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| Foto: Pablo Guia/Divulgação

Como escrevo há algum tempo, um dos problemas mais prementes do Brasil é o da segurança pública. Mais especificamente, a questão da criminalidade e da culpabilidade da vítima, aliadas ao vitimismo do criminoso. O que seria “culpabilidade da vítima”? Esse fenômeno ocorre no momento em que se diz, por exemplo, que “Fulano foi sair de aliança, por isso foi roubado” ou, então, “ter um celular caro como o seu é estar pedindo para ser roubado”. Já a expressão “vitimismo do criminoso” pode ser explicada ao se defender um rapaz pego por PMs após cometer um assalto, com frases do tipo: “Coitado, não tem pai nem mãe para ensinar as coisas certas, vive cercado pela violência, por isso tem esse comportamento”. A consequência disso é o que vivemos atualmente no Brasil. Quando um crime é cometido e não fica claro de quem é a culpa, ninguém é culpado – a impunidade impera.

Ainda com relação à criminalidade, é importante deixar claro também que não há ligação com a classe social. A diferença entre o criminoso rico e o pobre é basicamente o tipo de crime que comete. Nas favelas, escolhe o crime que pode ter mais chances de êxito, normalmente mais violento e de contato direto com a população. Os ricos escolhem aquela forma de crime mais invisível, como gestão fraudulenta, estelionato, crimes de colarinho branco. A ação de um criminoso é um ato personalíssimo, planejado, decidido e executado por sua própria vontade, sabendo dos riscos e das consequências do ato cometido. A causa do crime é a decisão do criminoso.

A impunidade perde força cada vez que um cidadão se recusa a ter pena do criminoso

No Brasil, não se mensura o custo do crime e os valores da investigação. Um país inseguro, onde são muitas as perdas – de vidas, de empreendedorismo, de conhecimento científico. Nada disso tem preço. Nos países desenvolvidos, a prioridade é a proteção do cidadão e de seus bens, o direito de ir e vir é garantido, a segurança do comércio é levada a sério. Se há um crime, a investigação é realizada e os custos são divulgados e cobrados. Aqui, os inquéritos são abertos, mas terminam arquivados ou, em sua grande parte, não elucidados. As perdas são enormes e não divulgadas. Se a taxa de elucidação dos casos chega a 85% no Reino Unido, por exemplo, no Brasil nos contentamos com 5%.

Aliada a essa conjuntura, existe outra questão relevante: a necessidade de mudanças no Código Penal brasileiro. A Lei de Execução Penal reflete a cultura equivocada que acredita, por exemplo, em um suposto “encarceramento excessivo” e em um criminoso “vítima da sociedade opressora”. São ideias contaminadas por ideologias, baseadas em pesquisas sem rigor científico, difundidas em geral por intelectuais, professores universitários, sociólogos e defensores dos direitos humanos que enxergam nas vítimas os culpados. Para piorar, o Judiciário torna-se cúmplice desse sistema falido ao lançar mão de mecanismos como a audiência de custódia, ou ao priorizar a complacência dos próprios juízes, que garante a impunidade dos criminosos toda vez que as leis criminais existentes não são aplicadas com rigor.

Leia também: Mentiras do cárcere (artigo de Diego Pessi e Leonardo Giardin, publicado em 11 de julho de 2017)

Leia também: O brasileiro e os bandidos (editorial de 4 de novembro de 2016)

É preciso que a sociedade tenha a coragem moral de exigir que o criminoso seja punido, do contrário a justiça jamais será feita. Precisamos resgatar as liberdades civis que perdemos para a criminalidade e trazer de volta a sensação de segurança e o mínimo de sentimento de justiça, além de lutarmos pela atualização da legislação penal. Que democracia é essa na qual uma vida não vale nada? Que democracia é essa que tenta nos culpar e fazer acreditar que, por trás dos crimes, não há autoria? Pois há, sim. E esse criminoso precisa ser responsabilizado.

Fórmulas ultrapassadas de segurança pública não conseguem atender as demandas de hoje e, consequentemente, não produzem os resultados esperados pela população refém dos bandidos. Passou da hora de fazer investimentos diferentes dos que já foram feitos sem sucesso, como apostar em graduações voltadas à preparação para atuar em segurança pública – coisa rara no Brasil, mas comum nos Estados Unidos, que contam com uma variedade de universidades por todo o país oferecendo cursos na área da justiça criminal. A partir de pequenas iniciativas como essa, a partir de pequenos avanços conquistados por meio da militância de alguns corajosos que, nas ruas e no anonimato, pressionam o Judiciário brasileiro a rever suas contradições, aos poucos, esse quadro de caos e de manipulação é revertido. A impunidade perde força cada vez que um cidadão se recusa a ter pena do criminoso. Hoje, as pessoas têm mais acesso à informação e começam a perceber que a polícia, apesar de todas as críticas feitas diariamente, é a última linha de defesa do cidadão de bem.

Termino citando o procurador Filipe Barros: “Crime é escolha. A opção pelo crime é uma questão moral. A imensa maioria da população brasileira escolheu trabalhar honestamente”.

Carlos Arouck é agente da Polícia Federal, com formação em Direito e Administração e especialização em Gerenciamento Empresarial, e ex-instrutor da Academia Nacional de Polícia.
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