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| Foto: Antonio Scorza/Folhapress

A Câmara dos Deputados e o Senado confirmaram a intervenção federal na segurança pública do estado do Rio de Janeiro. O decreto assinado pelo presidente Michel Temer teve 340 votos favoráveis e 72 contrários na Câmara, e 55 a 13 no Senado. O Exército irá assumir a segurança pública do estado, com responsabilidade sobre as polícias, os bombeiros e a área de inteligência, inclusive com poder de prisão de seus membros. O interventor será o general Walter Braga Netto. Ele, na prática, vai substituir o governador do Rio na área de segurança pública.

No momento em que a temática da segurança pública começou a ser pauta prioritária nos discursos de políticos, especialistas e da imprensa, houve um primeiro ensaio de emprego das Forças Armadas em Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no Rio. Desde essa época, por volta de 2010, essa já parecia ser a única alternativa possível no combate às facções criminosas ligadas ao narcotráfico e a outras atividades criminosas. Sem apoio dos órgãos policiais, que boicotavam sistematicamente a iniciativa do governo federal ao considerá-la uma intromissão, optou-se agora pela intervenção propriamente dita, quando há subordinação de todos os que atuam na segurança pública aos militares. A própria Superintendência da Polícia Federal do Rio de Janeiro mantinha uma colaboração pífia, motivo de muitas reclamações dos responsáveis pela GLO.

Será que pode ser falso o motivo para intervir em uma cidade que tem um aplicativo para avisar sobre tiroteios?

A opinião pública, cansada da insegurança, do medo e de levar a culpa pelo fracasso do atual modelo de segurança, se mostra favorável à medida. Os cidadãos não suportam mais conviver com tiroteios, assaltos e mortes por motivos torpes. Não há respeito nem pelos muito idosos, pelas mulheres grávidas, pelas crianças. Ao contrário, tudo desperta a ira dos que portam suas armas ilegalmente para fazer o ganho do dia por meio do crime. Morre-se por causa de um celular ou por não ter o celular, não há salvação.

A experiência no Rio certamente será um projeto-piloto. Se os resultados forem bons, outros estados seguirão pela mesma linha. O emprego da intervenção federal é necessário como um último recurso na resolução de problemas da segurança pública, enquanto, paralelamente, devem ser adotadas políticas saneadoras para mitigar a situação caótica dos estados na questão da proteção de sua população.

A politização do tema distorce a tentativa de solucionar o problema da insegurança no Rio de Janeiro e não leva em conta o sofrimento da população. Por que alguns partidos, como o PSol, entraram com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a votação da intervenção na Câmara dos Deputados, mas nada fizeram, como políticos representantes do povo, para resolver o problema da segurança pública, que se arrasta há anos? Por que algumas ONGs estão criando grupos para fiscalizar a ação militar em vez de fiscalizar as atividades dos criminosos? Por que professores doutores de Direito criticam a intervenção e se mostram preocupados com a possibilidade de abusos cometidos por membros do Exército permanecerem impunes, enquanto a impunidade reina soberana nas vidas das pessoas de bem que perderam seus entes queridos em uma ida ao supermercado ou na volta da escola?

Leia também: Crise, intervenção e o flagelo dos “especialistas” (artigo de Diego Pessi e Bruno Carpes, publicado em 19 de fevereiro de 2018)

Leia também: Intervenção no Rio de Janeiro (editorial de 16 de fevereiro de 2018)

Está tudo invertido em nosso país. Há filmes em que as pessoas torcem pelo bandido. No Brasil, isso ocorre na vida real, como se os bandidos fossem as verdadeiras vítimas. Chegou a hora de todos se posicionarem de forma consensual contra os maus. A comunidade intelectual manifesta o tempo todo seu repúdio à medida, alegando “falsa motivação”. Será que pode ser falso o motivo para intervir em uma cidade que tem um aplicativo para avisar sobre tiroteios? “Fogo Cruzado” mapeia as regiões metropolitanas fluminenses onde ocorrem disparos de armas de fogo e alerta seus usuários. O fim de semana do carnaval deste ano registrou 46 tiroteios contra 17 no ano passado – um aumento de 170%. Nem a maior festa da Cidade Maravilhosa tem sucesso em colocar uma pausa na violência. O Fogo Cruzado registrou ainda 348 tiroteios/disparos de arma de fogo nos arredores das Linhas Vermelha e Amarela entre julho de 2016 e janeiro de 2018. Ou seja, turistas que descem no aeroporto e são obrigados a passar por essas vias correm o risco de encontrar em seu caminho uma bala perdida. Para mim, esse cenário é de guerra. Se isso não for motivo suficiente, então não sei o que será.

Termino citando a cantora carioca Fernanda Abreu: “ Rio 40 graus / Cidade maravilha / Purgatório da beleza e do caos (...) O Rio é uma cidade de cidades misturadas / O Rio é uma cidade de cidades camufladas / Com governos misturados, camuflados, paralelos / Sorrateiros, ocultando comandos”.

Carlos Arouck é agente de Polícia Federal, com formação em Direito e Administração e especialização em Gerenciamento Empresarial, e ex-instrutor da Academia Nacional de Polícia.
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