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Nos tempos atuais, a definição jurídica de família passou a ser deturpada por ideias e proposições que, perigosamente, vêm sendo cultivadas por seus defensores em projetos de lei e por alguns tabeliães de notas.

Há tentativas de implantação da poligamia em nosso país. Com essa finalidade, são utilizadas expressões enganosas, que seduzem e ofuscam a razão, como “uniões poliafetivas” e “uniões simultâneas”, que suavizam o seu verdadeiro conteúdo.

A família, desde a Constituição Federal de 1988 e com a interpretação que lhe deu o Supremo Tribunal Federal em 2011, é efetivamente formada pelas uniões heteroafetivas e homoafetivas monogâmicas, bem como pelas famílias monoparentais. As relações entre pessoas do mesmo sexo merecem proteção não só do Poder Judiciário, mas, principalmente, do Poder Legislativo, que tem a atribuição constitucional de regular a matéria. Basta ler a referida decisão do STF para que se conclua que este não afastou a monogamia.

Pretende-se dar aos amantes, ou seja, àqueles que são cúmplices de adultério, os mesmos direitos das pessoas casadas

Na contramão do que quer a nossa sociedade e é garantido pela lei e pela jurisprudência, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 3.369/2015, de autoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) e de relatoria do deputado Jean Wyllys (PSol-RJ), intitulado “Estatuto das Famílias do Século 21”, em que, sem a indispensável exatidão e precisão dos conceitos, se dá abertura para que a relação poligâmica seja havida como entidade familiar. Já no Senado Federal, há o Projeto de Lei 470/2013, chamado “Estatuto das Famílias”, de autoria da senadora Lídice da Mata (PSB-BA) e de relatoria do senador João Capiberibe (PSB-AP), que contém proposições que atribuem à relação concorrente com o casamento e com a união estável – ou seja, à poligamia não consentida – direitos típicos de uma entidade familiar. O projeto propõe, também, a introdução, no conceito da família brasileira, das relações entre irmãos, como se pode interpretar no seu artigo 69, § 2.º, segundo o qual a “família pluriparental é a constituída pela convivência entre irmãos, bem como as comunhões afetivas estáveis existentes entre parentes colaterais”. Estaria aí a busca de atribuição de legalidade às relações incestuosas? Saliente-se que nesses projetos de lei tudo pode e cabe numa entidade familiar, em afeto e sexualidade.

Assim, pretende-se dar aos amantes, ou seja, àqueles que são cúmplices de adultério, os mesmos direitos das pessoas casadas, como o direito à assistência material. Pelo fim da relação de mancebia, a amante teria direito de receber pensão alimentícia e também o direito à indenização por danos morais e materiais pelo fim da relação ilícita de adultério.

Bem por isso, a Corregedoria Nacional de Justiça, liminarmente, recomendou a todos os Tabelionatos de Notas do Brasil que não lavrem escrituras de uniões estáveis poliafetivas enquanto se aguarda decisão sobre o pedido de providências feito pela Associação de Direito de Família e das Sucessões (Adfas) de vedação dessas lavraturas.

As pessoas são livres para escolher o tipo de relação que querem estabelecer entre si, mas sempre dentro dos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico, que é sistema lógico e que merece ser adequadamente interpretado. Por outro lado, também o projeto de lei denominado Estatuto da Família (PL 6.5863/2013), de viés diametralmente oposto ao dos projetos anteriormente mencionados, não corresponde aos anseios sociais; a necessidade é de busca do ponto de equilíbrio entre tais proposições.

O conceito de família, que sustenta uma nação e fortalece esse núcleo essencial da sociedade, não pode abranger todas as formas de relacionamento, como a poligamia (consentida ou não) e as relações incestuosas, recomendando-se ao Congresso Nacional que encontre o equilíbrio necessário para enfrentar esse debate.

Regina Beatriz Tavares da Silva, doutora em Direito e advogada, é presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (Adfas).
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