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Na bolsa de apostas do mercado e no habitual frufru da mídia, a indicação de Aldemir Bendine para substituir Graça Foster no comando da Petrobras foi considerada mais um dos brutais erros cometidos pessoalmente pela presidente Dilma no fim do primeiro mês do segundo mandato. Escolha pessoal, contrariando a todos, inclusive ao presidente emérito, Lula da Silva. Acusações de favorecimento a uma pessoa de suas relações quando presidia o Banco do Brasil e a multa paga à Receita Federal obliteraram, como sempre acontece em ambientes propensos à satanização, um currículo de acertos estratégicos e políticos.

Ninguém lembrou (ou, se lembrou, foi com meia-boca) a prodigiosa façanha de Bendine, em maio de 2013, de criar num banco público uma subsidiária privada – a BB Seguridade – sem as amarras dos controles estatais. A operação permitiu levantar na oferta pública de ações quase R$ 12 bilhões, inesperado reforço no capital do banco e considerada a maior abertura de capital de uma empresa no país.

O inesperado surto de transparência espantou fantasmas reincidentes e desintoxicou o clima apocalíptico

O sisudo Bendine – Dida para os íntimos – foi nomeado em 6 de fevereiro e, apenas 77 dias depois, conseguiu superar um atraso de cinco meses e apresentar os resultados devidamente auditados do balanço da petroleira referente ao último trimestre e todo o ano de 2014. Admitiu e contabilizou a corrupção (mesmo que insuficientemente), somou os desvios, reconheceu desastrosas opções políticas privilegiando a incompetência e permitiu-se confessar, num governo edificado sobre a onipotência e infalibilidade, que aqueles números eram “uma vergonha”.

No outro lado do mundo, em Madri, o vice-presidente Michel Temer, impregnado pela atmosfera de humildade, abandonou seu jargão empolado e comentou, coloquial, “pegar bem, não pegou”. Claro, os números são penosos, o retrato dos vícios da sociedade brasileira ficou ainda mais visível.

Mas a resposta dos mercados tem sido positiva. O mercado respeita regras – ainda que frequentemente mostre-se refratário a regulações – e Bendine fez tudo “nos conformes”: junto com o balanço, “deu a cara” em extensa entrevista à imprensa, no dia seguinte foi adiante oferecendo ao mercado financeiro as necessárias explicações e logo garantiu que manterá o estilo “formiguinha”, o que pressupõe o desligamento dos holofotes e dos dogmas ideológicos.

O descalabro não foi superado, o estrago produzido pelo aparelhamento da empresa-símbolo não foi reparado – longe disso –, mas o inesperado surto de transparência espantou fantasmas reincidentes e desintoxicou o clima apocalíptico iniciado em seguida ao começo do segundo mandato.

As faixas e os cartazes do “fora Dilma” foram subitamente baixados, a aposta solitária da presidente no tecnocrata pragmático e prudente fortaleceu-a. Junto com a escolha do filósofo Renato Janine Ribeiro para consolidar o projeto da “pátria educadora”, Dilma, que começava a ficar com a imagem de “pé frio” (ou, pior, “dedo podre”), ganha literalmente nova silhueta: mais magra, mais desenvolta, pode enfrentar com mais jogo de cintura e serenidade a avalanche de acusações que fatalmente surgirão no decorrer dos processos da Operação Lava Jato a respeito de um prévio conhecimento do mar de lama que entupia os dutos da Petrobras.

Quanto mais efetivo o trabalho de saneamento da petroleira, mais enfraquecida ficará a dupla de verdugos que a atormentam, os donos do pedaço legislativo, Renan Calheiros e Eduardo Cunha. Respingados na primeira rodada do ventilador do Ministério Público Federal, passarão a ter mais cuidado ao lidar com uma parceira-adversária tão matreira quanto eles.

A fórmula 2T – transparência e temperança – poderá nos levar sem turbulências às vésperas de 2018. Sobretudo quando se tem a coragem de apostar em azarões.

Alberto Dines é jornalista.
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