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| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

Há muito se fala que a expressão “relações governamentais” está substituindo o termo “lobby”. No dia 19, o Ministério do Trabalho incluiu na lista da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) a ocupação profissional denominada “Profissional de Relações Institucionais e Governamentais” dentre suas atividades e, na descrição sumária, está a defesa de interesses junto aos tomadores de decisão política.

O substitutivo da deputada Cristiane Brasil ao Projeto de Lei 1202/2007, de autoria do deputado Carlos Zarattini, que visa regulamentar esta atividade, está pronto para ir ao plenário da Câmara dos Deputados. Mas a inclusão das Relações Institucionais e Governamentais como ocupação profissional se antecipou a esse processo.

A inclusão na lista de ocupações do Ministério do Trabalho e a regulamentação da atividade atendem a lógicas distintas. Para que uma ocupação seja incluída na CBO, o Ministério do Trabalho identifica, por uma dinâmica própria do mercado de trabalho, a existência de um significativo número de pessoas que atuam como profissionais de Relações Institucionais e Governamentais. O substitutivo ao projeto de lei que visa regulamentar a atividade atende a outra lógica: a do combate à corrupção, trazendo para a atividade de defesa de interesse dentro do processo de decisão política a observância da legalidade, da ética e da transparência, definindo o que pode ou não ser entendido como relações governamentais.

A lógica do combate à corrupção impulsiona a do mercado de trabalho

Para compreender a importância da atividade de defesa de interesses no processo de decisão política no Brasil, sob o rótulo lobby, é necessário compreender os fatores contextuais que a legitimam e que se autenticam segundo as lógicas do mercado de trabalho e do combate à corrupção, sob o manto da moralidade pública.

A lógica do combate à corrupção apresenta três fatores: 1. o Estado brasileiro é considerado intervencionista, ou seja, intervém nas diversas esferas da sociedade civil, produzindo crescentemente um marco legal e regulatório que afeta o conjunto da sociedade; 2. a Lei 12.846, de 1.º de agosto de 2013, conhecida como Lei Anticorrupção, criminaliza as pessoas jurídicas de qualquer natureza que pratiquem atos lesivos contra a administração pública, não isentando as pessoas físicas envolvidas; e 3. a Operação Lava Jato tem exposto os atos lesivos de empresas, empresários, políticos, administradores públicos e outras pessoas envolvidas, que, a partir de inquéritos policiais, estão sendo levados à Justiça.

Outros fatores pertencem à lógica própria do mercado de trabalho: 1. a criação de setores específicos de relações governamentais nas estruturas organizacionais de empresas dos setores produtivo, financeiro e de serviços, associações de classe e profissional; 2. a contratação de profissionais de relações governamentais com dedicação exclusiva, altamente qualificados e remunerados; 3. o fortalecimento institucional da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig) e o Instituto de Relações Governamentais (Irelgov), em especial na criação da identidade desse profissional; 4. pesquisas sobre o perfil do profissional; e 5. cursos de longa e curta duração para formar e qualificar esses profissionais.

Obviamente, a lógica do combate à corrupção impulsiona a do mercado de trabalho, até porque o empresariado entende que lidar com o Estado e suas instituições de forma ética, transparente, profissional e especializada é fundamental para suas estratégias de negócios.

Leia também: O Estado, a pizza, a bagagem e o cartão (artigo de Ricardo Bordin, publicado em 28 de dezembro de 2016)

Rodrigo Constantino: Capitalismo de compadres (26 de maio de 2016)

No contexto atual, a legitimação da atividade reflete um debate de ordem semântica. Os que são contra a regulamentação rotulam essa atividade de lobby, em sua conotação mais negativa. Quem se posiciona favoravelmente prefere o nome “relações governamentais” e afirma que lobby é apenas uma parte da atividade, o que não expressa nem representa sua totalidade. Para esses, lobby se diferencia de tráfico de influência e corrupção, descartando a distinção entre “lobby do bem” e “lobby do mal”.

A expressão lobby não figura entre as atividades descritas na CBO do Ministério do Trabalho e no substitutivo ao Projeto de Lei 1202/2007. A CBO usa expressões como defensor de interesses, participação na formulação de políticas públicas e relações governamentais, enquanto no substitutivo figuram termos como atividade de representação de interesses, relações governamentais, participação social em processos de decisão política.

De forma mais global, a diferença entre o substitutivo e a inclusão na lista da CBO é que a primeira visa regulamentar a atividade de defesa de interesses e a segunda, reconhecê-la. Ambos legitimam a atividade, diferenciando-a de tráfico de influência e corrupção. As atividades do profissional da área vão desde a identificação de proposições legislativas (monitoramento legislativo) que possam trazer riscos ou oportunidades para empresas, sindicatos e associações, passando pela identificação de aliados (monitoramento político), até a identificação de stakeholders, não se resumindo à atividade de pressão política e lobby.

Além do combate à corrupção, outro aspecto positivo é que a defesa de interesses, atividade do Profissional de Relações Institucionais e Governamentais junto aos tomadores de decisão política, é um mercado de trabalho em expansão, que tomará mais impulso após sua inclusão na lista da CBO do Ministério do Trabalho. A promulgação e a sanção do substitutivo ao Projeto de Lei 1202/2007 também será um fator que aquecerá ainda mais esse mercado. Pesquisas realizadas pela Abrig em 2015 (em parceria com Irelgov em Foco) e em 2016 (com a Universidade Federal de Minas Gerais) revelaram que este mercado absorve profissionais de diversas áreas de formação acadêmica, com maior ênfase para profissionais formados em Ciência Política, Relações Internacionais e Direito. Segundo a pesquisa, as empresas buscam contratar profissionais que entendam de políticas públicas e governo, em especial que dominem o processo de decisão política.

Audren Azolin é professora do curso de Ciência Política da Uninter.
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