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Em regimes autoritários, o Estado é visto como uma instância opressora e inquestionável que, através do monopólio abusivo da força, utiliza mecanismos de repressão social e direcionamento dos negócios públicos a grupos econômicos determinados. Ou seja, o poder é usado por poucos e para poucos. Em tese, a democracia é o oposto desse modelo perverso: em vez da concentração do poder, elege-se a força plural das liberdades individuais na busca construtiva de consensos governamentais. Nesse contexto, a abertura democrática de 1988 marcou a retomada de um processo de consolidação de garantias político-constitucionais mínimas, protegendo-se o cidadão, as famílias, as empresas e a sociedade de investidas estatais arbitrárias ou despidas de razões suficientes.

Todavia, no tocante à estrutura do Estado, mantivemos uma visão arcaica e patrimonialista. Temos, assim, um esboço de democracia política em um Estado de raízes autoritárias. Consequentemente, cria-se uma antinomia perfeita entre a vontade popular e seus instrumentos de realização eficaz. Tal circunstância conduz a uma grave ineficiência da máquina pública que, enredada na teia da burocracia, transforma o Estado brasileiro em uma fonte de frustração democrática. Em outras palavras, o Estado deve servir à democracia e não se servir do que é público.

No tocante à estrutura do Estado, mantivemos uma visão arcaica e patrimonialista

Objetivamente, a consagração do regime das liberdades constitucionais, além de uma instância de proteção do indivíduo, impõe aos membros da sociedade o dever de preocupação política com o funcionamento otimizado da máquina pública, pois só há democracia autêntica em um Estado eficiente, dinâmico e responsável.

Infelizmente, parte do funcionalismo público ainda vive no modelo repressor autoritário que faz do cidadão um servo do poder. E ai de quem reclamar, pois aí mesmo é que as coisas não funcionam. Além disso, o mau funcionário não é diferenciado do servidor probo e cumpridor, sendo cogente o estabelecimento de uma pauta de meritocracia e de incentivos legais à promoção da qualidade e da eficiência funcional. Sim, o quadro atual tem muitos problemas, mas o fundamental é que existe uma silenciosa maioria séria que quer trabalhar dignamente para o público e para o bem da sociedade. O desafio é dar voz e efetividade para essa decente maioria dispersa, elevando a competência pessoal e o mérito nas instituições.

Sem cortinas, tivemos, no Brasil, uma democratização política desacompanhada de uma redemocratização do Estado. As assimetrias de nosso processo histórico estão desnudas na impressionante crise fiscal atual. Os custos públicos explodem, a eficiência estatal é baixa e a carga fiscal, elevadíssima. Enfim, essa anacrônica engrenagem de poder é manifestamente insustentável. O Estado não é um fim em si mesmo, mas um meio prático de realização da democracia. Portanto, se o Estado funciona mal, não há como a democracia ir bem.

Por tudo, fica a pergunta: nosso Estado serve ou se serve do Brasil?

Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr. é advogado.
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