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A situação dos hospitais filantrópicos brasileiros vai de mal a pior. Altas dívidas bancárias e grandes problemas administrativos compõem o cenário deste serviço que, em teoria, deveria ser exemplo nacional de sucesso.

E as dívidas bancárias chegam a assustar. O Hospital Evangélico de Curitiba, por exemplo, possui cerca de R$ 80 milhões em débitos acumulados. O Pequeno Príncipe, referência nacional em saúde infantil, tem R$ 18 milhões em dívidas. A Santa Casa responde por outros R$ 18 milhões e o Hospital São Vicente – Funef possui dívida de R$ 7,5 milhões. Isso sem contar os juros que estão sendo pagos e que têm reflexo direto na qualidade dos serviços prestados à população. São R$ 5 milhões gastos com despesas mensais em juros bancários apenas em Curitiba. Se esses valores fossem utilizados na assistência médica de fato, milhares de pessoas teriam acesso facilitado a seu bem maior: a saúde.

É de conhecimento público que o aporte proporcionado pelo SUS é defasado

Quais os fatores que levam os hospitais a essa situação? A gestão administrativa, sem dúvida, é um deles e precisa ser atualizada, reavaliada em caráter urgente. Isso pode ser feito por meio da execução de ações que evitem o desperdício envolvendo gastos aparentemente menores e que, se não controlados, serão milhares deles no futuro.

Mas o principal fator é de ordem financeira. É de conhecimento público que o aporte proporcionado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é defasado. Algumas correções pontuais já foram realizadas, mas, de acordo com estudos da Federação das Santas Casas, para cada R$ 100 utilizados para atendimento no SUS, apenas R$ 60 são pagos aos hospitais. Aí está um grande problema, pois isso já inviabiliza os hospitais filantrópicos – para se manterem nesta categoria, 60% dos atendimentos devem ser realizados via SUS. Isso porque a maioria dos hospitais filantrópicos é insolvente.

Neste contexto, existe também o que se chama de “contratualização de hospitais” com o SUS, com critérios próprios de prestação de serviços, prevendo valores a atingir para efetivar pagamentos. O não cumprimento determinaria revisões de pagamento (fato este que já tem atraso). Se esse sistema fosse adequado, como explicar a situação dos hospitais citados?

Por outro lado, os critérios “legais” utilizados para o mecanismo de pagamento seriam de 90 a 120 dias. Vale considerar que os gastos são feitos mensalmente e o faturamento é encaminhado, normalmente, no início do mês seguinte. Existe a auditoria para análise de contas, mas que, em grande parte, não consegue analisar o processo. E assim seguimos, com o tempo passando, verbas sem caixa, protelação de pagamentos e os hospitais buscando recursos para saldar os seus compromissos, sobretudo os relativos a seu próprio pessoal, o que é inadiável. Com certeza esta é uma das razões básicas de endividamento, com juros sobre juros correspondentes. Mas o “sistema” dirá que está tudo em dia.

Em casos específicos, os atrasos se devem aos chamados aditivos, que são valores de incentivo a prestações específicas de atendimento a pacientes internados com leitos reservados ao sistema, ou até mesmo ao que se chama “porta aberta”, voltado para determinadas especialidades, como a cardiologia, mas cujos atrasos são da mesma ordem.

É inaceitável que os pagamentos sejam feitos logo após a apresentação de faturas, pois os contratos firmados apontam que qualquer anormalidade detectada implica em retenção de recursos do pagamento subsequente. Esta é a lógica para proporcionar atendimento qualificado e sobrevivência dos filantrópicos – ou seu desaparecimento, caso medidas urgentes não sejam executadas.

E se os hospitais filantrópicos, que respondem por dois terços da assistência médica prestada no Brasil, fechassem suas portas? O caos seria o diagnóstico mais preciso. No caso do Hospital São Vicente – Funef, foi feita a readequação dos espaços com a retirada de 36 leitos. No Paraná, até dezembro de 2014 foram fechados 5.445 leitos hospitalares. No Brasil, a notícia que se espalha é de que centenas de milhares de leitos estão sendo desativados.

Por isso, é preciso rever os critérios, as metodologias de encaminhamento e, principalmente, exigir que os administradores da saúde no país tenham realmente conhecimento e experiência no setor. Diante dessa situação, é inaceitável que esse cenário tenha continuidade. E estamos falando do maior direito do cidadão e de um dever maior do Estado. Onde estão os nossos parlamentares, que não colocam esse tema como prioridade e urgência pela saúde do povo?

Soluções pertinentes existem. É necessário encontrar a solução legal e ideal para o caso dos filantrópicos no Brasil; caso contrário, a calamidade na saúde estará declarada.

Marcial Carlos Ribeiro é diretor-presidente do Hospital São Vicente – Funef, em Curitiba.
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