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Existem impostos justos. São aqueles cobrados sobre o lucro, resultado obtido ou valor agregado (Imposto de Renda, Imposto de Transmissão de Propriedade, CSSL). E existem impostos injustos, aqueles cobrados sobre o total recebido ou faturado (PIS, Cofins, IR retido, dentre outros), independentemente do resultado. No Brasil, existiu por mais de dez anos (de 1996 a 2007) um imposto maligno e cruel, cobrado de todos, por qualquer movimentação de valores e repetidas vezes sobre o mesmo dinheiro. Este é o caso da CPMF, monstro que ressurge e está para ser aprovado no Congresso Nacional.

A CPMF, criada com o nome zombeteiro de Contribuição (ato voluntário e não impositivo, com finalidade especifica) Provisória (por tempo determinado) sobre Movimentação Financeira (igual para todos os desiguais: todo mundo paga), pretende cobrar 0,2% de todo valor que se movimenta via banco, de todos e em todas as movimentações do mesmo dinheiro (politributação).

Criada em 1996, com alíquota de 0,2%, deveria ser extinta em 1999. Foi prorrogada com mudanças de alíquota: 0,38% em 1999, 0,3% em 2000 e 0,38% em 2001, até 2007, quando foi finalmente extinta pelo Congresso Nacional. Em 2007, arrecadava R$ 29,9 bilhões, agora, a previsão é de arrecadar R$ 32 bilhões.

Como a maior parte dos brasileiros é de classe baixa e paga CPMF tanto no salário como nos produtos que consome, mais de 70% do montante da CPMF é cobrado dos mais pobres, aqueles que nem sequer deveriam pagar impostos, mas sem receber a retribuição dos tributos cobrados dos mais ricos em saúde, educação, segurança, Justiça e infraestrutura. Cobra-se injustamente e nada se devolve.

Quanto mais elaborado e maior o valor agregado ao produto (mais fases), maior a incidência de CPMF

Essa anomalia fiscal nunca deveria nem sequer ter sido implantada, mas o foi e com a promessa de que duraria três anos, com a verba destinada para a saúde. O dinheiro foi desviado de sua finalidade e o “provisório” existiu por 11 anos, com iminência de retorno em 2015.

A CPMF é um imposto cruel e injusto pela sua forma de arrecadar, estando classificado pela Constituição Federal como confisco (artigo 150: “Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios: [...] IV – utilizar tributo com efeito de confisco”), já que não respeita a capacidade contributiva individual, cobrando até dos desamparados na movimentação de qualquer valor. Ora, em um país onde a miséria impera e a CPMF está embutida até na comida, presume-se que os pobres são os maiores contribuintes desta aberração tributária.

A Constituição proíbe a bitributação (cobrar mais de uma vez o mesmo imposto). No caso da CPMF temos politributação (cobrança do tributo muitas vezes). Imagine-se quantas vezes foi embutida a CPMF na fabricação de uma geladeira. Desde a retirada do minério de ferro e do petróleo até a fase final de chapas moldadas e plásticos, pelo menos 20 vezes foi cobrado CPMF. Logo, a CPMF incide no preço final de cada produto a uma média de 5% e quem paga tudo isso é o consumidor final: o povo. Quanto mais elaborado e maior o valor agregado ao produto (mais fases), maior a incidência de CPMF. Sobretaxar a indústria de valor agregado, uma das salvações nesta crise sem precedentes.

Se analisada por outro ângulo, o da capacidade contributiva da economia, a maligna CPMF também pode ser considerada confisco, já que a lei prevê confisco sempre que o conjunto da carga fiscal ultrapassar a capacidade do cidadão para pagamento de impostos (Adin 20-10-2-DF). Sabemos que os impostos no Brasil já ultrapassaram a capacidade contributiva em mais de 10%, estando em patamar falimentar e causando empobrecimento geral da economia e de todo o povo, em todas as classes sociais, além do endividamento fiscal das empresas de todos os tamanhos e em todos os setores.

Usa-se de pressões falaciosas para ter aprovada a CPMF. A primeira é a de que “vamos ter de aumentar outros impostos se não for aprovada”. Mas ninguém diz “vamos reduzir a máquina pública cuidando somente do essencial e deixar de ser Estado empresário. Nós pagamos impostos para sustentar o elefante branco público, descontrolado e inchado”. A segunda: a CPMF serve de controle à sonegação e corrupção! Então vamos implantá-la, porém com uma alíquota de 0,01%. Assim manteremos o controle da movimentação sem confiscar R$ 35 bilhões dos brasileiros mais pobres.

A crise está destruindo o país. Commodities, economia e emprego despencam em ritmo alucinante, enquanto juros, inflação e descrédito crescem diariamente. Logo, precisamos de redução e controle de despesas públicas, aumento do valor circulante na economia e redução de carga fiscal para criar desenvolvimento e aumentar a arrecadação por valor agregado – e não por aumento de impostos.

A CPMF sempre foi inconstitucional, confiscatória e principalmente cruel, cobrando de todos, que na maioria são pobres. Não há razão para o retorno deste tiranossauro. A única justificativa de sua implantação seria para controle de sonegação e corrupção, com alíquota insignificante, como 0,01%.

Nelson Lacerda é advogado tributarista.
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