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Há poucos dias, mais um evento surpreendente para a política brasileira aconteceu no Rio de Janeiro. O Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF2) determinou a prisão preventiva de três deputados estaduais fluminenses, entre eles o presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani (PMDB). Os três foram acusados de cometerem crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Diante da decisão proferida pela Justiça Federal, a Alerj decidiu realizar votação para manter ou não a prisão dos três parlamentares. Numa sessão polêmica, o Legislativo decidiu pela soltura dos deputados. A decisão da casa legislativa seria revogada pouco depois pelo próprio TRF2.

Tanto a Constituição da República (artigo 53, § 2.º) como a Constituição do Estado do Rio de Janeiro (artigo 102, § 1.º e 3.º) prescrevem que, desde a expedição do diploma, parlamentares só estão sujeitos a prisão se forem flagrados cometendo crimes considerados inafiançáveis pelo ordenamento jurídico. Além disso, havendo a prisão, cabe à respectiva casa legislativa resolver sobre a medida. A Alerj, porém, nesse caso específico, foi além: remeteu ofício ao diretor do presídio sem comunicar o TRF2 sobre sua deliberação.

A casa legislativa fluminense tinha competência constitucional para deliberar sobre a prisão de seus integrantes

Diante do quadro, o TRF2 revogou a decisão do Legislativo fluminense, pois cabe ao Judiciário a determinação de soltura de presos. E nesse vai-e-volta surgiu mais uma vez a polêmica: no caso de tribunais decidirem por prisões preventivas ou outras medidas cautelares previstas no Código de Processo Penal contra parlamentares, qual o papel constitucional do Poder Legislativo? A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) provocou o Supremo Tribunal Federal em seguida para decidir sobre o assunto.

Na verdade, o STF já se manifestou indiretamente sobre a controvérsia em decisão recente sobre a situação do senador Aécio Neves (PSDB-MG). Ele, por deliberação do próprio Supremo, estava suspenso do mandato e deveria manter recolhimento domiciliar todas as noites. O STF, por seis votos a cinco, decidiu que, se o Judiciário determinar que qualquer parlamentar federal sofra alguma medida cautelar que atrapalhe o exercício de seu mandato, a casa legislativa respectiva deve se pronunciar sobre a medida. Logo após, o Senado decidiu revogar as medidas impostas ao senador Aécio. Houve, desde então, diversos casos similares em parlamentos estaduais e municipais. Reforce-se que a decisão do STF tratou apenas dos direitos e prerrogativas previstos na Constituição da República sobre deputados federais e senadores.

Outro lado:Decisão da Alerj ofende a Constituição (artigo de Ana Lúcia Pretto Pereira, professora da UniBrasil)

Restou a dúvida: essa decisão do Supremo estender-se-ia automaticamente a parlamentares estaduais, distritais e municipais? No caso dos vereadores, a Constituição da República não dá a eles todas as prerrogativas conferidas aos parlamentares federais: por um lado, eles detêm igualmente imunidade por suas opiniões, palavras e votos. No que diz respeito à prisão, o texto constitucional é silente. Diferentemente, a Constituição da República, no que trata dos deputados estaduais e distritais, determina – no artigo 27, § 1.º – que se aplica a estes as mesmas regras sobre inviolabilidade e imunidade. Conclui-se que, apesar de a Alerj ter extrapolado suas funções ao determinar diretamente a soltura dos seus membros, a casa legislativa fluminense tinha, de fato, competência constitucional para deliberar sobre a prisão de seus integrantes.

Daniel Falcão, advogado, é professor doutor da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).
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