• Carregando...
 | Edilson Rodrigues/Agência Senado
| Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Com as modificações trazidas pela reforma trabalhista, o novo artigo 507-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) passou a permitir a solução dos conflitos pela via da arbitragem. A partir de agora, os empregados que tenham remuneração superior a R$ 11.291,60 (equivalente ao dobro do teto dos benefícios do INSS) poderão optar por levar sua demanda trabalhista para uma esfera arbitral ou, seguindo a tradição, pela Justiça do Trabalho. Esta decisão deverá ser de iniciativa expressa do trabalhador, sem qualquer dúvida ou coação da empresa. Havendo vício de vontade, a opção pela arbitragem deverá ser declarada nula pela instância judicial, que também passará a julgar o mérito dos pedidos.

Como se vê, o legislador elegeu o critério exclusivamente econômico para conferir a liberdade de escolha pela câmara de arbitragem. Logo, independentemente do cargo ocupado, a lei presume hipersuficiente todo empregado enquadrado nesta faixa salarial, a qual representa menos de 5% do total de trabalhadores com carteira assinada. Os demais deverão continuar acionando a Justiça do Trabalho em relação à solução de seus conflitos.

Diante desta novidade histórica, torna-se natural o surgimento de reação ou euforia das partes envolvidas. Particularmente, devo confessar, sempre vi com desconfiança a ideia de implementar a arbitragem trabalhista. Achava ser algo nefasto aos trabalhadores. Hoje, analisando a fundo o que representa a jurisdição arbitral, percebi que esse juízo era precipitado e se pautava em puro preconceito. Para fundamentar minha mudança de opinião, relaciono algumas vantagens do instituto, sobretudo aos trabalhadores.

O legislador elegeu o critério exclusivamente econômico para conferir a liberdade de escolha pela câmara de arbitragem

A primeira delas diz respeito à possibilidade de as próprias partes escolherem os árbitros que irão apreciar seu litígio. Poderá ser qualquer pessoa capaz, geralmente advogados especialistas ou juízes aposentados. Dependendo da natureza da causa, o árbitro poderá ser qualquer profissional que tenha a expertise exigida, a exemplo de um médico para demandas de doenças ocupacionais ou de acidentes do trabalho. Essa amplitude e facilidade de escolha confere maior precisão no julgamento arbitral, além de eliminar o elemento surpresa relativo à distribuição das demandas.

Não se nega que todo ser humano apresenta suas convicções ideológicas, as quais são formadas ao longo dos anos. Considerando que o litígio trabalhista é antes uma disputa entre o capital e o trabalho, é natural perceber determinados julgadores, quando do exercício da interpretação legal ou da convicção acerca da prova, tenderem (ainda que de forma inconsciente) em prol de suas respectivas ideologias. Não é diferente do que assistimos diuturnamente nas sessões do Supremo Tribunal Federal (STF) e em todas as cortes judicantes. Logo, ao ser distribuído um processo para este ou aquele juiz, os advogados já sabem de antemão qual será o provável resultado. Na arbitragem, isso desaparece, vez que são as próprias partes que escolhem seus árbitros, os quais, de comum acordo, indicam um terceiro que irá presidir o tribunal arbitral.

A segunda vantagem refere-se à rapidez da decisão. Enquanto um processo trabalhista perdura, em média, longos cinco anos, pois se submete a uma congestionada pauta de audiência, além de comportar inúmeros recursos e incidentes, o procedimento arbitral é mais célere. Pela Lei de Arbitragem, a decisão arbitral é irrecorrível e deverá ser proferida em seis meses, salvo se outro prazo tiver sido convencionado pelas partes.

Leia também: Os efeitos da reforma trabalhista (artigo de Antonio Carlos Vendrame, publicado em 13 de novembro de 2017)

Leia também: Imposto sindical e insegurança jurídica (editorial de 17 de abril de 2018)

Outro benefício da opção pela arbitragem é a confidencialidade. Sim, as partes podem convencionar total sigilo acerca de suas pretensões, evitando qualquer exposição pública, tanto da empresa devedora quanto do empregado litigante. Infelizmente, o mercado de trabalho discrimina trabalhadores que tenham figurado como reclamantes na Justiça do Trabalho. Por mais que a legislação tenha criado mecanismos que dificultem o acesso a estes dados, é comum verificar “listas negras” com os nomes dos ex-empregados que acionaram judicialmente seus ex-empregadores. Da mesma forma, as empresas não gostam de ver seus nomes na lista dos réus condenados. O sigilo da arbitragem elimina estes dissabores para ambas as partes.

Finalmente, cabe registrar a vantagem atinente ao custo do processo. Com as maldosas alterações trazidas pela reforma trabalhista, quase todas elas objetivando a redução do número de processos judiciais, ficou mais oneroso e temeroso levar a juízo qualquer demanda. Refiro-me, em especial, ao implemento dos honorários de sucumbência recíproca, onde a rejeição de qualquer pedido, ainda que controvertido, implicará condenação dos honorários do advogado da parte contrária. Não bastasse isto, a nova Lei 13.467/17 reduziu a abrangência dos beneficiários da Justiça gratuita, afetando os casos de isenção das custas processuais e os gastos com a realização de perícias. Em suma, tudo ficou mais difícil e gravoso ao trabalhador. Se considerarmos as aludidas despesas processuais (2% das custas e 15% dos honorários de sucumbência), o custo de um processo judicial gira em torno de 17% do valor dos pedidos. Em uma ação judicial de R$ 1 milhão, por exemplo, isso representa R$ 170 mil. A mesma demanda posta na câmara de arbitragem sairá por menos da metade deste valor.

Diante destes aspectos positivos, a arbitragem representa aos empregadores e empregados com remuneração diferenciada por lei um interessante e eficaz meio de solução de conflito. Recomenda-se que as partes estejam sempre assistidas por seus advogados, tal como usualmente acontece nas tratativas contratuais envolvendo executivos, jogadores de futebol, artistas e exercentes de funções estratégicas. Por último, importa asseverar que as câmaras de arbitragem, além de imparciais, devem ser independentes. Por se tratar de jurisdição arbitral, impõe-se que seu funcionamento esteja desvinculado de qualquer órgão de classe (associação comercial, industrial ou mesmo sindicatos ou centrais profissionais). Por tal razão, criamos em Curitiba a primeira Câmara Nacional de Arbitragem Trabalhista (Canatra), a qual se propõe independente e atenta às peculiaridades dos conflitos decorrentes da relação de trabalho e emprego.

José Affonso Dallegrave Neto é advogado, doutor pela UFPR, com pós-doutorado pela Universidade de Lisboa, e presidente da Câmara Nacional de Arbitragem Trabalhista (Canatra).
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]