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Felipe Lima

Dias atrás, a Unesco, órgão da ONU, aprovou uma resolução que elimina as conexões judaicas com os locais mais sagrados para o judaísmo: o Muro das Lamentações e o Monte do Templo. Uma resolução tão absurda como dizer que a Basílica de São Pedro não tem vínculo com os católicos, ou que a Mesquita al Haran, em Meca, nada tem com o Islã.

A proposta da resolução aceita pela Unesco foi uma iniciativa palestina. Os países árabes, o Brasil e algumas outras nações foram favoráveis à resolução, seja por motivação político-ideológica ou comercial.

A aprovação da resolução poderia ter passado por mais uma das ações desastradas da ONU se não fosse o seu teor ofensivo contra duas tradições religiosas, fundamentos da espiritualidade e da ética ocidental. A Unesco atingiu em cheio, com estupidez, o cristianismo e o judaísmo – e, também, a história.

Eliminar os laços do povo judeu com seu patrimônio histórico não é nenhuma novidade

A Unesco atendeu aos interesses palestinos de, aos poucos, deslegitimar o povo judeu como herdeiro da Terra de Israel, da sua capital, Jerusalém, e de seus locais sagrados, exaustivamente citados nos textos judeus e cristãos. O Antigo e o Novo Testamento fazem inúmeras referências ao Templo de Jerusalém como local da habitação do Deus de Israel, local de peregrinação do povo judeu desde o período do reinado de Salomão, e destruído no século 10.º a.C.

No século 1.º a.C., o Rei Herodes concluiu a construção do Segundo Templo no exato local onde havia o primeiro, no atual Monte do Templo. O Templo não foi só local de culto, mas também centro da vida espiritual e social do povo durante os períodos de dominação estrangeira. E até hoje as orações são realizadas com os olhares voltados a Jerusalém, cidade que abrigou o Templo. No ano 70 da era cristã, o general romano Tito ordenou a destruição do edifício sagrado. Dele restou o Muro das Lamentações, onde rezam judeus do mundo todo e onde também rezaram os papas João Paulo II, Bento XVI e Francisco.

No Novo Testamento, incontáveis são as referências ao Templo como local de reunião do povo judeu. E quantas são as citações sobre Jesus no Templo de Jerusalém? Os cristãos sabem bem.

Na teologia cristã, o Templo é prefiguração de Jesus. Ele é, para o cristianismo, o Novo Templo. Além disso, Jerusalém e o Templo são significativos na origem do cristianismo – a cidade foi local da revelação daquele que é o Messias do povo cristão. Desvincular o Templo e o Muro do povo judeu é, também, isolar Jesus dos fatos históricos da tradição cristã.

Não é só a literatura religiosa que trata do Templo e do Muro Ocidental. Historiadores e arqueólogos de renomadas universidades mantêm extensos programas de pesquisas históricas e arqueológicas na área de Jerusalém, e até agora só se confirmou o vínculo do povo judeu com os locais em questão.

Eliminar os laços do povo judeu com seu patrimônio histórico, ou mesmo a sua presença na cultura cristã e ocidental, não é nenhuma novidade. Faz parte da estratégia antissemita presente no mundo desde os tempos primitivos. O imperador Adriano trocou o nome de Jerusalém pelo nome latino Aelia Capitolina e o de Israel, para Filistinia (Palestina), “terra dos filisteus”, com a intenção de eliminar o vínculo histórico e religioso do povo judeu com Israel e Jerusalém.

Os nazistas, no século 20, tentaram eliminar o povo e a cultura judaica da civilização ocidental. Hoje se tenta deslegitimar o povo judeu dos seus locais sagrados – logo, do seu país. Nada é novidade; o que não se pode admitir é a afronta aos povos judeus e cristãos e à cultura e aos valores históricos que fundamentam a civilização ocidental.

Antonio Carlos Coelho é professor de História e Cultura Judaica.
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