” fiscais – atrasos no desembolso de transferências, pagamentos de benefícios e aplicação desses recursos em compras no mínimo estranhas, realizadas pelos diversos órgãos do governo?

Seria cômico, se não fosse trágico, saber como são aplicados os impostos arrecadados pelo governo – até dia 30 de setembro de 2015 o impostômetro acusava a arrecadação de R$ 1,488 trilhão – em coisas absurdas, apesar da atual crise e do ajuste fiscal. Pinçamos do site spotniks.com alguns exemplos de gastos com coisas estúpidas: o Senado Federal pretende trocar 3,6 mil metros quadrados de carpete, no valor de R$ 549 mil; adquirir 60 televisores de 42 polegadas full HD, por R$ 97 mil; e gastar R$ 91 mil em iPhones. A Câmara dos Deputados pretende gastar R$ 1 bilhão com ampla reforma que prevê gabinetes maiores, construção de três novos prédios e até um centro de compras, o controverso “parlashopping”. Os animais do Palácio do Planalto serão bem alimentados, com ração no valor de R$ 121 mil; e o governo federal vai queimar mais de R$ 360 milhões em combustíveis, o suficiente para percorrer mais de 1,2 bilhão de quilômetros.

O que nós, administradores, esperamos não é um “orçamento realista e transparente”, mas sim uma maior eficiência na máquina do governo; profissionalização do serviço público, elegendo o mérito como critério único da escolha dos funcionários, e não o loteamento dos mais de 20 mil cargos comissionados; redução no nível de corrupção; e parcimônia nos gastos públicos. Essas práticas certamente poderiam reduzir os gastos do governo e contribuiriam para a eficácia das políticas públicas que, em consequência, provocariam a estabilidade política e legitimariam a democracia do país.

Esperamos, ainda, um país com maior liberdade econômica, pouca burocracia, mais justiça, menor tempo para abertura de uma empresa, menos sonegação fiscal e maior renda per capita, menos desigualdade social, redução da violência e serviços públicos de qualidade.

Sebastião Luiz de Mello é presidente do Conselho Federal de Administração.
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