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É preciso dizer não à nova lei de arbitragem (PL 403, 2013), que legitima a arbitragem privada de consumo sem limites – até com analfabetos e analfabetos funcionais. O Legislativo brasileiro aprovou e está para sanção da presidente Dilma normas da lei de arbitragem que permitem ao árbitro (pago pelas associações de fornecedores) não seguir as decisões judiciais nas ações coletivas, as súmulas e jogar no lixo todas as vitórias do movimento consumerista desde 1988!.No ano em que o Código de Defesa do Consumidor completa 25 anos, o parlamento brasileiro deixa de aprovar o projeto de atualização do CDC (PLS 281 e 283 de 2012) e aprova um mísero parágrafo na lei de arbitragem permitindo a arbitragem privada por árbitro único.

É preciso dizer não à arbitragem privada de consumo que não fique obrigada a respeitar o Código de Defesa do Consumidor

Este novo parágrafo vai permitir – por sua redação ruim e insuficiente – que a partir de agora todos os contratos de consumo tenham cláusulas compromissórias (cláusulas de arbitragem privada, para que todos os problemas de consumo sejam resolvidos por árbitros únicos, organizados em instituições. Assim, o consumidor será convidado a ir a estas arbitragens privadas, seja ele analfabeto, analfabeto funcional, idoso, pobre, entenda ou não de educação financeira, de construção civil. E este arbitro único vai dar uma sentença, que é irrecorrível. Pior ainda, os contratos deixarão a cláusula de arbitragem na última página – como hoje o modelo internacional dos derivativos impõe – e o consumidor vai assinar com mão trêmula a sua sentença de morte.

Na lei aprovada, para contratos de adesão (estes contratos de massa, que assinamos sem ler e que têm mais de 50 páginas hoje) podem ir à arbitragem e o árbitro nem precisa mais usar o Código de Defesa do Consumidor. O árbitro privado pode decidir por equidade e por princípios gerais do Direito Bancário. A arbitragem privada ainda é sigilosa, não faz jurisprudência e não necessita usar a jurisprudência do STF, STJ, TJs e das cortes. Isso quer dizer que com a nova lei de arbitragem que permite a arbitragem de consumo sequer as normas imperativas do direito brasileiro terão que ser respeitadas.É preciso dizer não a este golpe nos direitos conquistados pelos consumidores nestes 25 anos de CDC: é preciso pedir o veto à Presidência da República. É preciso dizer não à arbitragem privada de consumo que não fique obrigada a respeitar o CDC e a permitir os consumidores se beneficiarem das vitórias conseguidas nas ações coletivas, sejam nos planos econômicos, seja frente às construtoras, frente aos fornecedores de serviços, na internet etc. É preciso dizer não à arbitragem privada de consumo que libera o árbitro a decidir os casos de consumo como decide os casos entre duas multinacionais, sem usar a jurisprudência, as normas imperativas e de proteção a favor dos consumidores!

A presidente Dilma tem se mostrado uma pessoa sensível aos direitos dos consumidores e agora terá que nos ajudar ou a luta está perdida, pois passaremos os próximos anos lutando apenas para irmos ao Judiciário, afirmando que arbitragens contra analfabetos pobres e idosos no Brasil são contra a ordem pública, que o árbitro deixou de usar esta ou aquela norma do CDC, que o STJ consolidou este ou aquele entendimento em recurso repetitivo, súmula que o árbitro não utilizou. Enfim, lutando para que todas as vitórias judiciais em ações coletivas tenham repercussão em prol dos consumidores. Que país é este que deixa seus consumidores idosos analfabetos sem ajuda e deixa os fornecedores organizarem seu marketing de arbitragens privadas de forma a ludibriar os consumidores, que, como cordeirinhos, irão às cortes arbitrais dos fornecedores. Pessoas analfabetas e vulneráveis, sem advogados e defensores públicos, terão uma arbitragem privada e comercial como na CCI de Paris! Pelo menos o Legislativo poderia ter regulado a arbitragem de consumo, limitando-a, regulando a aplicação obrigatória do CDC, das vitórias nas ações coletivas, que o consumidor pode ir à arbitragem e se beneficiar das ação coletivas ou estabelecer uma arbitragem pública como na Espanha e Portugal! Parece que há um desinteresse total pelos direitos do consumidor. Esperamos que a presidente possa vetar este lacônico e desastroso parágrafo 3.º do art. 4.º da nova lei de arbitragem. Se o Brasil quer arbitragem de consumo, que seja regulada no Código de Defesa do Consumidor.

Claudia Lima Marques é professora titular da UFRGS. Marilena Lazzarini é presidente do Conselho Diretor do IDEC e membro do Conselho da Consumers International.
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