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| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

O povo acredita e proclama que Deus é brasileiro. Por quê? Porque em nosso imenso território não há vulcões, nem terremotos, nem maremotos, nem ciclones, nem flagelos de qualquer tipo. Nossa gente é cordial, fraterna, bem-humorada, fruto de sua formação étnica do índio, do português e do negro, enriquecida com correntes migratórias de todos os continentes. O inesquecível Darcy Ribeiro, em sua admirável obra O Povo Brasileiro, identificou bem as nossas virtudes e circunstâncias. A exuberância e fertilidade de nosso solo nos garantem a condição de celeiro do mundo. Nossos rios gigantescos e nossa inigualável Floresta Amazônica nos dão a supremacia ecológica no universo.

Esse ufanismo contrasta com a realidade de hoje de 13 milhões de desempregados, recessão econômica, PIB negativo, enorme déficit orçamentário da União e dos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e outros.

Houve a descoberta da maior rede de corrupção da história e, em ação coordenada do Ministério Público, Receita Federal e Polícia Federal, eclodiu em 17 de março de 2014 a Operação Lava Jato, tendo como expoente máximo o juiz federal de Curitiba Sergio Moro. Foram decretadas 101 prisões temporárias e 91 preventivas; houve 125 condenações por corrupção e lavagem de dinheiro. Ações pedem ressarcimento ao caixa governamental de R$ 38 bilhões e o pagamento de propinas atingiu R$ 6,4 bilhões.

A história do Brasil se demarcará entre antes e depois da Operação Lava Jato

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em função das delações da Odebrecht, pediu abertura de inquérito contra nove ministros do governo Michel Temer, integrantes do Tribunal de Contas da União, cerca de 100 parlamentares e seis governadores. As delações premiadas dos partícipes de atos de corrupção ajudaram a desvendar os ladrões dos cofres públicos, e centenas de outros políticos ainda serão citados.

O mérito maior da Lava Jato é ter prendido os corruptos e também os corruptores, donos e dirigentes de grandes empresas, que estão atrás das grades. Os cartéis foram escancarados, mostrando o enorme dano aos cofres públicos dessas combinações nas concorrências e licitações em que todos os participantes aumentavam os preços ofertados e distribuíam entre si as benesses e as obras disputadas de mentira. Essas restrições à concorrência têm dado incontáveis prejuízos aos cofres da União, estados e municípios, sendo responsáveis pelos déficits orçamentários e pela inflação.

A corrupção às escâncaras será um divisor de águas na história do Brasil, que se demarcará entre antes e depois da Operação Lava Jato. Há tratativas no Congresso Nacional de aprovar lei que anistia os beneficiários de caixa 2, medida ilegal que não deve prosperar.

As próprias empresas que participaram dos delitos estão sendo compelidas a criar mecanismos próprios de combate à roubalheira, convencidas de que o crime não compensa mais. Felizmente, a maioria absoluta dos empresários brasileiros tem procedimento ético, e não compactua com a roubalheira.

O fato novo é que a ampla propagação das ilicitudes nos jornais, rádios, televisão e redes sociais iluminou a cabeça popular, que repudia os envolvidos nas falcatruas, sejam políticos ou empresários. Projeto de lei com dez dispositivos anticorrupção, com mais de 1,7 milhão de assinaturas, está em discussão no Congresso Nacional.

O Brasil de agora em diante será outro, porque os exemplos de moral e justiça de juízes e magistrados das instâncias superiores, até o Supremo Tribunal Federal, já impregnaram o coração dos brasileiros. O sentimento anticorrupção será dominante nas eleições gerais do próximo ano de 2018, cuja reforma eleitoral terá de ser votada até 6 de outubro deste ano de 2017. A meu ver, a reforma político-eleitoral deverá conter os seguintes itens: término das coligações proporcionais; instituição da cláusula de barreira, extinguindo os partidos que não obtiverem 5% dos votos em dois terços dos estados brasileiros, pois não é concebível um Congresso Nacional com representantes de 28 partidos, como agora; e um sistema eleitoral misto, com metade dos eleitos pelo voto distrital, com segundo turno entre os dois mais votados, se necessário, e outra metade eleita em lista fechada pré-determinada.

Léo de Almeida Neves, membro da Academia Paranaense de Letras, é ex-diretor do Banco do Brasil e ex-deputado federal.

Leia também:As propostas da Lava Jato (editorial de 11 de fevereiro de 2017)

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