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| Foto: José Cruz/Agência Brasil

A reforma trabalhista diz respeito a uma série de alterações na CLT por meio da Lei 13.467/2017, publicada em julho deste ano e que entra em vigor no dia 11 de novembro. Apesar de estar sendo anunciado que a reforma gerará efeitos imediatos nos custos com pessoal, é necessário ter cautela, pois importantes dúvidas sobre a aplicabilidade das novas regras seguem sem esclarecimentos.

A nova lei traz alterações vastas e profundas na CLT e nas relações de trabalho, mas foi produzida e aprovada muito rapidamente pelo Legislativo, sem os devidos debates com a comunidade acadêmica, com a advocacia, com o MPT e com a própria magistratura. Isso causou um conjunto de normas interessantes, mas que têm falhas técnicas e científicas que geram um cenário de insegurança jurídica.

A primeira questão relevante que deve ser considerada pelas empresas e que deve inspirar cautela é a grande dúvida acerca da aplicabilidade ou não das regras da reforma aos contratos já vigentes. Isso se deve ao fato de que várias das novas regras flexibilizam direitos e, portanto, se mostram menos favoráveis aos trabalhadores em relação à normativa anterior. É o que se dá, por exemplo, com a extinção das horas in itinere, do intervalo de 15 minutos da mulher, do direito de afastamento da gestante de atividades insalubres em geral, do direito ao pagamento do período integral pelo intervalo parcialmente violado, e outros.

Nem os contratos novos estão blindados em relação às discussões de aplicabilidade da reforma

A aplicação de uma nova lei que retira direitos dos trabalhadores em relação à lei anterior encontra muita resistência no Direito do Trabalho, que é regido por um princípio constitucional muito específico, que é o princípio da “norma mais favorável”. De acordo com tal princípio, uma nova norma somente terá efeito sobre um determinado contrato de trabalho se for mais favorável que a norma anterior. Tal entendimento se baseia também na ideia de direito adquirido e de inalterabilidade contratual lesiva ao empregado.

Diante disso, apesar de a reforma carregar a intenção de dar mais autonomia às partes na negociação dos termos do contrato de trabalho, não é possível ignorar que isso se opõe frontalmente à lógica anterior, de proteção absoluta ao trabalhador, considerado hipossuficiente e inabilitado à negociação de suas condições laborais. Tal lógica já era a que permeava os contratos já vigentes, o que torna “perigosa” a aplicação dos novos dispositivos a essas relações já antigas.

Há, assim, um considerável risco de que o Judiciário trabalhista venha a declarar nulas as alterações contratuais supressivas de direitos operadas sobre contratos de trabalho que já estavam em curso antes da entrada em vigor da reforma.

Leia também:O Brasil, a sociedade, os juízes, as leis e as relações de trabalho (artigo de Marlos Melek, publicado em 7 de novembro de 2017)

É importante pontuar, não obstante, que há alterações mais arriscadas e alterações menos arriscadas no que diz respeito aos contratos já vigentes. As mais arriscadas são aquelas que retiram direitos que anteriormente eram operados e que não dependem do consentimento do empregado. As menos arriscadas (embora não isentas de riscos) são aquelas que apenas alteram, com consentimento do empregado e/ou com chancela sindical, o modelo de trabalho praticado, sem prejuízos objetivos ao trabalhador.

Em segundo lugar, os contratos novos, que venham a ser constituídos após a entrada em vigor da reforma trabalhista, tampouco estão blindados em relação aos riscos e discussões de aplicabilidade da reforma. Isso se deve ao fato de que o Judiciário trabalhista já anunciou, por meio de diversos enunciados provenientes de uma recente jornada da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que não aplicará uma série de dispositivos da reforma, desde já considerados inconstitucionais e até mesmo violadores de convenções internacionais ratificadas pelos Brasil. Isso significa que a Justiça do Trabalho tende, majoritariamente, a considerar nulas cláusulas contratuais que se baseiem em muitos dos novos artigos da CLT.

Opinião da Gazeta:A rebelião dos magistrados do Trabalho (editorial de 22 de outubro de 2017)

O que se nota diante disso é que as normas da reforma trabalhista ainda estarão, por um tempo considerável, sujeitas a reflexões e entendimentos dos mais variados. Sua entrada em vigor, portanto, colocará empregados e especialmente empregadores em um contexto de arriscada insegurança jurídica, de modo que se tem recomendado cautela às empresas nas alterações de suas sistemáticas de gestão dos contratos de emprego.

É interessante e prudente que se aguarde por posicionamentos mais sólidos da comunidade jurídica antes de se praticar alterações nos contratos já em curso ou até mesmo de se fazer novas contratações com base em regras mais contundentes da reforma trabalhista. Ou, quando menos, que se faça análise cuidadosa de riscos de cada hipótese de aplicabilidade dos dispositivos que passarão a valer a partir do dia 11.

Maíra S. Marques da Fonseca, Sérgio Rocha Pombo e Thaís Poliana de Andrade são advogados trabalhistas.
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