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Há muitos modos de se estar só: apesar da onipresença tecnológica, que invade os leitos e os templos, as salas de cinema e as casas de saúde, o homem sente-se cada vez mais só. Não é difícil encontrar solitários nas grandes metrópoles. O século 21 é capaz de produzir uma nova contradição humana, que é parir, na época da conectividade absoluta, o homem desconectado de tudo. Mas essa solidão é voluntária. Há uma outra mais cruel e nociva.

O Brasil testemunha o surgimento de uma solidão específica: a solidão do homem honesto. Diferentemente da solidão do anacoreta cibernético, que escolhe alhear-se do mundo à sua volta, esse exílio é imposto aos homens por seus coetâneos. Trata-se do sentimento de que, diante das constantes notícias de roubalheiras e escândalos, os cidadãos não deveriam cumprir as normas éticas e morais. Pensa-se: se os líderes do povo não se ocupam do bem e da justiça, não será o homem comum a lutar para cumprir os princípios morais. E assim nasce o homem solitário, que se sente abandonado no cumprimento da lei e na busca do bem humano.

O cidadão de bem realmente precisa possuir fortaleza incomum para não relativizar os princípios éticos e para resistir às crises de consciência

É verdade, as estruturas e as superestruturas sociais podem facilitar ou dificultar as relações e o convívio social. Em uma sociedade onde predominam injustiças e falcatruas, corruptores e corruptos, o homem honesto precisa medir muito bem suas atitudes. O cidadão de bem realmente precisa possuir fortaleza incomum para não relativizar os princípios éticos e para resistir às crises de consciência, que frequentemente o acusam de ser “o único” escrupuloso a não aceitar propina, “a única” sonhadora a não roubar dinheiro público, “o único” ingênuo a não usar influência desonesta para crescer no trabalho, “o único” bobo a ainda honrar a palavra dada ou o contrato assinado. Em nossos dias conturbados, a maior das solidões está reservada ao homem ético, ao homem íntegro, ao homem cumpridor de leis e contratos. A virtude é tida por doença contagiosa em nossos tempos.

Mas contra o massacre da globalização, que despersonaliza e oprime subjetividades, importa lembrar que cada indivíduo é único. Cada pessoa é realmente insubstituível e pode colaborar de modo ímpar para tornar a vida de outras pessoas melhor. Veja o que um par de cartas de Francisco a Obama pôde fazer. Um homem – um homem só – pode mudar o mundo, pode tornar o planeta um pouco melhor. Eu e você podemos transformar o lugar em que estamos. Para isso, é preciso uma boa ideia, com uma dose extra de convicção. Portanto, a primeira pessoa que é preciso convencer de que o mundo vale a pena sou eu.

Robson de Oliveira, professor de Filosofia da PUC-RJ, é diretor do Centro Dom Vital.
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