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Moro em Israel desde agosto. Com a aposentadoria, eu e minha esposa decidimos viver com a nossa filha, genro e netos, depois de conviver durante 25 anos com o nosso filho, nora e netos no Brasil. Ao anunciar a decisão para os amigos, o comentário sempre era sobre a questão do terrorismo em Israel. Conhecia o problema pelos noticiários e pelo contato com os familiares e amigos daqui. Sabia que mais cedo ou mais tarde teria de conviver com ele. Não sabia, contudo, que ocorreria tão cedo, numa fase de adaptação a uma nova vida, o contato com essa realidade.

Os últimos dias têm sido particularmente tensos, com os atentados terroristas ocorrendo em praticamente todas as cidades do país. Desta vez, eles se caracterizam por ataques a faca, realizados por jovens entre 13 e 20 anos, contra vítimas civis, sempre atacadas pelas costas. Ataques com carros lançados contra paradas de ônibus também são frequentes.

O terror traz consigo o medo, a insegurança e, principalmente, a desconfiança

O recrudescimento do terror acentua ainda mais o abismo entre israelenses e palestinos e torna a vida de ambos os lados mais difíceis. Não dá para negar que este é um momento muito difícil na tênue relação entre os dois lados do conflito. A gravidade da situação vai exigir uma postura de flexibilização tanto do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu como do presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas. Se não bastasse o número de mortos e feridos de ambos os lados e a insegurança para o cidadão israelense, os atos terroristas de agora têm profunda influência na economia de Israel e dos palestinos. Quem acompanha a vida diária do país observa que os palestinos precisam do mercado de trabalho israelense e os israelenses não podem prescindir da mão de obra dos árabes e palestinos.

A exemplo do Brasil, Israel é um cadinho de raças e etnias, convivendo-se aqui com imigrantes de quase todo o mundo. A diversidade racial é constatada diariamente no cotidiano da vida israelense. Andar por uma rua e frequentar o supermercado permitem o contato com israelenses e árabes nascidos aqui e imigrantes russos, etíopes, filipinos, africanos. Recentemente, muitos refugiados do Sudão do Sul e da Eritreia vieram reconstruir sua vida em Israel. Num mesmo espaço público ou em um ambiente de trabalho convivem lado a lado judeus, árabes, eslavos e negros, muitos deles expondo a sua identidade cultural nas roupas e na maneira de ser. Identificar um terrorista no meio dessa diversidade é quase impossível. O rompimento da confiança mútua parece ser a chave da questão. O restabelecimento do convívio, sem medo e traumas, e o combate ao fanatismo são as únicas saídas viáveis para a solução do problema atual.

Conviver com o terror não é fácil. Exige uma mudança de atitude. Ele traz consigo o medo, a insegurança e, principalmente, a desconfiança. Na Israel de hoje é impossível separar judeus e árabes. A convivência é diária e exige confiança mútua. Poucos sabem que a maioria dos farmacêuticos de Israel é árabe e muito respeitada pela competência e eficiência no trabalho. Circular por uma loja de departamentos ou um supermercado permite observar atendentes de todas as raças e etnias, trabalhando lado a lado em perfeita harmonia.

Independentemente da política e das dificuldades atuais, a vida prossegue normalmente. Os cidadãos estão mais cautelosos e vigilantes, mas as atividades diárias e o lazer praticamente não foram afetados. Como definiu um curitibano que mora aqui há muitos anos, o esporte nacional do israelense é cruzar semanalmente as excelentes estradas do país para visitar amigos. E isso continua acontecendo.

Todos sabem que a onda de terror é cíclica e tem momentos de calmaria e recrudescimento. A esperança é que um dia ela seja apenas lembrada como um momento de história e que todos possam conviver em paz. Que assim seja.

Léo Kriger é professor universitário e jornalista.
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